Para derrotar Dilma, mercado "marinou"

Talita Moreira e Cristiano Romero
Jornal Valor Econômico
29-08-2014
Estudantes fazem "selfies" com Marina Silva na Bienal Internacional do Livro (São Paulo)

Marina Silva (PSB) está longe de ser a candidata dos sonhos do mercado financeiro, mas tem ganhado adesões de peso entre banqueiros e gestores de recursos, que veem nela a grande chance de derrotar a presidente Dilma Rousseff (PT) nas urnas. Respaldada pelas últimas pesquisas, que mostram a candidata do PSB vencendo a eleição em segundo turno por diferença razoável da presidente Dilma, uma ala significativa do mercado já "marinou".

"Os bancos 'marinaram', sim, neste ambiente de 'PT nunca mais'", disse ao Valor um profissional experiente.

Prevalece o pragmatismo: o sonho de dez entre dez integrantes do mercado financeiro é ver a derrota da candidata do PT. Banqueiros ouvidos pelo Valor preferem, em geral, o candidato do PSDB, Aécio Neves. O tucano agrada porque é considerado mais experiente e, sobretudo, porque teria Armínio Fraga no comando de sua equipe econômica caso fosse eleito. No entanto, Aécio não decola nas pesquisas. Além disso, foi quem mais perdeu espaço com a entrada de Marina na disputa.

O presidente de um grande banco avalia que Aécio perdeu a mão conforme a campanha começou a avançar. "Ele começou muito bem, mas depois se saiu mal no episódio do aeroporto de Cláudio e, agora que começou o programa eleitoral, fica claro que ele não consegue se comunicar com a população", comentou.
Aécio Neves - candidato à Presidência da República pelo PSDB

Sobre Marina Silva, esse mesmo banqueiro disse não acreditar que as propostas econômicas defendidas por ela sejam resultado de convicções pessoais. Mas ele se mostra confortável com os compromissos assumidos pela candidata, como a: 
  • manutenção do tripé macroeconômico (austeridade fiscal, metas de inflação e câmbio flutuante), 
  • a independência do Banco Central (BC) e 
  • um menor intervencionismo na economia.
"O mercado já vê Marina com completo conforto", atestou um ex-diretor do BC, que, a exemplo de todos os entrevistados, exigiu anonimato para dar seu depoimento. A razão seria o fato de os bancos serem um setor regulado pelo BC. "Não se vê diferença entre o grupo de Marina e o do PSDB em matéria de assuntos econômicos", disse o ex-diretor, lembrando que "a preocupação reinante no cenário econômico é a de que o país, sob Dilma, está indo pelo caminho errado" e que tanto Marina quanto Aécio prometem corrigir isso.

Muitos agentes do mercado têm preferido engrossar desde já a campanha de Marina como um antídoto para a reeleição de Dilma - que seria, na visão deles, o pior dos cenários. A candidata do PSB sabe da importância de ganhar o apoio desse segmento. Não à toa, explicitou o compromisso de restabelecer o tripé macroeconômico e tem reafirmado isso sempre que pode.

O discurso vem desde o ano passado, quando Marina e o então candidato Eduardo Campos fizeram um périplo por São Paulo, onde se reuniram com os banqueiros, investidores e gestores para deixar claro que pretendiam trilhar, na gestão macroeconômica, o caminho da ortodoxia. Segundo um banqueiro de investimentos, a escolha de Eduardo Giannetti e André Lara Resende, dois expoentes do pensamento econômico liberal no Brasil, como mentores da candidata dá o conforto necessário para se acreditar que o compromisso com o tripé não é da boca para fora.
Dilma Rousseff - atual Presidente da República e candidata à reeleição pelo PT

"O fato de Giannetti estar acompanhando Marina há tanto tempo mostra que nada do que está sendo dito é uma novidade. Há uma compatibilidade de opiniões e convicções entre eles e a direção está muito clara: é preciso restabelecer o ambiente macroeconômico na direção correta", observou um gestor. "Giannetti, ao contrário de assessores econômicos de outras campanhas, nunca foi desmentido por ela."

Segundo esse gestor, nas últimas duas semanas, o grupo de Marina afinou o discurso, de forma que todos estão falando a mesma língua, ao contrário da expectativa inicial, que previa a eclosão de desencontros após a trágica morte do ex-governador Eduardo Campos.

"Houve um movimento articulado das lideranças de Marina e da própria candidata para acalmar o mercado e mesmo os setores que se sentem desconfortáveis com o antigo radicalismo dela em questões ambientais", disse uma fonte do mercado, mencionando entrevistas concedidas, em curto espaço de tempo, por João Paulo Capobianco (articulador do grupo junto ao agronegócio), Neca Setúbal (coordenadora do programa de governo), Roberto Amaral (presidente do PSB) e Eduardo Giannetti, além da própria participação de Marina no debate da Band e de sua entrevista ao Jornal Nacional, na Rede Globo.
André Lara Resende e Eduardo Giannetti da Fonseca (ambos economistas)

"Há uma linearidade e uma coerência muito grande em todos os discursos", elogia um gestor. O compromisso da candidata, por exemplo, com a instalação do Conselho de Gestão Fiscal, previsto desde 2000 pela Lei de Responsabilidade Fiscal, foi percebido como algo relevante.

Embora o compromisso com o tripé econômico seja um denominador comum, há nuances na forma como Marina é vista no mercado financeiro. Para alguns, mesmo sendo a melhor opção disponível, a candidata do PSB, caso seja eleita, poderá enfrentar problemas de governabilidade, pelo menos num primeiro momento, advertiu o executivo de um banco.

Outros também têm dúvidas quanto à capacidade de Marina de montar um time de peso. Isso vale, inclusive, para a equipe econômica. Para um banqueiro que trabalhou com ambos, Giannetti e Lara Resende são conselheiros "brilhantes", mas não têm perfil de gestor e talvez nem queiram atuar no dia a dia. Giannetti já deixou claro que não pretende ocupar cargo executivo. O que se sabe é que ele vai influir na definição dos nomes para a área econômica, o que ajuda desde já a tranquilizar o mercado.

Há quem aposte que Marina conseguirá agregar nomes de primeira linha - e com boa reputação no mercado - em um eventual governo. "Se ela chamar o Armínio [Fraga, hoje assessor de Aécio Neves], ele vai. O mesmo vale para todos os ministérios", afirmou um banqueiro experiente. "Por enquanto, Marina não precisa indicar quem será seu Armínio. Se ela estivesse colada no Aécio, precisaria fazer isso. Com a vantagem que tem, ganha tempo. Talvez, tenha que fazer no segundo turno, dependendo de como andarem as pesquisas. Mas, por enquanto, o mercado já "precificou" Marina", explicou uma fonte do mercado.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Sexta-feira, 29 de agosto de 2014 – Internet: clique aqui.

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