«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

REFORMAR A IGREJA, EIS A MISSÃO DE FRANCISCO

A cruz da reforma

Enzo Bianchi
Jornal “La Repubblica” – Roma (Itália)
07-11-2015

Quanto mais o Papa Francisco realizar a reforma da Igreja, mais pesada será a cruz sobre as suas costas: ao lado do reconhecimento e da gratidão dos cristãos que tentam viver o Evangelho e dos “justos” até mesmo não cristãos, ao lado do reconhecimento dos pobres, aparecerá o desprezo, a deslegitimação, a ofensa dos poderes mundanos, internos e externos ao mundo eclesial. 
PAPA FRANCISCO
Consciente da "cruz" representada pela reforma da Igreja Católica

Em alguns momentos da história da Igreja, emerge a necessidade de reforma: "Ecclesia semper reformanda" [trad.: a Igreja está sempre sendo reformada] é um adágio retomado muitas vezes no segundo milênio e na Igreja latina, até dar origem a Igrejas "reformadas" ou "da Reforma", suscitar uma "Contrarreforma" e provocar divisões e separações de cristãos dentro da mesma Igreja.

Reforma da Igreja toda e de cada cristão que, no seu próprio caminho espiritual, deve absolutamente "deformata reformare", isto é, dar nova forma ao que se tornou "disforme" em relação ao Evangelho. Mas essa exigência universal de reforma é fundamental para aqueles que, na Igreja, têm a responsabilidade de governo ou são figuras exemplares para todos os cristãos: papa, bispos, presbíteros, monges...

Muitos se lembram da reforma "gregoriana", tentada pelo Papa Gregório VII, no século XI, ou a reforma amarga e muito curta do papado, realizada na sua pessoa pelo Papa Celestino V, no fim do século XIII: [Ignazio] Silone [1900-1978, escritor e político italiano], no seu "A aventura de um pobre cristão", descreveu de modo literário o caso do eremita eleito papa contra a sua vontade e, depois, induzido ou forçado a renunciar por ser impotente diante das manobras da Cúria e das intrigas dos cardeais.
PAPA CELESTINO V (final do século XIII)
Buscou realizar reformas na cúpula da Igreja, mas foi levado a renunciar

Mas não podemos nos esquecer de outras tentativas de autoridade por parte daqueles que, diante da corrupção desenfreada e especialmente romana, pediam a reforma da Igreja "in capite et in membris" [trad.: na cabeça e nos membros], no papado e em todo o corpo eclesial.

Podemos recordar, ao menos, outros dois papas: Adriano VI, holandês eleito papa em 1522, logo encontrou muitas oposições, até mesmo por parte da Cúria por causa da sua vida austera. Enquanto já se expandia a reforma de Lutero, o Papa Adriano se mostrou decidido na luta contra os maus costumes dos eclesiásticos, pediu uma limitação das despesas da corte, promoveu uma vigilância sobre o uso do dinheiro e sobre a administração lucrativa das indulgências, iniciou uma drástica redução dos escritórios curiais. Reconhecendo as razões do movimento protestante, chamou a Igreja a uma reforma, defendida também por Erasmo, mas fracassou na sua tentativa: morreu depois de um ano e alguns meses de pontificado, com apenas 54 anos.

Permanecendo nas reformas tentadas pela "cúpula", encontramos o Papa Marcelo II: como bispo e cardeal, participou do Concílio de Trento, contestando àquela cúpula a qualificação de "representar a Igreja universal", pois estavam ausentes tanto o Oriente cristão quanto os reformados protestantes. Em 1555, foi eleito papa, manteve o seu nome de batismo e rejeitou qualquer pompa e fausto triunfais para a sua coroação como papa. Logo se mostrou convencido da urgência da reforma da Igreja – começando pela Cúria – e da vida de padres e monges, já acostumados a abusos e comportamentos escandalosos, não concedeu favores aos parentes e assumiu ele mesmo, com rigor, um estilo de vida evangélico, pobre e humilde. Mas o seu pontificado durou menos de um mês...

Outras tentativas foram feitas pelo Concílio de Trento, em particular através da obra de alguns bispos e santos fundadores ou reformadores de ordens: significativamente, os historiadores já não falam mais de "contrarreforma", mas sim de "reforma católica".

Mas a necessidade de reforma emergiu novamente com força no século passado, como testemunha o próprio título de uma obra fundamental de um dos grandes teólogos do Vaticano II, o Pe. Yves Congar: "Verdadeira ou falsa reforma na Igreja". 
PADRE YVES CONGAR (1904-1995)
Teólogo dominicano francês que atuou como assessor
durante o Concílio Vaticano II.
Em 1994, Papa João Paulo II elevou-o à dignidade de Cardeal.
Assim, o Papa João XXIII e o Concílio por ele desejado – continuado e levado a cumprimento por Paulo VIrealizam uma reforma tanto do estilo do papado, quanto de toda a vida litúrgica e espiritual da Igreja, quanto ainda do modo de ser dos cristãos na companhia dos homens.

Esse início de reforma, que recomeçou com Bento XVI, hoje foi retomado fortemente pelo Papa Francisco, que, a esse respeito, foi explícito desde o início do seu pontificado, manifestando o desejo resoluto de uma Igreja pobre e misericordiosa.

Esse seu programa essencial requer reformas em diversos níveis:
- desde a forma do exercício do papado
- até a unidade visível das Igrejas cristãs,
-  das estruturas da Cúria – que deve estar a serviço do papa e ainda mais a serviço das Igrejas locais de todo o mundo –
- até o estilo de vida de todos os eclesiásticos.
E isso, simplesmente, em nome do Evangelho, do qual o Papa Francisco quer ser servo e ministro.

Há dois anos e meio, esse sucessor de Pedro, que gosta de se definir como "bispo de Roma, a Igreja que preside na caridade", mostrou que quer ser, em primeira pessoa, um realizador daquilo que prega. Não é um rigorista, nem propõe uma interpretação literal do Evangelho, não quer exercer um ministério de condenação, mas pede que os cristãos se reconheçam pecadores, porque essa é a sua realidade, e não sejam corruptos, cínicos, duros de coração, insensíveis às exigências do Evangelho e à contínua conversão que isso requer.

As resistências que ele encontra fazem parte de uma "necessitas" [trad.: necessidade] predita por Jesus aos seus discípulos e por ele sofrida: quando aparece o justo, então o ímpio se desencadeia; quando algumas vidas cristãs conseguem fazer brilhar o Evangelho, então irrompem as trevas; quando alguém anuncia o Evangelho e o vive, então lhe atiram pedras.

Quanto mais o Papa Francisco realizar a reforma da Igreja, mais pesada será a cruz sobre as suas costas: ao lado do reconhecimento e da gratidão dos cristãos que tentam viver o Evangelho e dos "justos" até mesmo não cristãos, ao lado do reconhecimento dos pobres, aparecerá o desprezo, a deslegitimação, a ofensa dos poderes mundanos, internos e externos ao mundo eclesial.
 
CARDEAL FRANCESCO COCCOPALMERIO
Presidente do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos
O cardeal Coccopalmerio declarou: "Esse papa começa a dar medo!".
Medo a quem?
Àqueles que são surdos às exigências da justiça, àqueles que não querem escutar os pobres, àqueles que gostam de se servir dos outros pelo seu poder, pela sua afirmação, pelas suas riquezas...

As supostas revelações desses dias, que não constituem uma grande novidade, certamente ferem aqueles que acreditam na justiça e amam a Igreja: são indicadoras do "mistério de iniquidade" em ato, como já denunciava Bento XVI, até mesmo no espaço preparado justamente para a justiça e o serviço dos irmãos e das irmãs.

Não gastaremos nenhuma palavra para comentá-las: isso significaria alimentar ainda mais fofocas e murmurações que o Papa Francisco denuncia constantemente como atentado à verdade e à caridade.

Não cedamos a calúnia fácil demais, não condenemos ninguém sem tê-lo escutado e tenhamos uma visão realista até mesmo da Cúria, onde trabalham com dedicação, competência, transparência e honestidade homens que buscam, também no exercício do governo, viver o Evangelho e o leal serviço ao papa e a todas as Igrejas.

E se é verdade que um "cristão não pode falar de pobreza e viver como um faraó", como disse o Papa Francisco, continua sendo verdade que falar de pobreza nos faz corar a todos, e que a palavra pobreza queima os lábios de quem a pronuncia.

Se Ignazio Silone escreveu "A aventura de um pobre cristão" sobre o Papa Celestino V, poderíamos dizer sobre o Papa Francisco: "A aventura de um cristão pobre".

Traduzido do italiano por Moisés Sbardelotto. Acesse a versão original deste artigo, clicando aqui.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Segunda-feira, 9 de novembro de 2015 – Internet: clique aqui.

O Papa: agora vamos mudar a questão
dos imóveis do Vaticano

Andrea Tornielli
Vatican Insider
06-11-2015

O Papa “não perdeu a paz”. Aqueles que o viram nestes dias dizem que está sereno e determinado a prosseguir nas reformas. E o primeiro passo será justamente a gestão do patrimônio imobiliário e dos aluguéis. Francisco disse duas palavras secas e inequívocas a um interlocutor que lhe perguntou sobre o escândalo das casas: “Haverá mudanças”.
FRANCESCA IMMACOLATA CHAOUQUI e padre LUCIO ÁNGEL VALLEJO BALDA
Dois dos principais suspeitos de ter vazado documentos relativos à investigação sobre a
administração econômica do Vaticano a jornalistas italianos.
Ambos eram integrantes da
Comissão Relatora de Estudo e Orientação sobre a Organização da Estrutura Econômico-Administrativa da Santa Sé
(Cosea)

O Pontífice está profundamente amargurado com a traição e a infidelidade dos dois investigados no segundo Vatileaks: o padre espanhol Lucio Ángel Vallejo Balda e a leiga Francesca Immacolata Chaouqui. Mas não está preocupado com o conteúdo dos documentos que foram vazados, fruto de uma profunda investigação interna que ele mesmo pediu a fim de reunir elementos para as reformas. E entre as reformas que parece determinado a introduzir imediatamente está a reforma da administração do patrimônio imobiliário da Santa Sé, as casas e os apartamentos, cuja gestão está a cargo da Apsa e da Propaganda Fide.

Francisco não perdeu a paz, nem nestes dias, nem depois de ter aprovado a prisão dos dois membros da Cosea que cederam os documentos que foram parar nos livros publicados nestes dias”, confiou à imprensa uma das pessoas mais próximas ao Pontífice. E acrescentou: “O Santo Padre está amargurado com a traição dos colaboradores infiéis, mas não está preocupado com o conteúdo dos documentos divulgados”.

O Papa Bergoglio encontra-se nestes dias em constante contato com os colaboradores, que o atualizam sobre as investigações em andamento. Mas o panorama que emerge ao se ler os livros dos jornalistas Emiliano Fittipaldi e Gianluigi Nuzzi já era perfeitamente conhecido há tempo. “Uma investigação cuidadosa e profunda – recorda um monsenhor próximo ao Papa – desejada pelo próprio Vaticano”.
EMILIANO FITTIPALDI e GIANLUIGI NUZZI
Dois jornalistas italianos que tiveram acesso a documentos internos da investigação que
Papa Francisco havia ordenado que fosse realizada a respeito da administração vaticana.

Considerando o que aconteceu, Francisco “não acredita na existência de nenhum complô”. Tratou-se, e o repete a quem se encontra com ele nestas horas, de “uma traição e de uma infidelidade” por parte de duas pessoas que obtiveram sua absoluta confiança. Uma delas, Francesca Chaouqui, agora está procurando envolver meio mundo. Bergoglio não parece nenhum pouco arrependido por ter nomeado a comissão de estudo e análise sobre os bens vaticanos, assim como também não com o fato de ter criado a Secretaria da Economia, encomendada ao cardeal George Pell.

Ele recordou em várias ocasiões que nas primeiras semanas do Pontificado os 15 cardeais encarregados de avaliar a situação econômica da Santa Sé indicaram a necessidade de envolver especialistas, fazer um monitoramento e chegar a um dicastério unificado que se ocupará da racionalização dos gastos e da administração dos recursos. “A Cosea [Comissão Relatora de Estudo e Orientação sobre a Organização da Estrutura Econômico-Administrativa da Santa Sé] foi o primeiro instrumento para realizar este trabalho inicial”.

Um dos temas mais criticados que aparece nos livros de Fittipaldi e Nuzzi é a administração do Óbulo de São Pedro, a ajuda econômica que os fiéis de todo o mundo “oferecem ao Santo Padre como sinal de adesão à preocupação do Sucessor de Pedro com as múltiplas necessidades da Igreja universal e com as obras de caridade a favor dos mais necessitados”. Em 2012 (este é o dado que ambos os livros publicaram), mais da metade destas esmolas milionárias foi utilizada para equilibrar os balanços da Santa Sé e para manter 180 missões diplomáticas vaticanas no mundo.

“Francisco sabe que é normal – explica um dos seus colaboradores –, porque isso é um apoio para o Papa e há momentos de crise econômica e financeira que exigem o emprego de parte daqueles fundos para ajustar os balanços”. Isso já aconteceu no passado, e com uma entidade muito maior: em 1995, o cardeal Edmund Szoka, então presidente do Governadorado, anunciou que pela primeira vez depois de 23 anos, tinha havido um “surplus” e que o Óbulo de São Pedro não teria sido utilizado para cobrir o déficit da Santa Sé. Ou seja, foi utilizado durante muito tempo.

Também não surpreenderam a Francisco as notícias sobre as “resistências” que a Cosea  encontrou ao desempenhar seu trabalho. Para ilustrar a situação com um exemplo, Francisco recorda muitas vezes que em um dicastério vaticano foi encontrado uma notável soma de dinheiro em espécie dentro de um armário. Também recorda o exemplo do funeral de um cardeal, que faleceu há muito tempo. A empresa de serviços funerários que sempre trabalhou com o Vaticano pediu honorários no valor de 9 mil euros. O cerimoniário pediu outros orçamentos e outras empresas lhe enviaram propostas pela metade desta quantia; a antiga funerária diminuiu imediatamente o custo. “Agora, graças ao trabalho da reforma que se fez, é necessário pedir três orçamentos”.

O Papa Bergoglio sabe que está a meio caminho. Conhece as resistências que seguem existindo e as dificuldades que encontrou a Secretaria da Economia. Também está por dentro da situação dos imóveis que pertencem ao Vaticano ou a organismos e fundações vinculados à Santa Sé. “O Papa me disse recentemente – revelou seu colaborador: ‘Há riquezas do Vaticano que são riquezas da humanidade, e nós apenas cuidamos delas’. E depois há também muitos imóveis. Com o aluguel, mantém-se o funcionamento da cúria romana e também o trabalho das missões, muitas obras sociais, hospitais e escolas”. Mas a gestão destes imóveis e destes aluguéis é um dos próximos passos da reforma: “Haverá mudanças”, garante Francisco.

Traduzido do italiano por André Langer. Acesse a versão original deste artigo, clicando aqui.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Segunda-feira, 9 de novembro de 2015 – Internet: clique aqui.

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