«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

terça-feira, 7 de junho de 2011

"O debate vai além de uma lista de marcados para morrer" [Importante!]

ENTREVISTA

Padre Dirceu Luiz Fumagalli, coordenador da Comissão Pastoral da Terra (CPT) 

Isadora Peron

Religioso ressalta que mortes atingem pessoas envolvidas na defesa da floresta, o que interessa a toda a sociedade

O coordenador nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), padre Dirceu Luiz Fumagalli [de pé, na foto ao lado], fala com propriedade sobre os conflitos no campo. Para ele, o grande problema hoje pode ser resumido em uma palavra: impunidade. Segundo Fumagalli, dos mandantes dos 1.580 assassinatos que ocorreram no campo nos últimos 26 anos, há apenas um preso. "Quando o Judiciário tem de julgar e condenar os culpados é extremamente omisso ou cúmplice com aqueles que cometeram os crimes", disse.

A CPT entregou um relatório ao governo no qual aponta que 1.855 pessoas sofreram ameaças de morte no campo entre 2000 e 2011. O que tem de ser feito para protegê-las?

A primeira coisa que é preciso dizer é que esse número não esgota toda a realidade dos ameaçados no campo. A socialização desse dado tem o objetivo de abrir um diálogo com o governo e com a sociedade. As pessoas muitas vezes veem o campo como um lugar tranquilo de se viver e tem pouquíssima informação das lutas travadas e da importância dessas lutas. O fato é que este debate vai muito além de uma lista de marcados para morrer, mas é claro que o nosso primeiro objetivo é exigir a proteção a essas pessoas ameaçadas por parte do Estado.

Qual o significado dos últimos assassinatos no Norte do País?

O importante a destacar é que essas mortes não aconteceram porque aquelas pessoas queriam garantir um direito individual. Aconteceram porque elas estavam defendendo a floresta, consequentemente todos nós somos beneficiados por essa luta, mas há pouquíssima gente que valoriza isso.

Qual deveria ser papel do Estado nessa situação?

Quem tem que desencadear políticas concretas para investigar, condenar e proteger é o Estado. Mas o grande problema que existe é a questão da impunidade. Nos últimos 26 anos, dos 1.580 assassinatos no campo, só 91 casos foram julgados. Dos mandantes desses 1.580 assassinatos, há apenas um preso - e isso porque existe uma pressão internacional -, que foi um dos mandantes do assassinato da irmã Dorothy. Isso é uma situação que gera uma insegurança muito grande e um descrédito absoluto do papel do Judiciário. O Judiciário, quando é para criminalizar os movimentos sociais, é extremamente eficiente, mas quando é para julgar e condenar os culpados é omisso ou cúmplice com aqueles que cometeram os crimes.

O que esperar do grupo interministerial formado pelo governo para discutir o assunto?

Não dá para desconsiderar essa iniciativa. Até porque a presença do Estado nessas áreas de conflitos não pode ser a partir de um único ministério. Mas não é só uma questão de segurança ou de efetivo policial, você tem de exigir a presença do Estado e a efetivação de políticas públicas que vão às raízes dos problemas.

Em qual região há mais registros de conflitos no campo?

A amazônica. Isso acontece porque ainda é uma área de expansão das fronteiras agrícolas. Os empresários da terra que já desmataram São Paulo, Minas, Paraná, Rio Grande do Sul, agora estão indo para Rondônia, Tocantins, Pará, sul do Amazonas.

Fonte: O Estado de S. Paulo - Nacional - Domingo, 5 de junho de 2011 - Pg. A13 - Internet: http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110605/not_imp728132,0.php

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ANÁLISE

A economia delinquente

José de Souza Martins*

Governo está saturado de informações sobre a violência no campo e instrumentos para apontar os autores. Por que não os usa?

As mortes violentas ocorridas no sudeste do Pará, de duas vítimas-alvo e de uma possível testemunha, e a ocorrida em Rondônia, de trabalhador sobrevivente do massacre de Corumbiara, de 1995, por serem mortes previstas e uma delas informada ao governo e anunciada publicamente pela própria vítima, surpreenderam pela surpresa que causaram. Surpresa que se confirma na improvisação notória da criação, pela Presidência da República, de um comitê interministerial de trabalho para analisar o caso. A hora de analisar já passou faz tempo. Ou o governo tem uma política para a questão da violência no campo ou não a tem.

Há anos a Pastoral da Terra entrega ao governo listas de ameaçados de morte, pedindo prevenção, e a lista dos já mortos de morte prevista, como fez agora, pedindo apuração, processo e justiça. Um governo saturado de informações sobre a violência no campo e saturado de órgãos e funcionários supostamente dedicados à apuração e à prevenção de ocorrências desse tipo está muito aquém do que dele se tem o direito de esperar se não sabe o que fazer. Sobretudo quando, em face de fato grave e alarmante, só tem a dizer à nação que criou um comitê de ministros para analisar os fatos.

Os fatos vêm sendo analisados há décadas, já sabemos tudo que é necessário saber sobre eles. Dúzias de livros, relatórios e análises foram publicados, até com o patrocínio do poder público. O governo tem instrumentos sofisticados para identificar áreas problemáticas e potencialmente conflituosas, apurar causas e identificar autores. Por que não os usa?

A questão ambiental e a questão fundiária decorrem da economia delinquente, clandestina e paralela da grilagem de terras e do desmatamento irregular, que têm sido marca de nossa história desde que a Lei de Terras, de 1850, no Império, criou a propriedade fundiária absoluta e privou o Estado do direito de domínio sobre as terras do País. Privou-se o governo do principal recurso para gestão do uso do território entregando aos particulares o arbítrio e a decisão sobre bens naturais que dizem respeito ao nosso futuro, ao bem-estar do povo e à própria segurança nacional.

A República agravou o problema transferindo aos Estados, redutos das oligarquias retrógradas e seus interesses políticos e territoriais, a gestão das terras devolutas. A reação militar à decorrente desrrepublicanização da República, nas revoltas tenentistas dos anos 20 e na Revolução de Outubro de 1930, desencadeou um movimento de recuperação do domínio do Estado nacional sobre as terras da nação. Inicialmente, com o Código de Águas, que nacionalizou o subsolo e relativizou o direito de propriedade e, de certo modo, estabeleceu o direito do Estado à gestão e uso do território.

Era, também, o caminho para a eventualidade da reforma agrária, corretiva do uso abusivo, especulativo e improdutivo das terras do País. O golpe de 1964, motivado nas ruas pela resistência à possibilidade da reforma agrária, janguista e de esquerda, produziu o efeito bumerangue de uma legislação e de uma política de reforma agrária, em nome das razões de Estado e da própria segurança nacional. Um passo importante na recuperação do domínio do Estado sobre o território brasileiro.

A última medida tendente a incrementar essa política de recuperação da soberania do Estado sobre o território ocorreu no governo FHC, quando o ministro Raul Jungmann determinou a nulidade de supostos títulos de propriedade destituídos de legitimidade, correspondentes a milhões de hectares de terras possuídas ilegal e irregularmente.

A violência divulgada nestes dias não diz respeito unicamente a questões relativas a direitos sociais, o direito à terra por parte de quem nela trabalha, e a direitos humanos, o direito à vida e à segurança pessoal e da família. Diz também respeito à questão da segurança nacional. A economia delinquente e paralela, ilegal, tem se apropriado de porções do território, criado enclaves territoriais, estabelecido governos invisíveis, instituído polícias privadas, abolido a lei e os códigos, violado a Constituição. Como se vê no caso noticiado de um "condomínio" em 170 mil hectares de terras invadidas, que pertencem à União, em Rondônia, para extração irregular de madeira e cobrança de direitos de passagem a caminhões que transportam a madeira. Um país dentro do País. A violência contra trabalhadores indefesos do sudeste do Pará e de outras regiões é feita em nome de uma potência privada e oculta, que não paga impostos e não respeita a lei. Situa-se, portanto, na categoria de "inimigo interno", injustamente aplicada a inocentes brasileiros não faz muito e aplicável muito mais a mandantes e autores da violência atual.

Na prática, uma guerra foi declarada contra o Brasil por esse inimigo interno, em nome de interesses econômicos e territoriais que não são os do País nem dos verdadeiros empresários.

* JOSÉ DE SOUZA MARTINS É SOCIÓLOGO, PROFESSOR EMÉRITO FACULDADE DE FILOSOFIA DA USP E AUTOR DE FRONTEIRA (CONTEXTO).

Fonte: O Estado de S. Paulo - ALIÁS - Domingo, 5 de junho de 2011 - Pg. J6 - Internet: http://www.estadao.com.br/noticias/suplementos,a-economia-delinquente,728104,0.htm

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