Nova organização ataca dogmas econômicos


CLAUDIA ANTUNES
DO RIO


Economistas de mais de cem países se associam e prometem pluralismo no debate da área  

Uma organização internacional que promete liberar a ciência econômica de dogmas e submetê-la à realidade foi lançada por um grupo de 141 economistas.

Em menos de um mês, ela conta com 3.500 integrantes de mais de cem países.

O impulso para a criação da Associação Internacional de Economia (WEA, na sigla em inglês) foi, segundo seus fundadores, o "embaraço" criado pelo fracasso de economistas em posições de liderança de alertarem para a iminência do colapso financeiro de 2007/2008.

O manifesto da WEA promete "pluralidade e abertura", em oposição ao que é visto como a prevalência de um grupo pequeno que vem se revezando entre cargos acadêmicos, governos, bancos e instituições internacionais.

"O desastre de 2008 era previsível, como alertaram economistas fora do establishment que foram ignorados. Ele se tornou possível pelas mudanças no sistema regulatório, endossadas pelo alto escalão da profissão", diz Edward Fullbrook, editor da revista eletrônica "Real World Economics".

Além de Fullbrook, inglês radicado nos EUA, estão entre os fundadores o americano James Galbraith (Universidade do Texas), o britânico Robert Wade (London School of Economics), o turco Dani Rodrik (Harvard), o alemão Heiner Flassbeck (ONU) e o francês Frédéric Lordon (Centro Nacional de Pesquisa Científica).
Há quatro brasileiros: Luiz Fernando de Paula [foto acima], presidente da Associação Keynesiana, Ana Célia Castro (UFRJ), Fernando Ferrari (UFRGS) e o ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira, colunista da Folha.

SEM DICOTOMIA
A maioria dos nomes da lista pode ser qualificada de heterodoxa. No entanto, Fullbrook afirma que a proposta não é reforçar a dicotomia entre neoclássicos e keynesianos, nascida das disputas teóricas e políticas sobre como lidar com as consequências da crise de 1929.

"A questão não é trocar a abordagem hegemônica. O que a economia requer é o reconhecimento de que o entendimento de uma área de estudo exige mais de uma linha conceitual. A profissão sempre tendeu a ser absorvida por modelos abstratos e a desprezar as bases empíricas", afirma.

Luiz Fernando de Paula reforça: "Embora alguns resistam, o uso da matemática como um fim em si e a crença em mercados autorregulados acabaram. É importante recuperar a dimensão da economia como ciência social, em que as instituições variáveis são importantes".

Apesar de advogarem uma prática científica, os economistas da WEA reconhecem que o ramo é mais permeável à influência de interesses particulares do que a biologia ou a física.

O consultor Peter Radford, que foi economista chefe do banco britânico NatWest, diz que o processo de concentração financeira, impulsionado pelo fim da barreira entre as atividades bancárias de investimento e de varejo, se refletiu no desempenho da profissão.

"Foi um processo marcado pela proximidade entre governos e bancos. Houve gente que deixou os bancos para se tornar regulador e depois voltou. No fim, todos pensam igual e não há supervisão nem controle."

Quando assumiu, por exemplo, Barack Obama chamou para sua assessoria econômica Larry Summers, mentor da liberalização financeira no governo Bill Clinton (1993-2001). Foi preterido Joseph Stiglitz, ex-economista chefe do Banco Mundial e próximo do Partido Democrata.

"Obama sentiu que o clima político não era propício a tentar algo novo. Na crise, o mais fácil é ser cauteloso", diz Radford.

A WEA quer facilitar a circulação de novas ideias com a publicação de duas revistas acadêmicas. O "World Economic Journal" será voltado a questões de interesse geral. A "Economic Thought" terá artigos sobre história, metodologia e filosofia dos estudos econômicos.

Fonte: Folha de S. Paulo - Mundo2 - Sábado, 11 de junho de 2011 - Pg. 9 - Internet: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft1106201120.htm

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