«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

terça-feira, 6 de setembro de 2016

Debate sobre a formação do clero católico

Deslocar seminaristas levanta o debate sobre a
formação do futuro clero

Robert Mickens
National Catholic Reporter
02-09-2016

Apesar de muitas pessoas terem interesse no atual sistema de
formação de sacerdotes, uma radical mudança precisa acontecer
DIARMUID MARTIN
Arcebispo de Dublin, na Irlanda

Todos os caminhos levam a Roma.

E um caminho em particular – na verdade, um trajeto aéreo do Aeroporto John Kennedy, em Nova York, para o Aeroporto Leonardo da Vinci (Fiumicino) em Roma – me trouxe aqui a exatamente 30 anos atrás.

Era o dia 30 de agosto de 1986. (Desde então estou aqui, após eu ter vivido um ano na Suíça e passado seis meses nos Estados Unidos.)

Essa data é fácil lembrar porque, no dia anterior, quando eu e outros 35 seminaristas americanos partimos em direção à Cidade Eterna, celebrava-se a festa litúrgica da Decapitação de João Batista.

Por vezes, em momentos inesperados de altos e baixos nos primeiros meses principalmente, nós nos perguntávamos se tal data não era algum tipo de presságio.
Mais tarde ficou claro que, de fato, muitas pessoas perderam a cabeça (pelo menos de modo figurativo) nessa antiga cidade de santos e pecadores. Em tempo, também aprendemos que Roma é um lugar onde alguns perdem a fé.

Em nosso próprio mundo rarefeito, vivendo no Pontifício Colégio Norte-Americano e frequentando uma das pontifícias universidades da cidade, veríamos alguns do nosso grupo se agarrarem com mais tenacidade às vacas sagradas, coisas que eles acabaram confundindo com a crença católica.

Mas a maioria de nós iria sucumbir dolorosamente à experiência impotente e muitas vezes solitária de ver ídolos piedosos desmoronar diante de nós. E isso abriria a possibilidade de ou embarcar em uma jornada mais profunda da fé cristã marcada pela responsabilidade pessoal e por um discernimento cuidadoso, ou buscar refúgio em uma instituição eclesial regrada onde se finge que tudo é preto e branco.

O Papa Francisco me fez recordar estas ideias após algumas observações que fez a respeito da formação sacerdotal enquanto falava em privado no mês passado na Polônia com um grupo de companheiros jesuítas.

“Igreja precisa, hoje, crescer na capacidade de discernimento espiritual”, disse ele aos cerca de trinta confrades em 30 de julho.

“Alguns planos de formação sacerdotal correm o risco de apresentar ideias demasiado claras e distintas”, com limites e critérios “que são definidos a priori, rigidamente (...) e que põem de lado as situações concretas”, continuou o papa.

É preciso verdadeiramente perceber isto: na vida nem tudo é preto ou branco. Não, na vida prevalecem os tons de cinza. (…) Por isso, é preciso compreender estes aspectos onde as coisas não são claras”, concluiu Francisco.

Eu gostaria apenas de salientar algumas poucas questões que estes comentários fazem surgir em mim à luz da experiência de ter vivido em Roma, e especialmente em seu ambiente eclesiástico, nas últimas três décadas. Para isso, irei considerar alguns eventos recentes que envolvem a formação de jovens seminaristas.

O primeiro pensamento que destaco diz respeito ao atual método ou sistema de preparar membros da religião cristã para serem presbíteros (isto é, sacerdotes ordenados). O segundo tem a ver com a adequação de levar a cabo tal preparação (formação sacerdotal) em Roma.

Recentemente, Dom Diarmuid Martin, [arcebispo] de Dublin, foi motivo de manchetes quando declarou que estava retirando os seus seminaristas que estudavam no seminário nacional do país, o St. Patrick’s College, em Maynooth, Irlanda [veja foto abaixo], e mandando-os para o Pontifício Seminário Irlandês, em Roma.
SAINT PATRICK'S COLLEGE - SEMINÁRIO NACIONAL DA IRLANDA
Maynooth - Irlanda

Segundo falou, ele estava fazendo isto em decorrência do que vinha ocorrendo em Maynooth, coisas aparentemente ligadas a acusações anônimas de comportamento e intrigas impróprias envolvendo homossexualidade, o que incluía o uso, de parte de alguns estudantes, do aplicativo de celular Grindr, para encontros entre pessoas do mesmo sexo.
Os outros bispos da Irlanda ficaram surpresos e quase todos comprometeram-se em manter seus alunos estudando no seminário nacional.

Isso não impediu o conselho administrativo do seminário de aplicar imediatamente um “curativo” para consertar o suposto problema: os seminaristas terão agora que fazer suas refeições noturnas na companhia de seus superiores, ao invés de jantar fora; deverão também participar de uma recitação comunitária do rosário às 21 horas.

Os administradores do Maynooth devem achar que os seminaristas são capazes de agir em seus desejos sexuais somente à noite e que quaisquer ações podem ser impedidas com um monitoramento cuidadoso dos jovens e mantendo-os reclusos no prédio.

Na verdade, não acho que eles pensam isso. Mas suspeito que Martin acabou envergonhando-os com a sua decisão abrupta e drástica, de forma que os fez se sentirem obrigados a tomarem uma atitude.

Suspeito que o arcebispo de Dublin, alguém que passou a maior parte de sua vida sacerdotal em um escritório no Vaticano, não está feliz em mandar os seus seminaristas a Roma. Pelo contrário, ele considera essa atitude a única forma de incitar uma discussão mais importante e urgente a respeito da natureza da formação sacerdotal.

Ele já começou a falar sobre a possibilidade de criar um modelo de aprendizagem de preparação de futuros padres onde os candidatos morariam em paróquias ou em outros ambientes – em vez de seminários, que ainda estão modelados segundo uma programação monástica e de reclusão – enquanto estudam em universidades locais. [A busca por novos modelos de formação dos futuros padres]

Martin terá dado uma contribuição fundamental à Igreja caso este tipo de modelo venha a ser estudado com mais cuidado e se levar a uma reforma em grande escala do atual sistema de formação sacerdotal (até mesmo deixando de lado outras questões cruciais como o sacerdócio restrito a homens e o celibato obrigatório). Existem muitas maneiras de como estas coisas poderiam ser desenvolvidas.

Será uma batalha, no entanto. Muitas pessoas têm interesses em torno do atual status quo. Os seminários tradicionais precisariam redefinir suas missões (como alguns já começaram a fazer) ou fechariam, mesmo se forem considerados necessários como centros de discernimento ou formação espiritual – à semelhança dos programas de noviciado existentes nas ordens religiosas.

E quanto a mandar seminaristas para se preparar em Roma?

Não pareceria oportuno se a ideia – conforme deixa claro o Papa Francisco – é evitar dar-lhes “ideias demasiado claras e distintas” e “limites e critérios que são definidos a priori, rigidamente, (…) que põem de lado as situações concretas” nas quais eles estarão ministrando. Os seminaristas deveriam se preparar na – e para a – cultura e lugar onde irão atuar. Os estudos no exterior poderiam ser melhor empreendidos após alguns anos ordenação e serviço local. [Somente para pós-graduação: mestrado e doutorado, por exemplo]

É por isso que considero ainda mais alarmante que o seminário St. John Vianney College, em St. Paul, Minnesota [ver voto abaixo], esteja enviando 15 de seus alunos para morar e estudar no Pontifício Colégio Irlandês. O St. John Vianney é o seminário preparatório de teologia para a Arquidiocese de St. Paul-Minneapolis, mas forma seminaristas de 19 dioceses norte-americanas.
SAINT JOHN VIANNEY COLLEGE
Saint Paul (Minnesota - Estados Unidos)

Anteriormente, estes seminaristas tinham a opção de estudar um semestre em Roma, mas com estudantes leigos no Campus Bernardi da Universidade de São Tomás, onde normalmente estudam. A mudança parece buscar manter os candidatos ao ministério sacerdotal separados de outros fiéis batizados que não estão em fase de discernimento espiritual. Este movimento é pensado para “proteger” uma vocação incipiente, mas também tem servido para formar atitudes de pertencimento a uma casta separada, clerical. [Aliás, papa Francisco tem insistido muito sobre o perigo do clericalismo!]

Simplificando: este é o modelo que foi confirmado por João Paulo II em sua exortação apostólica pós-sinodal de 1992, Dabo Pastores Vobis, e que teve continuidade com Bento XVI.

Mas Dom Diarmuid Martin, intencionalmente ou não, pode ter desferido o primeiro golpe a esta prática inadequada e ultrapassada, que não está conseguindo produzir padres eficientes para as necessidades e a missão da Igreja. Ironicamente, talvez, ele inspirou o esforço de percorrer um trajeto que, mais uma vez, leva à Roma.

Traduzido do inglês por Isaque Gomes Correa. Acesse a versão original do artigo, clicando aqui.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Terça-feira, 6 de setembro de 2016 – Internet: clique aqui.

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