«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Só nos resta duas possibilidades: agonia curta ou longa e dolorosa!

DESCONTENTAMENTO À DIREITA

“Com impeachment, agonia seria curta”

Entrevista com Flávio Rocha
Presidente da Riachuelo

Alexa Salomão e Fernando Scheller

Segundo empresário, outra opção é de uma “agonia longa”,
com a presidente mais três anos e meio no poder
 
Flávio Rocha
Presidente da Riachuelo
Sem projeto e sem propósito. É assim que o presidente da Riachuelo, Flávio Rocha, define a economia brasileira hoje. O empresário, dono da terceira maior rede de moda do País, atrás da C&A e da Renner, atribui a crise que se instalou no País à política do primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff.

E fala, abertamente, que a atual gestão da presidente cria dois cenários para a economia: “Um é o de uma agonia curta, com impeachment. O outro, de agonia longa, cumprindo três anos e meio de mandato.” Em sua opinião, é urgente uma “cirurgia profunda” no Estado brasileiro, que vai muito além do ajuste fiscal, algo que o governo atual não tem condições ou vontade de fazer. A seguir, os principais trechos da entrevista de Rocha ao jornal O Estado de S. Paulo.

Como o sr. vê a economia?

Flávio Rocha: Vamos começar com uma boa notícia. Encerrou-se um ciclo. Um ciclo de ideias ruins, insustentável. A gente já vê os indícios fortes da mudança. A mudança vem da cabeça do eleitor, de um novo personagem que vai mudar a história do País: o eleitor-consumidor-cidadão. Ele sucedeu o eleitor súdito, que era o fiel da balança e representava uma grande base de 60% de pobreza. Ficava com o pires na mão para o Estado. Houve uma transformação demográfica e econômica. Hoje, o fiel da balança não é mais a base da pobreza. É o novo consumidor, com condição de resolver as paradas eleitorais que vêm pela frente. Ele enxerga o Estado de uma outra forma. Não cai mais no mito do Estado que resolve todos os problemas. Ele vê o Estado como vê a sua operadora de telefonia celular, de TV a cabo. Paga e exige reciprocidade. Esse novo perfil vai ser o estopim da mudança.

Para o sr., as manifestações contra o governo são promovidas pela nova classe média?

Flávio Rocha: Sim. O povo não está pedindo mais Estado. Está pedindo menos Estado. Está pedindo eficiência do gasto público, menos clientelismo, menos paternalismo. Em 2013, não. Ali acho que tinha uma confusão, tinha no meio os black blocs (grupo que ataca símbolos do capitalismo), uma coisa de movimentos sociais. Mas agora as manifestações dizem isso.

Para muitos, as manifestações são promovidas pelo pessoal da “varanda gourmet”.

Flávio Rocha: As pesquisas desmentem isso. O conflito que está instalado não é pobre contra rico. Não é patrão contra empregado. Não é Nordeste contra Sudeste. Não é trabalhador rural contra MST. Um país é como uma carruagem. As forças de tração dessa carruagem são o trabalhador e o empresário. E existe o Estado. Quando eu era deputado, na Constituinte (Assembleia Nacional Constituinte, entre 1987 e 1988), defendia a tese do imposto único. Subia na tribuna para me rebelar contra a carga tributária escorchante de 22% do PIB. Pois ela foi de 22% para 37%, mais 7% de déficit. Quer dizer: temos um Estado escandinavo no tamanho e centro-africano na eficiência. Ter esse nível de carga tributária com essa ineficiência é condenar o Brasil a ficar fora do jogo competitivo. Nós competimos com países onde as carruagens sustentam 15%, 17%, 20% do PIB de carga tributária. São carruagens que andam.

O sr. disse que está se encerrando um ciclo ruim. Pode explicar melhor?

Flávio Rocha: Um período de inchaço desmesurado da máquina do Estado e de ideias que levavam à crença de que existia outra saída para a prosperidade que não o trabalho. Que você podia ter uma casa, que é o bem mais desejado de uma família, sem trabalhar. Encerra-se um ciclo estatizante, socializante. O mundo todo já decidiu a questão ideológica sobre se os bens de produção devem estar nas mãos do Estado ou da iniciativa privada. Eu já tinha preguiça desse tema quando fazia faculdade. Hoje, mais ainda. Mas isso está em pauta.

O sr. acredita que o Estado pode ficar menor na gestão do atual governo?

Flávio Rocha: Acho que não. Ajuste fiscal é uma palavra muito suave para a gravidade do problema. A gente não precisa de ajuste fiscal. Precisamos de uma cirurgia de grande porte no Estado, que faça o Estado mudar de propósito. O Estado hoje existe em função de si mesmo. Ganhou vida própria. Há muito tempo, o Estado não existe em função da sociedade. Tornou-se intocável, blindado em si mesmo. Olhe o corporativismo dos professores. Outro dia, um secretário de Educação, de algum Estado, disse que teve uma reunião de três horas com o sindicato dos professores e não se falou uma vez a palavra aluno. Quer dizer: o aluno é um detalhe, está lá para atrapalhar. O que interessa é o corporativismo da máquina. Então, isso tem de ser respaldado pelas urnas. Infelizmente, o projeto que foi aprovado – se é que existia algum projeto – prega o contrário disso, desautoriza qualquer um que queira fazer uma cirurgia mais profunda. Mas, pela primeira vez, existe a perspectiva de um projeto liberalizante.

Como o sr. vê a discussão sobre o impeachment da Dilma, que foi pedido em algumas manifestações?

Flávio Rocha: Nós temos aí duas alternativas. Eu não acho que vai ser este o governo que fará o que tem de ser feito. O orçamento já é assumidamente deficitário e toda tentativa de cortes que é feita, a presidente bloqueia. Então, acho que existem dois cenários: um é o de uma agonia curta, com impeachment. O outro de agonia longa, cumprindo três anos e meio de mandato. Mas será uma agonia que não vai mudar nada. Há uma paralisia e qualquer um dos cenários – de aumento de impostos ou de diminuição do Estado – envolve retaguarda política, que não existe.

Mas o sr. é contra ou a favor do impeachment da Dilma?

Flávio Rocha: Se as contas forem rejeitadas e não houver o impeachment, é melhor rasgar a Lei de Responsabilidade Fiscal. É a pior sinalização que pode haver. Aí é o caos. A sinalização que isso traz para todos os governadores e prefeitos é devastadora. É chutar o pau da barraca. Neste momento, uma agonia curta seria um trauma menor.

O que seria a essa agonia?

Flávio Rocha: É o momento que nós estamos vivendo agora, a máquina parando, o desemprego aumentando, sem crescimento, sem investimento.

O sr. é empresário, o que está acontecendo que nós não estamos tendo investimento?

Flávio Rocha: Falta de propósito.

Foi isso que causou a paralisia?

Flávio Rocha: Primeiro, foi a falta de propósito. Propósito é fundamental. Você tem de olhar para a cara do seu governante, até do presidente da sua empresa, e enxergar adiante: “A Riachuelo daqui a dez anos vai ser isso, nessa Riachuelo daqui a dez anos tem lugar para mim, eu vou estar melhor, eu me identifico com o propósito da Riachuelo, que quer alargar as portas da moda, a moda que melhora a vida das pessoas”. Tem de ter essa identidade de propósito.

Então, estamos à deriva?

Flávio Rocha: Você olha para a Dilma e vê qual é o propósito? Se tem, não consegue transmitir, e se transmite é um propósito que hoje é extremamente minoritário. A capacidade, a energia do Brasil está adormecida, mas voltará quando surgir um novo projeto – e vai surgir porque nenhum espaço fica vazio por muito tempo na política.

E onde a presidente errou?

Flávio Rocha: Eu vi uma frase interessante no começo do governo Lula. Foi nas primeiras semanas: “Este governo vai dar certo porque está fazendo tudo que Fernando Henrique (ex-presidente Fernando Henrique Cardoso) fez, e sem o PT para atrapalhar”. E foi o que aconteceu. Mas a Dilma reverteu tudo o que tinha sido feito.

Como assim?

Flávio Rocha: Começou a acreditar em artificialismo. Ouvi uma colocação, acho que do Arminio Fraga (ex-presidente do Banco Central no governo de FHC). Ele disse: “Esse é um governo que não acredita em preços”. Quando você vê o preço do tomate aumentar é um alerta importante que denuncia uma escassez localizada. E o que se faz nessa hora? Nada. Deixa a ganância empresarial atuar. O produtor vai descobrir que tomate está dando lucro, mais gente vai produzir tomate, aumentar a oferta e o preço volta para onde estava. Dilma ignorou essas delicadas engrenagens da economia, jogou areia nas delicadas engrenagens, com intervenções de todo tipo, artificialismos.

O que o sr. acha das manifestações de empresários em favor do governo Dilma?

Flávio Rocha: Quando você fala do setor empresarial, existe muita confusão. Tem dois mundos completamente distintos. Tem o empresário de mercado e tem o empresário de conluio. Existe aqui o “cronismo”: termo que o Gustavo Franco (ex-presidente do Banco Central no governo de FHC) lançou em um artigo dele sobre o capitalismo crony (em tradução livre, capitalismo de apadrinhados, pois a palavra em inglês, derivada do grego, é uma gíria para amigo, afilhado). O PT, quando pensa em capitalismo, é: “Fulaninho, o que você quer?” O termo campeões nacionais, até outro dia, fazia parte do discurso nacional. Um absurdo. Vou eleger este aqui o rei da proteína animal, este aqui o rei da construção civil e este aqui o rei do óleo e gás. Isso é de uma arrogância, de uma onipotência... O mercado não conta. O governo torna irrelevante a opinião do mercado, força de cima para baixo com instrumentos de financiamentos, de juros subsidiados, que é mais uma perversa forma de intervencionismo. É assim: eu escolho você, dou dinheiro do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e tal. Isso é a antítese do capitalismo. Muitas vezes, você olha e diz: ah, são os empresários. Mas vai ver e o que tem é o clubinho do capitalismo de conluio.

E como é o outro grupo de empresários?

Flávio Rocha: O outro, do qual eu muito me orgulho de fazer parte, é aquele que vive do mercado, do consumidor. Se eu vou crescer mais do que Marisa, Pernambucanas ou Renner, só devo a um juiz: a dona Maria, que entra na loja e paga sua prestação de R$ 15. Somos escolhidos pelo mercado.

O sr. fala da necessidade de mudança, mas o Congresso não tem mostrado disposição em ajudar.

Flávio Rocha: Por falta de propósito (do governo atual). Por que a oposição vai se sacrificar, votar medidas antipáticas, quando o partido do governo quer fazer papel de mocinho? Tenho certeza de que esses mesmos deputados, com um novo propósito, uma nova sinalização, um novo chamamento, teriam um comportamento completamente diferente. O propósito tem o dom de fazer milagre.

O sr. não mencionou a Lava Jato. Não está no seu radar?

Flávio Rocha: A Lava Jato é a grande contribuição que sai desse episódio todo. A luta contra a corrupção não é feita apenas com leis, afastando pessoas sem éticas e colocando no lugar pessoas de boa índole. O que faz a corrupção são as regras do jogo. O estatismo é um convite à corrupção. O Estado grande é o habitat natural da corrupção.

E o que evita a corrupção?

Flávio Rocha: O antídoto à corrupção é o livre mercado. Para usar um exemplo simples: se eu tiver aqui na Riachuelo um comprador de gravatas corrupto, que recebe propina de um fabricante de gravatas da esquina, graças aos freios e contra pesos do mercado, a gravata da Riachuelo vai ser mais feia, de pior qualidade. Vou perder participação no mercado de gravatas e meu concorrente vai ganhar. Isso é o que Ronald Reagan (ex-presidente dos Estados Unidos) chamava de freios e contrapesos do mercado. O Estado, tão sabedor das suas limitações como gestor, quando entra num setor, a primeira coisa que faz é delimitar o mercado. Isso tira todos os freios à corrupção. Abre a porta para o superfaturamento. Começa com 10%, vai para 100% e para 1.000%, como estamos vendo. Se esse episódio nos tirar a cruz que repousa sobre o povo brasileiro, que é o monopólio do mercado de petróleo, entre tantos outros que temos no Brasil, a energia de criação de riqueza paga essa conta rapidamente, porque petróleo é um setor transversal. Os absurdos, os superfaturamentos impactam todos os demais setores. Todos dependem de frete, todos têm transporte. A Lava Jato é uma bênção para o Brasil, vem para limpar. É um sinalizador de que o Estado deve ser menor.

Qual a sua previsão para o varejo?

Flávio Rocha: O varejo teve o primeiro trimestre negativo depois de uma década em que cresceu sempre muito mais que a média do PIB. No primeiro semestre, fechou no negativo. Isso atinge de forma diferente os três subsetores. O de duráveis, onde estão os eletroeletrônicos, tem empresas com 20%, 30% de queda. Depois vem o setor de alimentos – até os alimentos estão sofrendo muito por causa da inflação. O que está sofrendo menos é o de semiduráveis – farmácia, têxteis, calçados, que têm até um certo crescimento. Nós estamos crescendo graças à expansão física (com novas unidades). Nas lojas abertas há mais de um ano, estamos estagnados. O que já é uma boa notícia, porque todo mundo está negativo nas mesmas lojas.

Geralmente, o segundo semestre tende a ser melhor. Isso não vai ocorrer em 2015?

Flávio Rocha: Será melhor em relação ao primeiro semestre, mas sempre fazemos a comparação com igual período do ano passado. Então, vai ser pior. O Dia dos Pais foi fraco. No Natal, vai se manter o marasmo. Não temos expectativa de recuperações. A carruagem está parando. A força de tração não é suficiente. O resultado disso é crescimento zero.

O sr. está pessimista?

Flávio Rocha: O empresário tem de partir do pressuposto que crise, por definição, é um episódio passageiro. Não se pode dimensionar a sua empresa para a crise, porque a crise passa e sua empresa fica despreparada para a bonança que, por definição também, vem depois das crises. Estamos abrindo lojas, construindo um centro de distribuição que é o estado da arte do setor. O “capex” (investimento na melhoria de bens de capital uma empresa) chega a R$ 500 milhões neste ano. No Brasil, só pode ser pessimista quem está com os olhos no curto prazo.

Fonte: O Estado de S. Paulo – Economia & Negócios – Domingo, 6 de setembro de 2015 – Pgs. B1 e B3 – Internet: clique aqui.

DESCONTENTAMENTO À ESQUERDA

Pacto contra o rentismo

Silvio Caccia Bava
Diretor e editor-chefe
Silvio Caccia Bava - Diretor do "Le Monde Diplomatique Brasil"

Não há “erros” praticados na condução do ajuste. É a defesa dos interesses rentistas [1] que define a política, em oposição a um amplo leque de atores que sofrem com essa estratégia.

A estratégia tem vários componentes: capturar o Estado e submetê-lo a seu estrito controle, apropriar-se da receita pública para proveito próprio, baixar o custo da força de trabalho, privatizar bens públicos, cortar políticas sociais, transformar a questão social numa questão de polícia.

Na crise, as grandes empresas aplicam no mercado financeiro para garantir seus lucros, mas as pessoas passam a ter menos dinheiro para consumir, o aumento do desemprego rebaixa os salários e a pobreza retoma seu espaço no lar das maiorias. Com isso, o mercado se contrai e o faturamento dos comerciantes e prestadores de serviços cai. As pequenas e médias empresas se veem em dificuldades. Evidentemente, há muita gente descontente, e o grande vilão são os juros

Contra a alta dos juros e em favor da manutenção do emprego, da ampliação da capacidade de consumo e da dinamização do mercado interno, podemos observar manifestações recentes de centrais sindicais, da Fiesp, da Abimaq, entre outras importantes entidades dos trabalhadores e empresariais.

É preciso superar a interdição do debate sobre as alternativas de desenvolvimento e trazer para o espaço público as análises e propostas que podem enfrentar a crise de uma perspectiva que garanta a retomada do crescimento com inclusão social e sustentabilidade ambiental.

Há questões que a conjuntura estimula a pensar. É possível estabelecer pactos sociais pontuais para enfrentar as políticas macroeconômicas do rentismo? O impacto do ajuste, que começa a ser mais intenso agora, abre uma oportunidade ímpar de negociações e articulações para organizar a resistência e a reversão dessas políticas.

Há, no entanto, uma condição essencial: a reapropriação do espaço público. Os cidadãos, e suas representações coletivas, precisam vir a público debater suas ideias, suas posições. É o contrário do panelaço, que interdita a fala. É preciso assegurar aos cidadãos brasileiros que há estratégias alternativas para superarmos a presente crise, sem que a conta recaia unicamente nas costas dos mais pobres.

Sabemos que a democracia está em risco, violada em todos os poderes da República, violada no respeito mútuo que a igualdade de direitos deveria assegurar entre os cidadãos. Caminhamos para a radicalização, a violência, regimes autoritários.

Essa tendência, no entanto, pode ser revertida. É uma tarefa para a cidadania ativa. No mundo, e aqui mesmo, assistimos recentemente a enormes manifestações de rua. No nosso caso, desde junho de 2013, e mesmo antes, se considerarmos o número crescente de greves e manifestações dos movimentos sociais, os cidadãos estão se reapropriando do espaço público. A particularidade deste momento é a presença das classes médias nas ruas. Há uma disputa do espaço público e das narrativas que explicam a crise e apontam seus responsáveis.

Mesmo com toda a mídia contra, as forças sociais de resistência ao ajuste ainda têm espaço de expressão pública e podem conquistar espaços mais amplos. Agregando distintos setores sociais, a combinação de seus esforços pode ampliar a adesão social ao movimento de resistência. Porque é disto que se trata: disputar na sociedade as alternativas de desenvolvimento. Não sobraram instituições políticas capazes de processar os conflitos sociais.

A democracia e suas instituições serão revigoradas apenas por pressão social e por mudanças nas políticas macroeconômicas que atendam aos interesses das maiorias. Neste momento trata-se de politizar o social e socializar a política. Trata-se de realizar um enorme esforço de esclarecer a cidadania, organizar debates públicos, apresentar e debater propostas de saída para a crise, para construir um Brasil melhor para todos.    

Já há uma trajetória de acúmulos nos debates e negociações sobre a possibilidade de pactos sociais que envolvam atores interessados na promoção do desenvolvimento sustentável com inclusão social. Pouco tempo atrás, depois de um ano de debates, o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social apontou para a possibilidade efetiva de estabelecer um mínimo denominador comum, um conjunto pequeno de proposições que alinham interesses e atores diversos num compromisso de ação para superarmos a presente crise.

A construção de um pacto contra o rentismo vai se tecendo. A recente declaração conjunta de todas as centrais sindicais em defesa do emprego e da democracia é um importante passo nesse sentido. Mas o acontecimento mais importante na perspectiva de articular as forças de resistência ao ajuste é o lançamento, neste mês, da Frente Brasil Popular. Passam a agir em conjunto movimentos, entidades, associações, sindicatos e partidos, fundamentalmente para lutar contra o rentismo, ampliar o espaço público e debater com a sociedade a encruzilhada do nosso desenvolvimento.

Há uma necessidade sentida por toda parte, nos bares, nos ônibus, nas conversas, nesta particular conjuntura, de um debate nacional sobre o futuro do país. Como superar a crise? Qual desenvolvimento queremos? Como chegar lá? Criar novos espaços para abrigar essas preocupações e debatê-las pode aglutinar distintas forças sociais. Pode mesmo criar condições para que se convoque um Fórum de Desenvolvimento e se convidem entidades patronais para o diálogo.

O diálogo e o debate são o caminho para o resgate da democracia, para a negociação de novos pactos sociais, para sairmos do estrangulamento econômico que o ajuste nos impõe. Para isso a sociedade precisa se dotar de instrumentos e espaços para o diálogo. Há exemplos, como as “mesas de concertación” no Peru, de construção de mesas de diálogo nacionais e regionais com a participação de todas as classes sociais, para negociar o modelo de desenvolvimento e questões específicas. O futuro se decide agora.

N O T A

[ 1 ] - Afinal, o que é o rentismo? Há diferentes definições para o termo, mas basicamente denomina comportamentos em que uma organização ou pessoa obtém lucro ou rendas extraindo-a da sociedade. É uma maneira de enriquecer não criando riqueza, mas tirando riqueza dos outros. Para usar a famosa imagem que simboliza a riqueza do país, os rentistas buscam tirar uma fatia maior do bolo, em vez de fazer ele crescer. São assim atividades que, ainda que sejam racionais economicamente do ponto de vista privado, prejudicam a sociedade. O Brasil pode ser considerado em boa medida uma sociedade rentista. No sistema econômico brasileiro, muitas vezes as empresas ganham mais conseguindo privilégios do que com investimentos produtivos e em desenvolvimento de inovações. Isso tem um efeito distorcivo [sic] na atividade econômica, pois incentiva as empresas a usarem mais tempo, talento e dinheiro na garantia de posições privilegiadas do que em atividades que gerem riqueza para a sociedade (Fonte / Para saber mais: Gazeta Vargas).

Fonte: Le Monde Diplomatique Brasil – Editorial – Ano 9 – Número 98 – Setembro 2015 – Pg. 5 – Internet: clique aqui.

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