OS SEGREDOS DA CRISE ECONÔMICA NO MUNDO ATUAL
UBIRATAN
BRASIL
Escritor
e documentarista, o americano CHARLES FERGUSON detalha o lado podre da crise
financeira mundial de 2008
Charles H. Ferguson - escritor e documentarista norte-americano |
A
lógica do mercado internacional é perversa: se os grandes investidores que
cometem irregularidades forem parar na cadeia, não haverá mais pessoas
dispostas a investir. “Por isso, os grandes escândalos rendem apenas manchetes
na imprensa, filmes, livros. Apenas isso”, comenta Charles Ferguson, escritor e
cineasta americano que divide no sábado, 2 de agosto, uma das mesas mais esperadas da
Flip, ao lado do compatriota Glenn Greenwald. O tema é sugestivo: Liberdade,
liberdade.
Se
Greenwald ganhou notoriedade mundial ao publicar no jornal inglês The Guardian
uma série de reportagens realizadas com base em documentos vazados pelo
ex-agente secreto Edward Snowden, que comprovam a espionagem praticada pelo
Estado americano contra os próprios cidadãos e de outros países, Ferguson
dissecou a origem da crise financeira que sacudiu o mundo em 2008 no contundente
e explicativo documentário Trabalho Interno (2010, em inglês: Inside Job), que lhe rendeu o Oscar da
categoria.
Na
Flip, ele lança o livro O Sequestro da América (Zahar), que nasceu na
continuidade do material pesquisado para o documentário, ou seja, em palavras,
ele detalha mais acuradamente como uma elite financeira predadora assumiu, nos
últimos anos, o controle econômico dos EUA [Estados Unidos da América], levando o país à falência e
arrastando o restante do planeta, tragédia que ainda deixa vestígios na
economia global atual.
Assista a este incrivelmente didático e esclarecedor documentário,
Trabalho Interno (Inside Job), clicando sobre a imagem abaixo:
Nessa
época, 2008, Ferguson já era alertado por amigos como Nouriel Roubini,
professor da Universidade Nova York, e o pesquisador Charles Morris (um dos
primeiros a escrever depois sobre a crise) que a economia mundial desandava
para uma situação gravíssima. “Foi quando percebi que ali estava um belo
material para um documentário”, lembra o americano, que já havia realizado Sem
Fim à Vista, sobre a Guerra do Iraque.
“A quantidade
de fraudes e o número crescente de executivos financeiros obrigados a
testemunhar no Congresso e também o aumento de processos civis vindo à tona,
enfim, a situação convenceu a mim e a Morris, que aparece em Trabalho Interno,
de que não havia dúvida sobre a grande quantidade de criminalidade no setor
financeiro.”
E por
que nenhum executivo foi preso, mesmo com tanta evidência? Ferguson ensaia um
sorriso – forma com que habitualmente exprime ironia – e responde, sempre em
voz baixa: “A principal razão é o poder político da indústria de serviços
financeiros. Isso os deixa praticamente imbatíveis. Há motivos secundários, mas
não menos importante. Por exemplo, o temor de que um clima de incertezas
pudesse resultar em uma crise financeira incontrolável que, por sua vez,
levasse a uma grande depressão, realmente catastrófica”.
O
escritor e documentarista vê semelhanças entre essa crise e a de 1929, quando a
quebra da bolsa de valores de Nova York provocou uma recessão mundial. “Tanto
naquela época como agora, havia um grupo pequeno, mas inescrupuloso de investidores
que buscou estender os riscos ao máximo até que a bolha explodisse”, observa
Ferguson, que também opinou sobre O Lobo de Wall Street, livro e filme baseados
nas memórias de Jordan Belfort, que enriqueceu rapidamente graças à especulação
ilegal. “Não tenho nada contra quem constrói fortuna – meu problema é quem faz
isso à custa da confiança e das pequenas economias de pessoas de boa índole”,
disse.
Ferguson
agora trabalha em um projeto sobre o risco de a humanidade perder a energia
disponível, um documentário que se chamará Our Energie Future [Nosso Futuro Energético] e deverá estrear
em 2015. Até chegar aí, ele abriu mão de dois outros trabalhos: o primeiro
seria financiado pela HBO e trataria da WikiLeaks, a organização transnacional
que publica na internet documentos confidenciais. O outro visava a senadora
Hillary Clinton. “Mas todas as pessoas que contatei foram ameaçadas pelo staff
de Hillary. Só consegui duas testemunhas e com a condição de falar em off.”
Fonte: O Estado de S. Paulo – Caderno 2 –
Sexta-feira, 1 de agosto de 2014 – Pg. C9 – Internet: clique aqui.
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