O FATOR "MARINA SILVA" NA DISPUTA PRESIDENCIAL

Os 3 “ismos” de Marina


JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO

A volta por cima de Marina ganha mais impulso com a pesquisa Datafolha [ver ao lado]. Feita no auge da comoção nacional com a morte de Campos, a sondagem é um fato político em si. Interfere na campanha ao aumentar o cacife de Marina. Deixa-a em posição de força para ditar os termos de sua candidatura ao PSB.

Mesmo inflada pelo momento da coleta, a pesquisa confere a Marina uma dose de favoritismo que Campos nunca teve. Mas o sabor de virada é agridoce para os pajés sem cacique do PSB. A grande chance de ganharem a Presidência pelo voto não só veio pela perda de seu líder, como ainda convive com a incerteza: será que tal vitória os levaria de fato ao poder? Porque antes de ser do PSB, Marina é do partido de Marina.

O PSB não é o único desconfiado que perdeu mais do que ganhou. Aécio Neves (PSDB) não precisa mais se preocupar se haverá segundo turno, mas corre risco inédito de ficar fora dele. Dilma Rousseff (PT) pode até não perder já, mas vê escapar a possibilidade de reeleição já em 5 de outubro – com o agravante de aumentar seu risco de derrota no turno final.

Muita coisa mudou em pouco tempo e pode continuar mudando. Marina entra na corrida pelo topo. Não será fácil manter-se tão em evidência quanto esteve desde o dia 13. Aumentará o tiroteio contra ela. Por isso, só as pesquisas do fim de agosto mostrarão um quadro decantado do pós-tragédia. Até lá, vale a pena entender como Marina chegou aonde chegou.

Uma parte de seus eleitores é histórica, não muda facilmente. A outra vem na onda emocional em que a pesquisa foi feita. A candidata precisará trabalhar para consolidar esse eleitor neomarinista. Os antigos são, por mais de um motivo, fiéis.
           
O eleitorado estrutural de Marina é um misto de dois grupos distintos:
  • Na ponta da pirâmide, jovens descontentes com a política tradicional, muitos deles manifestantes de 2013. Têm escolaridade acima da média e se acham qualificados demais para as oportunidades de emprego que lhe aparecem.
  • Na base, eleitores religiosos, principalmente mulheres evangélicas.
Por razões distintas – o conservacionismo da Marina ambientalista, e o conservadorismo da Marina dogmática -, ambos votaram nela há quatro anos. O grupo religioso aderiu na reta final do primeiro turno de 2010, após campanha de neopentecostais associar Dilma à defesa do aborto.

No segundo turno, uma parte desses eleitores votou em Dilma, mas sem convicção. Está sempre pronta a pular fora do barco da petista a qualquer sinal de avanço da presidente no campo dogmático. Foi o que ocorreu em maio deste ano, depois que o governo regulamentou o aborto por razões médicas e legais na rede SUS. A reação foi tão forte que a portaria foi revogada.

Esse eleitor crê quando Marina diz que “foi providência divina” ela não ter viajado no avião que caiu. Mas desconfia quando Dilma diz “feliz da nação cujo Deus é o Senhor”. O voto religioso em Marina rebaixa o piso eleitoral de Dilma – assim como seu eleitorado jovem limita o teto potencial de Aécio. Aí há menos chance de mudanças.

Quem oscila e pode ou não levar Marina à vitória é quem estava insatisfeito com as candidaturas existentes e aparecia na coluna do branco, nulo e indeciso. Esse eleitor estava desligado da eleição até o Cessna Citation explodir em Santos. O estrondo da tragédia despertou-o para a campanha. No susto, aderiu a Marina. Se vai continuar, depende de ela conseguir equilibrar conservacionismo, conservadorismo e messianismo.

Fonte: O Estado de S. Paulo – Política – Segunda-feira, 18 de agosto de 2014 – Pg. A8 – Internet: clique aqui.

Eleitor de ex-ministra cansou do embate que marca País desde 94

JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO

Candidatura de Marina Silva não tira votos de Dilma Rousseff e Aécio Neves; perfil de seu eleitor é o mesmo que em 2010
Marina Silva (PSB) - candidata à Presidência da República

Analisando-se os cruzamentos da pesquisa Datafolha, vê-se que Marina Silva (PSB) recuperou seus eleitores históricos:
os muito jovens (7 pontos acima de sua média),
  • os que têm curso universitário (9 pontos acima),
  • os de renda mais alta (8 pontos acima),
  • os moradores das grandes e médias cidades (4 pontos) e
  • os evangélicos (até 6 pontos acima da média).
Do ponto de vista geográfico, sua força maior continua sendo no Norte/Centro-Oeste e no Sudeste. Ela teve, como sempre, mais dificuldades no Sul e no Nordeste. Vai melhor nas metrópoles do que no interior. É o mesmo perfil de quem votou nela para presidente em 2010.

São eleitores que optam por Marina porque perderam a confiança no PT e no PSDB. Seus motivos variam. Há os que se desencantaram com a falta de solução para problemas eternos nos serviços públicos, pela corrupção ou pela mera ladainha de petistas acusam tucanos, que acusam petistas, numa ciranda sem fim nem propósito senão o de se alternarem no poder.

Mas há também aqueles que elegem Marina por causa da fé da candidata:
  • Ela chega a 29% entre evangélicos não pentecostais e
  • a 27% entre os pentecostais.
  • Por comparação, tem 19% entre católicos e
  • 23% entre agnósticos e ateus.
Parece que Marina não tira votos de Dilma Rousseff e Aécio Neves, porque as intenções de voto em ambos não se alteraram no Datafolha. Mas pode ser miragem. Dilma pode ter ganho de um lado - afinal, a avaliação de seu governo melhorou - e perdido para Marina o mesmo tanto que ganhou.

O fato é que Marina rebaixa tanto o teto de Dilma como o de Aécio. No cenário sem a candidata do PSB, a petista chega a 41% e o tucano, a 25%. Ou seja, cada um deixa de ganhar 5 pontos por causa de Marina. E o estrago pode crescer.

Até agora, Marina recuperou seus eleitores históricos que estavam acantonados com Eduardo Campos e com os nanicos, ou estavam indecisos e declarando voto nulo e branco. Marina personificou o seu protesto e pode vir a incorporar outros protestantes - sejam religiosos, sejam manifestantes.

Vai depender, claro, de sua atuação, mas também dos seus adversários. Quanto mais Dilma e Aécio se digladiarem entre si, mais insatisfeitos Marina terá para recolher em sua urna. Ela tem a menor rejeição e o maior potencial de crescimento.

Fonte: O Estado de S. Paulo – Política – Terça-feira, 19 de agosto de 2014 – Pg. A4 – Internet: clique aqui.

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