«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

terça-feira, 10 de novembro de 2015

A LAMA DE MARIANA - IMAGEM DO LAMAÇAL EM QUE VIVEMOS!

A lama da Samarco e o jornalismo que
não dá nome aos bois

Alceu Luís Castilho*

Bento Rodrigues: povoado soterrado pela Samarco sintetizava um modo de vida tão esquecido pela imprensa quanto os impactos sociais e ambientais do mundo corporativo 
DISTRITO DE BENTO RODRIGUES - MUNICÍPIO DE MARIANA (MG)
Completamente debaixo da lama que escorreu das barragens que se romperam.

Por trás da lama da Samarco afirma-se o gosto amargo de um jornalismo subserviente, a serviço do mercado. Dezenas de pessoas estão desaparecidas em Mariana (MG). Entre elas, crianças. O vídeo [abaixo] mostra como era o cotidiano de um povoado destruído. Mas a maior tragédia socioambiental brasileira do século XXI já começa a ser soterrada pelos jornais, após uma cobertura protocolar. Da lama à ordem: ignoram-se os conflitos, minimizam-se as contradições e se assimilam os discursos cínicos de executivos e de membros do governo. Com a clássica blindagem dos sócios da empresa.

Clique sobre a imagem para assistir ao vídeo da TV Cultura
mostrando como era a vida em Bento Rodrigues antes da tragédia:


Primeiro enumeremos os donos. Já se sabe que 50% da Samarco pertence à Vale do Rio Doce, a Vale que tirou o Rio Doce de seu nome e nele despejou lama tóxica. A outra metade pertence à anglo-australiana BHP Billiton, uma fusão da australiana Broken Hill Proprietary Company com a inglesa (radicada na África do Sul) Billiton, atuante nas veias abertas do Chile, Colômbia e Peru (onde tomou uma multa ambiental de US$ 77 mil após contaminação por cobre), no Canadá, Reino Unido e nos Estados Unidos, na Argélia, no Paquistão e em Trinidad & Tobago. Já protagonizou na Papua Nova Guiné uma contaminação fluvial histórica. As maiores mineradoras do mundo.

E a quem pertence à Vale? Esse capítulo costuma ser omitido, quando se fala de impactos sociais e ambientais:
  • A empresa é controlada pela Valepar, com 53,9% do capital votante (1/3 do capital total).
  • Com 5,3% para o governo federal,
  • 5,3% para o BNDESpar,
  • 14,8% para investidores brasileiros,
  • 16,9% na Bovespa e
  • 46,2% de investidores estrangeiros (este percentual cai para 33,9% no caso do capital total).

De qualquer forma já temos que a Samarco – com a metade anglo-australiana – e esses acionistas já têm mais da metade de acionistas estrangeiros.

E quem manda na Valepar, que controla a Vale?
1) Fundos de investimentos administrados pela Previ, com 49% das ações;
2) A Bradespar, do Bradesco, com 17,4%;
3) A multinacional Mitsui, um dos maiores conglomerados japoneses, de bancos à petroquímica, com tentáculos na Sony, Yamaha, Toyota, com 15%;
4) O BNDESpar, com 9,5%.
(Ignoremos os 0,03% da Elétron, do Opportunity e seu onipresente Daniel Dantas. E registremos que, com a Mitsui, aumenta ainda mias a participação de estrangeiros na Samarco.)
FERNANDO PIMENTEL (PT - MG)
Governador de Minas Gerais concede entrevista coletiva na sede da mineradora SAMARCO!

BNDES? Previ? Mas por que, então, a imprensa acostumada a fustigar o governo federal não fiscaliza com mais atenção a Vale, símbolo da privatização a preço de banana? Simplesmente porque não tem o saudável hábitoa imprensa brasileirade fiscalizar corporações. E porque essas instituições não estão sozinhas. Porque tem a Mitsui, o Bradesco – o bilionário Bradesco. Com um governador petista dando entrevista coletiva na sede da Samarco. (O capitalismo não é para amadores.) Não há um acompanhamento sistemático do custo social e ambiental das aventuras plutocratas, sob governos de siglas diversas. Pelo contrário: o que há é um marketing despudorado.

Executando advérbios

Essa rede de donos da Samarco manifesta-se por meio de um jovem executivo, Ricardo Vescovi. Os gerentes de crise da empresa tiraram o site do ar (sabe-se lá com quais informações) e divulgaram este vídeo do presidente no Facebook :

Para assistir o vídeo clique aqui

Com seu milagre de multiplicação de advérbios insossos e pronomes totalizantes, insensíveis aos dramas dos mineiros. “Lamentavelmente”, “imediatamente”, “absolutamente todos os esforços” em relação ao “ocorrido”, “todas as ações”, “todos os esforços”, “igualmente não medindo esforços”, “todo apoio”, “toda solidariedade”, “lamentamos profundamente” o “acontecido”.

Os mais desavisados poderão até ficar com dó do pobre coitado. Ainda mais após as declarações do governo mineiro de que a Samarco foi “vítima” do rompimento da barragem [clique aqui]. E após jornalistas irresponsáveis replicarem notícias sobre “tremores de terra” que acontecem todos os dias. Muito embora a empresa já soubesse, desde 2013, que a barragem – como outras pelo país que ainda não desabaram – estava condenada [clique aqui]. E que essa não tenha sido a primeira tragédia em Minas Gerais. São esses mesmos jornais que não se furtam a cobrir, de forma reverente, o que as empresas chamam de “sustentabilidade”, “responsabilidade social e ambiental”.

Alguém poderá argumentar que um jornal da grande imprensa, O Estado de S. Paulo [clique aqui], divulgou notícia sobre o laudo de 2013 que mostrava os problemas estruturais na barragem. Sim. Em 2015. Mas cabe lembrar que uma ou outra notícia isolada após uma tragédia está longe de caracterizar a cobertura crítica de um setor econômico. Se o tema não se mantém na manchete (esse mesmo jornal, neste domingo, remeteu o tema para pé de página), em artigos recorrentes, editoriais sistemáticos, não há o agendamento político efetivo – e sim o convite ao esquecimento. E à impunidade. (Quem vai fazer uma Operação Lava Lama?)

Imprensa dos vencedores

Essa mesma imprensa se esquece também de contar ao leitor que existe um choque entre modelos de apropriação do território e dos recursos naturais. O vídeo da TV Cultura sobre a comunidade destruída mostra – ainda que com uma abordagem que privilegia o exótico – um modo de vida bem diferente, onde as moradoras vão na casa das outras, plantam-se pimentas no quintal e se produz geleia, coletivamente, em uma associação. Uma lógica econômica muito diversa da predação extrativista – e esgotável – protagonizada pela Samarco, esse nome amorfo emprestado a dois expoentes do capitalismo mundial. Quem disse que há consenso?

Existem movimentos sociais específicos de atingidos pela mineração, ou atingidos pelas barragens. Até mesmo de atingidos pela Vale [veja site na internet, clicando aqui]. Por que não se dá voz a essas pessoas? Se nem após os desastres isso acontece, o que se dirá do dia a dia? Porque os cadernos e até revistas especializadas são de “negócios”, como se esses negócios pudessem pairar (numa sociedade democrática) acima dos interesses dos cidadãos. Por que os calam? Por que essa censura? Por que a destruição de uma comunidade inteira e de um ecossistema não comovem? Porque esse jornalismo é situacionista, economicamente situacionista. Torce para os vencedores. 
Para visitar o site, clique aqui.

Os mais eugenistas nem se constrangem em dizer que aquelas populações não deviam estar ali – deviam abrir alas para a distinta mineradora. Como se fosse um bem infinito para o país o esgotamento de seus recursos minerais. Não se questiona o modelo e nem suas conexões com outros temas: a falta d’água, o crescimento e a falta de infraestrutura das periferias urbanas, inchadas também pela expulsão das populações tradicionais. Faz-se tudo menos um jornalismo sistêmico, que consiga olhar para temas simultâneos, para tendências econômicas e para o clima, para a desigualdade e os riscos ambientais. Com nome aos bois (ou aos caranguejos), o nome dos beneficiários. Quem ganha com isso?

Naturalização

De um modo geral o efeito obtido no caso de Mariana é o de naturalização de uma matança e de um crime ambiental histórico. Como não houve chuvas, inventa-se um terremoto. A morte horrível de moradores e a destruição de um povoado por uma empresa ganham, no máximo, uma cobertura similar à das tragédias em São Luís do Paraitinga ou Petrópolis (fruto também da especulação imobiliária), ignorando a cadeia de sócios, os interesses políticos em torno das mineradoras [leia sobre isto, clicando aqui] ou o risco estrutural que esse tipo de exploração impõe ao ambiente, aos trabalhadores e vizinhos, bola pra frente que em janeiro teremos “outras enchentes”. Como se fizesse parte do sistema ser soterrado por uma lama tóxica enquanto se planta alface.

* ALCEU LUÍS CASTILHO trabalhou no jornal O Estado de S. Paulo (1994-2001), na Agência Reuters, entre outros veículos, em São Paulo e Brasília. Tem especialização em Jornalismo, pela Universidade de Navarra (IV Master em Jornalismo para Editores, 2000), é vencedor do Prêmio Fiat Allis de Jornalismo Econômico (1999), recebeu Menção Honrosa no Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos (2004), conquistou 3º lugar no Prêmio Direitos Humanos de Jornalismo (2004), o Prêmio Andifes de Jornalismo (2006), título de Jornalista Amigo da Criança (2007), e foi finalista do Prêmio Esso de Jornalismo, categoria Interior (2007).

Fonte: Blog do Alceu Castilho – Jornalismo, Geografia e Direitos Humanos – Segunda-feira, 9 de novembro de 2015 – Internet: clique aqui.

“Mariana corre risco de se tornar uma cidade
com solo infértil”, diz pesquisador

Nadine Nascimento

Após a tragédia, caso a lama permaneça “onde está, naquela região por muito tempo não vai nascer nada, não vai se plantar nada. O rejeito anda pode assorear a calha dos rios”, conclui professor da UFRJ. 
BENTO RODRIGUES
Distrito de Mariana (MG) completamente tomado pelo lamaçal da barragem da Mineradora Samarco

Em nota em sua página na internet, a Samarco, mineradora responsável pela barragem de Fundão que rompeu na tarde da última quinta (5 de novembro), em Mariana (MG), afirma que o rejeito que atingiu as casas da região "não apresenta nenhum elemento químico que seja danoso à saúde”, já que este seria composto apenas por “sílica (areia) proveniente do beneficiamento do minério de ferro”.

Ainda que não tenha riscos tóxicos, a permanência do material na região pode deixar o solo infértil, segundo o especialista em geotecnia e professor de engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Mauricio Ehrlich.

Ele alerta dos riscos ao meio ambiente caso o material não seja retirado da área atingida, já que a lama, infértil, pode deixar a região improdutiva para a agricultura. “O dano existe porque foi depositado um monte de lama em cima de um terreno, acabando com a vegetação em todo o trecho. O rejeito deve ser retirado, pois se deixar a área se recuperar naturalmente levará muito tempo. Se permanecer onde está, naquela região por muito tempo não vai nascer nada, não vai se plantar nada. O rejeito anda pode assorear a calha dos rios. É um impacto importante, não dá para ser minimizado”, conclui o professor.
Professor Mauricio Ehrlich (à direita):
especialista em geotecnia e professor de engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

Para Márcio Zonta, militante do Movimento Nacional pela Soberania Popular Frente a Mineração (MAM), a Samarco, com sua nota, não mostra a real gravidade do acidente. Para ele, os moradores da cidade e o meio ambiente da região podem sofrer um risco ao entrar em contato com a lama. É impossível ser só areia, a mineração é um processo químico e os rejeitos são tóxicos. Não tem como dizer que é só areia, afirma.

O militante ainda aponta que demandaria muito tempo para reverter os danos. “Se fosse só areia não morreriam matas ao redor da barreira. Isso vira um colapso não só para as vítimas, mas também ambiental, contamina o solo, contamina as águas e rios, e é uma situação que não se resolve fácil. Pode-se levar muito tempo para haver uma estabilização ambiental, social e cultural. Mariana é uma cidade pequena e o impacto é ainda maior”, analisa.

Os impactos na saúde da população ainda não são claros. O “rio de lama” que iniciou em Mariana, seguirá por outras regiões mineiras e também chegará a cidades do Espírito Santo. No leste de Minas, o Serviço Autônomo de Água e Esgoto do município de Governador Valadares emitiu comunicado em que afirma: “Os moradores devem economizar água ao máximo e tentar garantir o abastecimento com as próprias reservas de água (caixas). A Defesa Civil e o Corpo de Bombeiros alertam ainda para que ninguém entre em contato com a água do Rio Doce. Por causa da lama densa e contaminada que vem pelo rio, da barragem rompida em Mariana, foi preciso interromper a captação e o tratamento de água, por causa do alto nível de turbidez da água.”

Já o professor Mauricio Ehrlich aponta que dos três tipos de rejeito classificados, o da barragem Fundão é tipo 2 e não causa danos toxicológicos. “O rejeito da barragem de Fundão é formado basicamente por partículas de quartzo e ferro com granulometria arenosa, não é um material muito fino, e esses materiais são geralmente inertes, então não se tem um material que interage com o meio ambiente. Certamente ninguém vai ficar doente pelo contato com esse material”, diz.

Fonte: Brasil de Fato – 09/11/2015 – Internet: clique aqui.

Bastidores de uma tragédia:
Os relações públicas da Samarco dão uma surra no Estado brasileiro, que sucumbe ao poder econômico

Luiz Carlos Azenha

A mineradora Samarco, joint venture da Vale com a australiana BHP Billiton, teve um lucro líquido de R$ 2,8 bilhões em 2014. Ou seja, limpinhos! 
CARAJÁS - PARÁ
O ritmo incessante e acelerado da mineração do ferro está esgotando a mina
e deixando este imenso buraco!
A mineradora aqui é a Vale do Rio Doce

Como se sabe, o Brasil é uma “mãe” para as mineradoras. A Agência Pública fez uma reportagem interessante a respeito, quando Marina Amaral perguntou: Quem lucra com a Vale? [Leia uma ótima matéria a este respeito, clicando aqui]

O “pai” das mineradoras é Fernando Henrique Cardoso [FHC]. Em 1996, com a Lei Kandir, isentou de ICMS as exportações de minerais!

O que aconteceu com a Vale, privatizada a preço de banana, é o mesmo que se pretende fazer com a Petrobras: colocar a empresa completamente a serviço dos acionistas, não do Brasil.

O que isso significa?

Auferir lucros a curto prazo, custe o que custar.

A questão-chave está no ritmo da exploração das reservas minerais.

Num país soberano, o ritmo é ditado pelo interesse público. É de interesse da população brasileira, por exemplo, inundar o mercado com o petróleo do pré-sal, derrubando os preços? Claro que não.

Quem lucra, neste caso, são os países consumidores. Os Estados Unidos, por exemplo. Portanto, quando FHC privatizou parcialmente a Petrobras, vendendo ações na bolsa de Nova York, ele transferiu parte da soberania brasileira para investidores estrangeiros. Eles, sim, querem retorno rápido. Querem cavar o oceano às pressas, até esgotar o pré-sal. É a dinâmica do capitalismo!

O Brasil é um país sem memória. Não se lembra, por exemplo, do que aconteceu na serra do Navio, no Amapá. Uma das maiores reservas de manganês do mundo foi esgotada porque interessava aos esforços dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial. Ficamos com o buraco e a destruição ambiental…

Obviamente, não é um problema brasileiro. Fui pessoalmente às famosas minas de diamante de Serra Leoa, na África, que mereceram uma visita da rainha Elizabeth. Investiguei o entorno. O local de onde saíram bilhões de dólares em diamantes não tinha rede de esgoto, nem de distribuição de água.

O mesmo está acontecendo neste exato momento com o coltan, do Congo, um mineral utilizado pela indústria eletroeletrônica. A exploração do coltan financia uma guerra interminável de milícias, que exportam o mineral para a Bélgica praticamente de graça!

Serra Leoa, Congo, Brasil…

Infelizmente, estamos no mesmo nível.

Como denuncia seguidamente o Lúcio Flávio Pinto, o ritmo da exploração do minério de ferro de Carajás é um crime de lesa-Pátria [leia esta matéria, clicando aqui].
RIO DE LAMA
Desce da barragem do Fundão que se rompeu nas imediações de Bento Rodrigues
Mariana - MG

Por que haveria de ser diferente nas reservas de Minas Gerais?

A economia do estado, tanto quanto a brasileira, ainda é extremamente dependente da exportação de commodities. À Vale interessa produzir rápido, derrubar o preço a qualquer custo para apresentar lucro no balanço.

Infelizmente, a elite brasileira até hoje se mostrou incapaz de formular um projeto soberano de país. Isso vale para PSDB, PT e todos os outros, como ficou evidente na tragédia de Mariana.

Não podemos culpar a mineradora Samarco pela tragédia antes de uma investigação independente e rigorosa. Mas, será que ela vai acontecer?

Do prefeito de Mariana ao senador tucano Aécio Neves, passando pelo governador petista Fernando Pimentel, todos deram piruetas para salvaguardar a Samarco. Pimentel deu uma entrevista coletiva na sede da mineradora!

Enquanto isso, milhões de metros cúbicos de lama desceram o rio do Carmo e chegaram ao rio Doce.

A Samarco diz que a lama é inerte, ou seja, não oferece risco à saúde.

Numa situação ideal, não caberia à Samarco dizer isso — com reprodução martelada em todos os telejornais da Globo.

O familiar de um desaparecido comentou comigo que, na Globo, as vítimas da tragédia não tinham rosto…

A Vale, afinal, é grande patrocinadora. 
MULHER E CRIANÇA DESABRIGADAS
de Bento Rodrigues - Mariana (MG):
Quem enxugará as suas lágrimas? Quem se importará com o futuro delas?

Espanta é que os governos federal, estadual e municipal, que em tese deveriam atuar de forma independente — em nome do interesse público — não o façam.

A primeira providência em um país civilizado seria uma análise de emergência na lama, para determinar se ela oferece algum risco à saúde.

Afinal, milhões de brasileiros podem entrar em contato com os rejeitos, seja nas margens dos rios, seja através da água consumida.

Além disso, o tsunami de lama carregou corpos humanos e de animais por uma longa extensão, de centenas de quilômetros.

No entanto, a não ser pelo esforço de relações públicas da Samarco, as pessoas afetadas, como testemunhei pessoalmente, estão totalmente no escuro.

Mais adiante, outras questões importantes vão surgir.

O rio do Carmo foi completamente destruído, de ponta a ponta. Quem vai pagar a conta? O Estado brasileiro ou a Samarco?
RIO DO CARMO
Vê-se o traçado deste rio que passava por Bento Rodrigues (foto à direita):
agora, totalmente tomado pela lama!

A Samarco fez o que se espera de uma empresa privada, que pretende minimizar os impactos sobre si do desastre ambiental que produziu.

De forma competente, acionou seu esquema de relações públicas para deixar no ar a ideia de que o rompimento de duas barragens foi consequência de um terremoto.

Transferiu os desabrigados para hotéis, evitando a ebulição de centenas de pessoas que, conjuntamente, poderiam conjurar contra uma empresa da qual sempre desconfiaram.

Conversei com os sobreviventes de Bento Rodrigues: todos sempre acharam um exagero o crescimento vertical, contínuo, da barragem, para guardar mais e mais lama.

Segundo eles, a Samarco começou a comprar novas áreas de terra porque pretendia construir outra barragem, mais próxima do povoado, para dar conta do armazenamento dos rejeitos.

Que a Samarco cuide de seus interesses é parte do jogo.

O espantoso é ver a captura do Estado brasileiro, em todas as esferas, pelo interesse privado.

Basta uma consulta às pessoas comuns, que vivem sob as barragens de rejeitos — que se contam às centenas em Minas — para que elas denunciem: as empresas aumentam indefinidamente as cotas, sem transparência, sem qualquer consulta pública, sem planos de resgate de emergência, sem um básico sinal sonoro para dar o alerta em caso de acidente.

É bem mais barato que construir uma nova barragem, certo? Lembrem-se: estas empresas estão a serviço do lucro de seus acionistas e a maioria deles não mora em Mariana, provavelmente nem mora no Brasil.

Minas Gerais, acossada pela crise econômica, sucumbe à lógica das mineradoras: como denunciou o leitor Reginaldo Proque, está tramitando na Assembleia Legislativa um projeto para simplificar o licenciamento ambiental, de autoria do governo Pimentel [leia este projeto de lei do governo de Minas, clicando aqui].

Em resumo, os desabrigados das margens do rio do Carmo fazem o papel, em carne e osso, da crise de representação da política brasileira.

Ninguém os ouve, nem consulta.

Quando muito, são sobrevoados por helicópteros que “representam” um Estado servil ao poder econômico.

Fonte: Viomundo – O que você não vê na mídia – Denúncias – 09 de novembro de 2015 – 21h02 – Internet: clique aqui.

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