Filme mostra economia sob viés familiar [Família da Vila Brasilândia]


FERNANDO CANZIAN
DE SÃO PAULO


Documentário "Família Braz - Dois Tempos", que estreia hoje, retrata aumento da renda nos últimos dez anos
Ascensão social e intelectual é ressaltada com cenas dos Braz em preto e branco em 2000 e coloridas em 2010  

Na transição entre 1999 e 2000, dois anos antes do fim da era FHC, o Brasil estava mergulhado em incertezas econômicas.

Meses antes, o real sofrera uma maxidesvalorização, e o país se viu obrigado a recorrer a um pacote bilionário de socorro do FMI (Fundo Monetário Internacional).

Naquela virada para o ano 2000, a economia estava em recessão, embaçando o período de euforia e de crescimento da renda trazido seis anos antes pelo Plano Real. Nesse contexto se deram as filmagens da primeira parte de "Família Braz - Dois Tempos" [foto acima], dirigido por Arthur Fontes e Dorrit Harazim.

Vencedor do festival É Tudo Verdade 2011, o documentário estreia hoje e mostra dois grandes panoramas de uma única família da Vila Brasilândia, periferia da zona norte de São Paulo.

O "segundo tempo" foi filmado dez anos depois, no ano passado, quando o Brasil cresceu 7,5%.
Entre esses "dois tempos", o país mudou para melhor, ao menos em termos de distribuição da renda. Mais de 30 milhões de pessoas ascenderam à chamada classe C (hoje majoritária) e cerca de 8 milhões entraram na A/B.

Embora independente das políticas de assistência social e da profusão de bolsas que marcaram o governo Lula, a família Braz surfou nesse novo cenário nacional.

Ao contrário de milhões que passaram só a ter mais bens de consumo (muitos por meio de um forte endividamento), os Braz fizeram uma ascensão qualitativa.

Os quatro filhos adolescentes de 2000 estão encaminhados em 2010. Têm sonhos de consumo prosaicos como viagens, plástica nos seios e carros novos. Mas falam em estudar inglês, mandarim e em fazer pós-graduação.

"O que mais nos surpreendeu na família Braz, e isso talvez seja único, ou bem mais raro hoje em dia, foi a força dos laços e valores familiares, que não se esgarçaram", afirma Dorrit.

A diretora (e o filme) destaca o papel da matriarca dos Braz, dona Maria. "Ela desponta como o norte da casa e daquela família."

Mas é Toninho, o pai encanador, de educação básica e incansável trabalhador, quem paga as contas até que os filhos dessa família bem estruturada se firmem.

A ascensão social e intelectual dos Braz, e a diferença entre os "dois tempos", é quase que desnecessariamente ressaltada com cenas em preto e branco em 2000 e coloridas em 2010.

Entre os dois cortes, o documentário revela os Braz como que saindo de uma caverna escura e precária em direção a um ambiente mais iluminado. Não apenas por novos bens, mas por vontade de conhecimento e otimismo.

O diretor Arthur Fontes sublinha um trecho desconcertante do filme, quando dona Maria diz, lá em 2000, que morre de medo de São Paulo. "Em 2010, a cidade já não a assusta mais."

Fonte: Folha de S. Paulo - Ilustrada/cinema - Sexta-feira, 10 de junho de 2011 - Pg. E10 - Internet: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq1006201117.htm
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CRÍTICA DOCUMENTÁRIO

"Família Braz" deixa impressão de retrato de classe, oferecido pelos personagens 

RICARDO CALIL
CRÍTICO DA FOLHA 

Como seu título revela de forma explícita, "Família Braz - Dois Tempos" alinha-se a um grupo de documentários que registra certos personagens durante certo tempo e retorna a eles mais tarde.
No Brasil, a referência central desse procedimento continua sendo "Cabra Marcado para Morrer" (1964-1984).

Mas a passagem do tempo talvez seja menos essencial no filme do que o esforço de Eduardo Coutinho para se reaproximar de seus personagens como indivíduos, não como representantes de um tipo social.

É um dos desafios que se impõem também aos diretores Dorrit Harazim e Arthur Fontes em "Família Braz -°Dois Tempos", vencedor do festival É Tudo Verdade.

Há pouco mais de dez anos, eles realizaram um documentário sobre o cotidiano de uma família de classe média baixa da Brasilândia, periferia de São Paulo. Ao retornarem, encontraram uma concretização da "ascensão social".

Embora exista uma evidente tentativa por parte dos realizadores de fugir do didatismo e do sociologismo, o documentário ainda deixa uma forte impressão de retrato de classe.

Mas, se no passado do documentário brasileiro esse olhar era imposto, aqui ele parece oferecido sobretudo pelos próprios personagens, que ostentam sua trajetória de sucesso material.

"Família Braz - Dois Tempos" não é interessante por registrar a ascensão social de uma família, mas porque essa ascensão é também cinematográfica, refletindo-se na encenação dos personagens dentro do filme.

FAMÍLIA BRAZ - DOIS TEMPOS

DIREÇÃO: Dorrit Harazim e Arthur Fontes
PRODUÇÃO: Brasil, 2011
ONDE: nos cines Livraria Cultura, Espaço Unibanco Pompeia, Espaço Unibanco Pompeia e Frei Caneca (todos em São Paulo, capital)
CLASSIFICAÇÃO: livre
AVALIAÇÃO: bom

Fonte: Folha de S. Paulo - Ilustrada/cinema - Sexta-feira, 10 de junho de 2011 - Pg. E10 - Internet: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq1006201118.htm

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