«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

segunda-feira, 21 de março de 2016

Lava-Jato será série de TV - Diretor é o mesmo de "Tropa de Elite"

«É caso de polícia»

Entrevista com José Padilha
Cineasta carioca

Marcelo Marthe

O diretor de “Tropa de Elite” diz que não há nada de propriamente político na corrupção: é crime, ponto. E critica a intelectualidade de esquerda que vive em estado de negação quando confrontada com fatos levantados na Lava-Jato.
JOSÉ PADILHA
Cineasta brasileiro

O cineasta carioca José Padilha, de 48 anos, tem se dedicado a expor a violência e o crime que permeiam a sociedade brasileira. Foi o que fez no documentário Ônibus 174 e nos dois Tropa de Elite, fenômenos de bilheteria que consagraram um anti-herói nacional, o Capitão Nascimento. Também responsável pela série Narcos, do Netflix, Padilha vive nos Estados Unidos com a mulher e o filho de 12 anos. E anda atento a outra modalidade de crime bem conhecida dos brasileiros: a corrupção. Ele anuncia que um de seus próximos trabalhos para a TV internacional será sobre a Operação Lava-Jato. Por telefone, falou do projeto e dos escândalos que o inspiraram.

Como será sua série de TV sobre a Operação Lava-Jato?

José Padilha: O objetivo é narrar a operação policial em si e mostrar inúmeros detalhes esclarecedores que a própria imprensa desconhece. Como se trata de um projeto bancado por dinheiro internacional, o título será em inglês. Estamos chamando a série provisoriamente de Jet Wash. Mas o escândalo oferece tantas possibilidades de título que é até difícil escolher. Poderia ser Solaris, não?

O senhor tem estudado escândalos como o mensalão e o petrolão?

José Padilha: Conheço os dois a fundo. Li grande parte das sentenças do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do mensalão. E também conheço bem o petrolão, pois comprei os direitos de um livro ainda inédito que traz entrevistas até com envolvidos que estão na cadeia - a obra será uma das bases da série. Após uma leitura atenta dos fatos, não dá para ignorar que o PT e as empreiteiras montaram uma quadrilha para lesar os cofres públicos, sim. Também não dá para fingir que a campanha eleitoral da presidente Dilma Rousseff não foi irrigada com dinheiro da corrupção. Sejamos francos: é bem provável que outras campanhas tenham sido irrigadas também.

O que a futura série dirá sobre a tese tão alardeada pelo PT de que a Lava-Jato tem viés político?

José Padilha: Não tem viés político nenhum. É uma operação policial, ponto. Para entender o que está ocorrendo hoje no Brasil, é preciso tirar a cortina de fumaça que nubla os fatos. Existem três processos históricos distintos andando em paralelo e se retroalimentando:
1º) A combinação de mal-estar com a economia,
2º) revelações da Lava-Jato e
3º) a atuação de uma imprensa livre e combativa.
Tudo isso produziu algo inédito no país: o andar de cima ficou vulnerável à aplicação da lei. É o que está acontecendo de concreto. Em torno disso, tem muita espuma: a tentativa de transformar um fenômeno de natureza policial e legal num embate político. Toda vez que alguém fala dos indícios avassaladores contra Lula, um petista diz que o PSDB também rouba. Tenta-se transformar tudo numa questão ideológica. Mas tudo é caso de polícia.
OPERAÇÃO LAVA-JATO
Um caso de polícia envolvendo empresários, funcionários públicos e políticos, e ponto final!

No que a corrupção do governo petista se diferencia da que se via antes?

José Padilha: A política no Brasil - nas esferas municipal, estadual e federal - sempre funcionou assim: os partidos elegem seus representantes e indicam pessoas para cargos-chave com poder de contratar serviços públicos. Depois, superfaturam as obras e embolsam um pedaço do dinheiro, que vai para pessoas físicas e o financiamento de campanhas. O PT fez isso em volumes muito maiores - vide a compra da Refinaria de Pasadena. E o caso do PT também é pior porque o roubo sistêmico se soma a um enorme cinismo. Lula, antes, fazia o discurso da ética e da moralidade. Mas, quando chegou ao poder, não só montou seu esquema como levou ao limite da sustentabilidade o assalto a empresas estatais e órgãos públicos. Um político assim só poderia chamar para si mais ódio do que os outros, obviamente.

Qual seria a melhor saída para a crise política desencadeada pelo petrolão?

José Padilha: Minha preferência, como brasileiro, seria a cassação da chapa Dilma-­Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Se o TSE tivesse a coragem de olhar para as campanhas e impugnar as chapas que receberam recursos ilícitos, tenho a impressão de que não sobraria nenhuma chapa relevante. Uma nova eleição seria o melhor caminho para o Brasil. Mas não me parece que vá acontecer. Há muita ingerência política no TSE.

Num artigo recente, o senhor encontra uma explicação psicanalítica para tantos artistas e intelectuais não aceitarem as evidências contra Lula e o PT. Por que essas pessoas vivem, como o senhor diz, em negação?

José Padilha: É um fenômeno psicológico que foi primeiro estudado pela psicanálise, por Freud e sua filha Anna. Quando você constrói uma imagem pública em torno de uma ideologia e assume publicamente posturas a favor de determinado grupo político - vai ao programa eleitoral do PT, abraça o Lula, faz campanha para a Dilma - e depois descobre que estava errado, há duas opções: aceitar seu erro ou fingir que nada aconteceu. A maioria dos artistas e intelectuais preferiu fingir que nada de errado está ocorrendo com o partido e seus dirigentes. É um mecanismo de defesa psicológica. Meus amigos são cineastas, atores e escritores, muita gente da esquerda, enfim. E decidi alertá-los: camaradas, acordem. Se vocês valorizam suas crenças, afastem-se do Lula. No momento, curiosamente, já detecto que a negação passou para outro patamar.
"No caso do PT, o roubo sistêmico se soma a um enorme cinismo.
Lula (na foto) antes fazia o discurso da ética. Mas, no poder, levou ao limite da sustentabilidade
o assalto às empresas estatais"

Qual seria?

José Padilha: Cada vez há menos negação total. Agora, quando confrontados com o erro que foi acreditar que o PT é um partido e não uma quadrilha, os artistas e intelectuais apelam para dois subterfúgios. O primeiro é afirmar que a presidente Dilma não roubou "como pessoa física", embora seja evidente que a campanha eleitoral da Dilma foi beneficiada por um propinoduto - disso a Lava-Jato não deixa a menor dúvida. Embora seja grave roubar para si próprio, é ainda pior roubar para fraudar o processo democrático.

E qual seria o segundo subterfúgio?

José Padilha: É a tática diversionista: responder que o PSDB também roubou. Ora, se foi assim, vamos investigar o PSDB, não livrar o PT. E olhe que não tenho motivo nenhum para defender o PSDB: no dia anterior às eleições, escrevi um artigo no jornal explicando por que não apoiava nenhum dos candidatos. Criticava especificamente Marcelo Freixo (PSOL), um político que respeito, por ter apoiado a campanha do PT-PMDB após o mensalão. E critiquei a Marina Silva por se associar a Aécio Neves. Outro dia, a propósito, li um artigo do Fernando Henrique Cardoso em que ele diz que os problemas não são só Lula e Dilma, é o arranjo político brasileiro que está ultrapassado. Infelizmente, tenho de dizer: não é arranjo coisa nenhuma, é desvio de dinheiro público. Se o PSDB também fez o que ele chama de “arranjo político”, está igualmente envolvido em crimes.

A intelectualidade brasileira perdeu a sintonia com os cidadãos?

José Padilha: As manifestações mostraram que só os intelectuais estão divididos. O Brasil quer o PT e o PMDB fora do poder e que a Lava-Jato continue até pegar os corruptos de todos os partidos. O que não pode agora é haver um acordo entre PSDB e PMDB para substituir Dilma e só PT ser punido significativamente. Os corruptos do PMDB e do PSDB têm de ser pegos também. Delcídio do Amaral já deu o caminho [por meio de sua delação à Justiça]. Agora é puxar o fio da meada. Se a esquerda for inteligente, depois de pegos os seus corruptos, vai passar a apoiar a Lava-Jato para pegar os dos outros.

Antes do novo projeto sobre a Lava-Jato, o senhor buscou financiamento do BNDES para um filme sobre o mensalão. Por que desistiu da ideia?

José Padilha: Na ocasião, uma comissão de cineastas e executivos do banco julgava os projetos. Quando apresentei a ideia de um filme sobre o mensalão, o pessoal do BNDES olhou para mim como se eu fosse um maluco. Na votação, meu filme ganhou o direito de um financiamento de 1 milhão de reais. Mas, enquanto outras pessoas que também ganharam aquele edital rapidamente começaram a assinar seus contratos, o meu nunca saía. Ficou claro que havia um esforço do governo para abafar o meu projeto. O próprio José Dirceu ligava e botava pressão. No dia seguinte ao do anúncio do edital, um executivo me ligou pedindo para mudar a sinopse do projeto. Eu falei: “Não posso mudar. Seria uma fraude”. No fundo, foi uma ingenuidade minha. Por isso, considero importante que minha série sobre a Lava-Jato seja uma produção financiada com dinheiro internacional. É uma garantia contra pressões.

Com o conhecimento de causa de quem fez Garapa, um documentário sobre os miseráveis, o senhor concorda com a alegação do PT de que nenhum partido fez mais pelos pobres?

José Padilha: Discordo. Dois processos [na verdade, três] reduziram significativamente a pobreza no Brasil:
1º) O primeiro foi o fim da inflação, com o Plano Real.
2º) Depois, no primeiro mandato do Lula, surgiu a ampliação do Bolsa Família, que já existia no governo Fernando Henrique Cardoso (FHC). Sempre entendi o Bolsa Família como uma forma de reverter o dano histórico do processo inflacionário. Mas essas duas coisas só foram viáveis por causa de uma terceira:
3º) o controle das contas públicas, basicamente montado nos governos do PSDB.
No entanto, o segundo governo do Lula em diante, o PT começou a desmontar esses avanços. No fim do governo do PT, o brasileiro vai estar de volta ao ponto em que estava quando o Lula foi eleito. Se não estiver pior.

Para assistir ao documentário “Garapa” sobre a fome no Brasil,
clique sobre a imagem abaixo:


O senhor já declarou que o Brasil é “uma barbárie”. Em que medida isso pesou na troca do Rio [de Janeiro] por Los Angeles?

José Padilha: Tenho visto muita gente se mudar do Brasil para os Estados Unidos. Eu amo o Brasil, mas cada vez mais ficou difícil para mim viver aí. Quando comecei a filmar no exterior, já passava muito tempo fora do país e via pouco minha família. Basicamente, foi por isso que me mudei para Los Angeles. Agora, quando percebi o rumo que o país tomou, acelerei esse processo. Hoje, para andar de bicicleta na Lagoa Rodrigo de Freitas, eu teria de botar uma roupa de samurai, para não levar uma facada nas costas.

O diretor de Tropa de Elite é, afinal, de esquerda ou de direita?

José Padilha: Nem de esquerda nem de direita. Minha trajetória no cinema reflete o que penso. Quando fiz Ônibus 174, contei a história de ponto de vista de Sandro Nascimento, um menino de rua convertido em bandido. As pessoas da esquerda adoraram o filme, mas fui criticado pela direita. Quando abordei a violência do ponto de vista de um policial, em Tropa de Elite, fiz questão de chamar esse policial pelo mesmo sobrenome de Sandro – Capitão Nascimento. O subtexto era: a violência no Rio de Janeiro se explica pelo encontro desse tipo de policial com aquele tipo de criminoso, e o estado está produzindo ambos. A direita adorou Tropa de Elite, e a esquerda me chamou de fascista. Tenho bastante desconfiança de qualquer ideologia totalizante. Não acho que exista um sistema de ideias capaz de dar conta da complexidade dos processos sociais. Não compro nenhuma ideologia.

Fonte: Revista VEJA – Edição 2470 – Ano 49 – Nº 12 – 23 de março de 2016 – Págs. 14, 18-19. Edição impressa.

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