Como pode ser o "Dia Seguinte"; não nos iludamos!
A salvação de Temer
José Roberto
de Toledo
A atrapalhar Temer, o mesmo problema que tem tudo para
impedir Dilma:
a economia
No ritmo que
novas declarações a favor do impeachment
de Dilma Rousseff têm sido registradas no placar atualizado pelos jornalistas do jornal O Estado de S. Paulo, não será surpresa se a oposição superar os
380 votos no domingo. Algo como quatro dúzias de deputados além do
necessário para enviar o processo da Câmara ao Senado, e – se ratificado pela
maioria simples dos senadores – provocar o afastamento da presidente dentro de
provavelmente um mês.
Essa margem pode aumentar ainda mais no dia
da votação, caso se repita o “efeito
manada” que ocorreu no impedimento de Fernando Collor, em 1992. À medida
que percebem o placar se aproximando dos 342 votos fatais, deputados trocam de lado ou descem do muro – para não ficar mal com o
futuro presidente e aumentar a chance de cavar uma boquinha no novo governo.
É mais forte do que eles.
Contando-se que Dilma manterá a palavra e não
renunciará, Temer se muda do prédio
anexo para o 3.º andar do Palácio do Planalto em quatro semanas como interino.
A presidente afastada permanece morando no Palácio da Alvorada, ganhando metade
do salário – embora haja o risco de despejo judicial. A precariedade dos dois
presidentes, do provisório e da futura ex, durará até o Senado julgar o impeachment
em caráter definitivo. Pode levar 180 dias para Temer levar a mulher
Marcela do Jaburu para o Alvorada.
Enquanto isso, a partir de 11 de maio, uns dias a mais ou a menos, o que sobrou do PT
estará livre para voltar a ser oposição, e tentar acordar sindicatos e
movimentos sociais de uma dúzia de anos de sonambulismo bolsista. Antecipando-se a esse retorno, há dias Lula
trocou os bastidores pelos palanques, já em campanha para a próxima
eleição, seja ela quando for.
Do outro lado, PMDB, Temer e associados
sairão das sombras dos anexos para a exposição permanente na vidraça do
governo. À sua frente, uma crise
econômica só equivalente em tamanho a seu apetite pelo poder. Invertem-se
os papéis, segue a novela.
Na Esplanada dos Ministérios, uma operação de
salvatagem estará em curso. Enquanto milhares de petistas esvaziam as gavetas e
desocupam cargos que lhes pareciam permanentes, outros tantos de apadrinhados
pelo PP, PSD, PR e até pela banda minoritária do PMDB tentarão convencer o
futuro ministro Eliseu Padilha que sempre foram temeristas [a favor de Michel Temer], e não temerários. Seus
padrinhos lutarão para manter o que já tinham, o que conseguiram nas últimas
semanas, mais as sobras de quem está de saída. São 21.765 cargos de confiança federais, dos quais 5.680 para não
concursados.
Não longe dali, outro resgate estará em andamento, no Tribunal Superior Eleitoral, onde Gilmar Mendes e seis ministros
julgarão a cassação da chapa Dilma/Temer
por financiamento ilegal na campanha eleitoral de 2014. Bastam quatro deles
para abreviar o mandato do presidente interino, ou, alternativamente, salvá-lo –
caso engulam a tese de que Temer se
elegeu vice sozinho, sem os votos nem os reais de Dilma. Em último caso,
basta um deles sentar indefinidamente sobre o processo, como já fez antes.
No Congresso,
outra operação de salvação já está
em curso, com Eduardo Cunha no timão. Envolve dezenas de deputados e uma penca
de senadores citados, denunciados ou réus na Lava Jato – fora outras operações
policiais menos rumorosas. Com Dilma na galeria de ex-presidentes, esperam que a pressão popular diminua, para
que a Justiça possa voltar ao seu ritmo habitual, e eles ganhem o tão sonhado
direito ao esquecimento judicial.
Assim, de salvação em salvação, o futuro governo começa a se organizar.
A atrapalhá-lo, o mesmo problema que tem tudo para impedir Dilma: a economia. Quando o eleitor deixa de ser consumidor, ele se lembra da corrupção e
de todas as mazelas que afligem o seu dia a dia. Ou Temer dá um jeito de
melhorá-la e logo, ou vai descobrir que nem Cunha salva.
Fonte: O
Estado de S. Paulo – Política – Quinta–feira, 14 de abril de 2016 – Pág. A6 –
Internet: clique aqui.
QUEM É TEMER?
Duas palavras bastam
Janio de
Freitas
Farsa e traição são palavras que definem bem a atitude
do vice-presidente
Pela primeira vez, a palavra foi relacionada
a Michel Temer por Dilma Rousseff na terça-feira [12 de abril]. Sob as tensões
hostis das atuais circunstâncias, a palavra demorou: o comedimento verbal de
Dilma, a atacada, no qual "golpista e golpismo" foram o tom mais
elevado, pode ficar como um caso excepcional. A palavra, na frase transcrita
por Bernardo Mello Franco: "Se
ainda havia alguma dúvida sobre o golpe, a farsa
e a traição em curso, não há
mais". Traição.
O rompimento pessoal e do PMDB com Dilma,
conduzido por Michel Temer de ponta a ponta, com auxílios de Romero Jucá como "laranja",
foi incomum em política. Mais do que não ser uma reação, como seria próprio de
um rompimentos político, o orientado por Temer não teve nem sequer um fato
anódino para invocar. O partido era parte do governo, detentor do maior número
de ministérios e de cargos em todas as reformulações ministeriais, ainda hoje
com peemedebistas no governo. Ministros indicados pelo próprio Temer ou pelo
PMDB sob sua presidência.
Para ter algo
a dizer, em duas ocasiões Michel Temer precisou recorrer à combinação de
ridículo e inverdade. Em uma, teria "passado quatro anos como vice-presidente
decorativo". À parte a impropriedade pessoal do adjetivo, nos seus longos
e improdutivos anos como deputado, Temer poderia propor emenda constitucional
que desse ao vice-presidente mais atribuições do que o fixado pela Constituição.
Nem ao menos cogitou do tema.
Temer diz agora: "Nesse
período em que fui [foi, já?] vice-presidente, nunca tive um chamamento efetivo
para participar das questões do governo". Participou, sim, de muitas reuniões políticas e deliberativas na
Presidência. Também várias vezes
convidado a assumir a coordenação política do governo, ao aceitá-la,
afinal, não mostrou mais trabalho e habilidade do que para o velho "é
dando que se recebe". Só agravou o que estava errado na coordenação
política. Em pouco tempo, deixou a
atividade por iniciativa própria, esgotados os cargos a ceder e os colegas a
favorecer. E a sinceridade de sua queixa era tão decorativa que quis ser o
companheiro de Dilma na reeleição.
A outra queixa foi a falta de convite para
estar na conversa entre Dilma e o vice-presidente do EUA, Joe Biden, que, segundo Temer, veio aqui para estar com ele. Os
vices em viagem são portadores de mensagens dos seus presidentes aos
presidentes visitados. A conversa com Dilma era mesmo só com Dilma. E Biden, sabedor da lamúria de Temer,
ainda teve a gentileza (ou a ironia) de prometer-lhe um encontro como consolo.
A divulgação do "discurso da vitória" seguiu o método Temer: o ridículo na explicação inconvincente.
Elio Gaspari observou que nos 14 minutos
dessa presunção "faltou não só a palavra" – corrupção –, "faltou
qualquer referência ao tema". Não à toa. É só olhar, como fez com
desalento certo ministro do Supremo, quem está à volta de Temer. Dos "anões do Orçamento" a
Eduardo Cunha, a coleção é completa. Incluído, claro, o recordista, quando
governador, de transações anuladas por fraude com as grandes empreiteiras.
Se é um sinal para a Operação Lava Jato e
seus desdobramentos, cabe-lhe interpretar. Por mim, pelo que já vi, nisso não
percebo sinal, mas certeza.
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