ESQUECEMOS O MAL?
Jean-Claude Guillebaud
La Vie
20-08-2014
Caso
for necessário, os novos crimes
cometidos na última sexta-feira (15 de agosto) no Iraque pelos "loucos" do Estado Islâmico, juntamente
com os assassinatos em massa atribuídos à
seita Boko Haram na Nigéria, acabam de nos convencer do seguinte: desta vez, nós não estamos diante da
violência, mas do Mal. É uma mudança de natureza ontológica. Sobre as
artimanhas de Putin e o "orgulho" que ele pretende restituir aos
russos, podemos até discutir. Sobre as brutalidades do face a face
israelense-palestino, podemos, legitimamente, discordar. Mas não sobre as
barbaridades mencionadas acima.
Elas nos
convidam a nos recordar de um livrinho publicado logo após o 11 de setembro de
2001. Seu autor é Jean-Pierre Dupuy,
politécnico, engenheiro de minas e professor da Universidade de Stanford, na
Califórnia. O acontecimento de 11 de setembro levou-o a escrever, no calor dos
acontecimentos, algumas páginas sob um título que fala por si mesmo: Esquecemos
o Mal? (Bayard). Ele, um
renomado cientista, lembrou-nos que certos acontecimentos requerem uma reflexão
de ordem espiritual, mais que "política".
Tradução do título deste livro: "Esquecemos o mal?" |
Ele
acrescentou que, durante muitas décadas, o pensamento ocidental tinha se
desinteressado pela questão do Mal, considerado um arcaísmo religioso. Em
nossas sociedades modernas, a vontade de manter a razão, a ciência, uma
abordagem racional do mundo, não deixou nenhum lugar – acreditava-se – para
este tipo de questão. Para Dupuy, este "esquecimento" foi estúpido. A questão espiritual do Mal existe.
Mais do que nunca, talvez. Alguns
acontecimentos nos recolocam repentinamente diante dela:
- Penso nos massacres em Ruanda, em 1994,
- no autogenocídio no Camboja, em 1975,
- no setembro de 2001 em Manhattan.
- Pessoalmente, penso na selvageria indescritível da guerra civil no Líbano (1975-1990).
Ela não
pode ser reduzida a simplesmente enviar ajuda ou armas. Exige também que apontemos os dedos – direta ou
indiretamente – para os patrocinadores de tais horrores. Mesmo quando temos
vínculos econômicos com eles. Eu penso na Arábia
Saudita ou no Catar que, em nome
da defesa do Islã sunita (contra os xiitas), mostram uma comprovada complacência
com este "Estado islâmico" do emir Abu Bakr al-Baghdadi.
E isso
não é tudo: diante do Mal, não queiramos, sobretudo, encarnar o Bem. Também
esse último torna-se rapidamente exterminador. Tenhamos em mente essa bela
fórmula de Lytta Basset: "O contrário do mal não é o bem, mas o
sentido".
Tradução
do francês por André Langer.
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