APÓS AS ELEIÇÕES - O CHOQUE DE REALIDADE
Governo de
(des)união
JOSÉ ROBERTO
DE TOLEDO
Aécio Neves e Dilma Rousseff - candidatos à Presidência da República |
O eleitorado está dividido como nunca esteve em uma eleição
presidencial brasileira (não creia em nada além de 51% a 49%). O Congresso Nacional virou uma S.A. de 28
acionistas minoritários [número de partidos que elegeram deputados federais
e senadores]. A eleição de governador é
a volta dos que não foram. Ou seja, o poder federal ainda mais disperso
frente ao poder concentrado dos caciques
regionais. O que esperar do(a) presidente nesse cenário? Depende de quanta
decepção se está disposto a sofrer.
Em caso de eleição de Aécio
Neves (PSDB), muitos de seus eleitores se darão por satisfeitos em apear o
PT do poder. À comemoração do setor empresarial e promessas de investimento se
seguirão alguns meses de “boom” [crescimento] do mercado financeiro.
Há uma bolha de crédito barato no mundo, esperando uma janela de oportunidade se abrir em algum canto. Se Dilma Rousseff (PT) perder, a vidraça vai ser pequena para a quantidade de dólares que deve assolar o país. A Bolsa vai subir, e o dólar deve cair. Mas, como diz um dos maiores investidores na Bovespa, toda vez que se dá muita moleza para o mercado a coisa não acaba bem.
Passados os 100 dias de lua-de-mel a que todo novo
presidente tem direito, será a hora de arrumar a casa, colocar as contas em
ordem, como prometido em campanha. É aí que as coisas complicam. Eleitor de Aécio
e especialista em gasto público, Mansueto
Almeida não se cansa de repetir que a
margem de manobra para o ajuste das contas federais é menos do que estreita.
Cortes de investimento e custeio tem lá seu apelo simbólico,
mas são insuficientes para produzir o tamanho do ajuste que os próprios
defensores desse ajuste julgam necessário. Para isso, só com reformas estruturais: tributária, previdenciária, trabalhista.
O tipo de reforma que precisa ser
aprovada pelo Congresso. Na Câmara onde o PSDB terá 54 dos 513 deputados. No Senado onde haverá 10 tucanos e 73 aves de plumagens diversas.
Impossível? Fernando Henrique Cardoso (PSDB) provou que
quando o presidente quer muito alguma coisa – no seu caso, aprovar o direito à
reeleição -, ele é capaz de consegui-la. Tudo depende do preço que está
disposto a pagar. Com o PMDB no comando
das duas Casas parlamentares, não será nenhuma pechincha.
Também é bom lembrar
que o poder presidencial não é ilimitado. Ao eleger-se, ele ganha um cacife
que tem que durar quatro anos. Se gastar muitas fichas de uma vez só,
arrisca-se a ficar descoberto e depender de empréstimos dos caciques que
comandam os partidos aliados – a juros que fariam Armínio Fraga corar.
Tudo isso sem falar
do Brasil real, onde vai continuar faltando água, energia e – se der azar –
sobrando gás lacrimogêneo.
E se Dilma for
reeleita? Esqueça o “boom” do
mercado financeiro e descarte a comemoração do empresariado. O resto é quase
igual.
Quando uma eleição presidencial fica muito polarizada, como
esta e tantas que a antecederam, o foco vai todo para os defeitos do
adversário. Os dois lados começam a
acreditar na própria propaganda negativa: o problema é o outro, basta retirá-lo
de cena que tudo se resolve. Se fosse assim, não estaríamos onde estamos,
pois os dois lados já passaram pelo poder.
Os entraves no
caminho do Brasil não são fulano ou beltrano. São as estruturas que reproduzem
milhares de fulanos e beltranos. A começar por um sistema eleitoral que
estimula a multiplicação partidária via aparelho excretor. Não há risco de dar
certo.
A eleição para deputado federal aumentou de inacreditáveis
22 para impossíveis 28 os partidos com representação na Câmara. É a fisiologia
do fisiologismo. A progenitora do toma lá dá cá.
Para começar a
reverter esse processo, basta proibir coligações partidárias nas eleições para
a Câmara. Pelas contas de Daniel Bramatti e Rodrigo Burgarelli, do Estadão Dados, seis legendas não teriam
eleito deputados sem pegar carona nos votos dos partidos coligados, e a Câmara
ficaria com 22 partidos. Inacreditável, mas não impossível.
Fonte: ESTADÃO.COM.BR
– Blogs – 13 de outubro de 2014 – 00h15 – Internet: clique aqui.
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