O PODER DOS SUPERMERCADOS
Esther Vivas
Publico.es
21-08-2014
A
grande distribuição comercial (supermercados, hipermercados, cadeias de lojas…)
teve nos últimos anos um forte processo de expansão, crescimento e concentração
industrial. As principais empresas de venda a varejo passaram a fazer parte do
ranking das maiores multinacionais do planeta e converteram-se num dos atores
mais significativos do processo de globalização capitalista.
O seu
aparecimento e desenvolvimento mudou radicalmente os nossos hábitos de
alimentação e consumo, subordinando estas necessidades básicas a uma lógica
mercantil e aos interesses econômicos das grandes empresas do setor. Produz-se, distribui-se e come-se aquilo
que se considera mais rentável.
“Operação
supermercado”
No Estado espanhol, a abertura do primeiro
supermercado aconteceu no ano de 1957
e teve lugar em Madrid. Tratava-se de um “supermercado-autosserviço” de caráter
público promovido pelo regime franquista sob o programa “Operação
supermercado”, que importou o modelo de distribuição comercial norte-americano
sob a influência do Plano Marshall. O seu objetivo: modernizar o “comércio
pátrio”. A experiência foi um sucesso total, dando lugar em muito pouco tempo a
uma rede de supermercados públicos em várias cidades como San Sebastian, Bilbao,
Zaragoza, Gijón, Barcelona, Corunha, etc.
Em 1959
foi aberto o primeiro supermercado de capital privado em Barcelona, fundado
pelas famílias Carbó, Prat e Botet, proprietárias de mercearias, e que o
batizaram com o nome de Caprabo, juntando a primeira sílaba da cada um dos seus
sobrenomes. A abertura, como conta o livro Caprabo
1959-2009, significou uma autêntica “revolução” entre os consumidores,
atraídos, sobretudo, pelo fato de poder escolher diretamente das estantes os
produtos a comprar. Com a passagem do tempo, os supermercados privados, que o
próprio governo franquista estimulou, impuseram-se, criando uma extensa rede de
supermercados em todo o Estado, e os de carácter público foram desaparecendo.
Nesse
mesmo momento na Europa, os supermercados eram uma realidade emergente. Em
1957, na Grã-Bretanha, existiam 3.750 estabelecimentos, na República Federal da
Alemanha 3.183, na Noruega 1.288 e em França 663. O Estado espanhol e a Itália
situavam-se na fila, com 3 e 4 supermercados respectivamente. Os supermercados eram considerados um
símbolo de modernidade e progresso. A partir de então, a sua extensão foi crescendo,
dez anos mais tarde, em 1968, o número de supermercados na Espanha somava já
3.678 e vinte anos depois, em 1978, a cifra atingia os 13.215 estabelecimentos.
O seu modelo de distribuição e venda a varejo generalizou-se ao longo das
décadas dos anos 80 e 90, passando a exercer atualmente um domínio absoluto da
distribuição alimentar.
Além
disso, a maior parte de nossas compras,
entre 68% e 80%, é adquirida em supermercados, hipermercados e cadeias de lojas.
Segundo a revista especializada Alimarket,
e com dados de 2012, 68,1% da alimentação embalada e dos produtos farmacêuticos
são adquiridos neste tipo de canais, principalmente nos supermercados, face a
1,5% que adquirimos no comércio tradicional, 25,1% em comércios especializados
e 5,3% noutros. Segundo o relatório Expo
Retail 2006, quase 82% da compra de
alimentos realiza-se através da grande distribuição, 2,7% no comércio
tradicional, 11,2% em estabelecimentos especializados e 4,2% é adquirido
noutros lugares. Em consequência, o consumidor tem cada vez menos portas de
acesso aos alimentos e o produtor menos opções para chegar ao consumidor. O poder de venda dos supermercados é total.
Muito poder em
poucas mãos
Uma
distribuição moderna que, além disso, se concentra em muito poucas empresas. De
fato, a maior parte das nossas compras no supermercado são feitas em apenas seis cadeias, que controlam 60% desse
mercado [isso na Espanha]. Trata-se de Mercadona,
com 23,8% da quota de mercado, Carrefour
com 11,8%, Eroski (que inclui a
Caprabo) com 9,1%, Dia com 6%, Alcampo (que integra os supermercados
Sabeco) com 5,9% e El Corte Inglés
(com SuperCor e OpenCor) com 4,3%. Seguem-se Lidl, Consum, AhorraMás e DinoSol,
que em conjunto constituem as dez principais empresas do setor. Nunca o mercado
da distribuição alimentar tinha estado em tão poucas mãos.
Na
Europa, a dinâmica é a mesma. No conjunto do continente, as dez principais
cadeias de supermercados controlavam, com dados de 2000, mais de 40% da quota
de mercado. Atualmente, calcula-se que a concentração seja ainda maior. Em países como a Suécia, só três empresas
de supermercados monopolizam cerca de 95% da distribuição, e em países como
Dinamarca, Bélgica, França, Holanda e Grã-Bretanha, umas poucas empresas
dominam entre 60% e 45% do total, segundo um relatório de Veterinários Sem Fronteiras.
Além
disso, algumas das maiores fortunas na Europa estão vinculadas à história da
grande distribuição. Na Alemanha, a
pessoa mais rica do país foi até 16 de julho de 2014, data da sua morte, Karl Albrecht, fundador e
coproprietário dos supermercados Aldi.
Depois do seu falecimento, o primeiro lugar passou a ser ocupado por Dieter Schwarz, proprietário do grupo
Schwarz, que inclui as cadeias de supermercados
Kaufland e Lidl. Em França, a segunda fortuna do país está nas mãos de Bernard Arnault, proprietário do grupo
LVMH de artigos de luxo e com uma participação muito importante no Carrefour. E sem ir mais longe, no
Estado espanhol, o segundo posto do ranking das grandes fortunas recai em Juan Roig, proprietário de Mercadona.
A “teoria do funil”
Uma
concentração que se vê claramente na chamada “teoria do funil”: milhares de
camponeses por um lado e milhões de consumidores pelo outro e apenas umas
poucas empresas da grande distribuição controlam a maior parte da
comercialização dos alimentos. Tomemos o exemplo do Estado espanhol. Na parte
superior do funil, contamos com cerca de 720 mil camponeses e pessoas que
trabalham no campo e na parte inferior 46 milhões de habitantes e consumidores,
no meio 619 empresas e grupos do setor da distribuição alimentar (com
Mercadona, Carrefour, Grupo Eroski, Dia, Alcampo, El Corte Inglés, Lidl,
Consum, AhorraMás, Makro, Gadisa, Grupo El Árbol, Condis, Bon Preu, Aldi,
Alimerka à cabeça) determinam a relação entre ambos. E um dado a ter em conta: destas 619 empresas, as 50 primeiras
controlam já 92% de total da quota de mercado.
São
estas empresas que determinam a que preço se pagam os produtos ao agricultor e
que custo têm para nós no “super”, dando-se
o paradoxo de que o camponês recebe cada vez menos dinheiro por aquilo que
vende e nós, como consumidores, pagamos mais. Fica claro, quem ganha.
Trata-se de um oligopólio, onde umas
poucas empresas controlam o setor:
- que empobrece a atividade camponesa,
- homogeneíza aquilo que comemos,
- torna precárias as condições laborais,
- acaba com o comércio local e
- promove um modelo de consumo insustentável e irracional.
Traduzido
do espanhol por Carlos Santos
(portal: Esquerda.net).
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