«Quando devemos fazer uma escolha e não a fazemos, isso já é uma escolha.» (William James [1842-1910]: filósofo e psicólogo norte-americano)

Quem sou eu

Jales, SP, Brazil
Sou presbítero da Igreja Católica Apostólica Romana. Fui ordenado padre no dia 22 de fevereiro de 1986, na Matriz de Fernandópolis, SP. Atuei como presbítero em Jales, paróquia Santo Antönio; em Fernandópolis, paróquia Santa Rita de Cássia; Guarani d`Oeste, paróquia Santo Antônio; Brasitânia, paróquia São Bom Jesus; São José do Rio Preto, paróquia Divino Espírito Santo; Cardoso, paróquia São Sebastião e Estrela d`Oeste, paróquia Nossa Senhora da Penha. Sou bacharel em Filosofia pelo Centro de Estudos da Arq. de Ribeirão Preto (SP); bacharel em Teologia pela Pontifícia Faculdade de Teologia N. S. da Assunção; Mestre em Ciências Bíblicas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma (Itália); curso de extensão universitária em Educação Popular com Paulo Freire; tenho Doutorado em Letras Hebraicas pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente, realizo meu Pós-doutorado na PUC de São Paulo. Estudei e sou fluente em língua italiana e francesa, leio com facilidade espanhol e inglês.

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Os bispos estão na pauta da Igreja hoje

O grande “gelo” entre o Papa Francisco e os bispos

Carlo Di Cicco
Tiscali
18-09-2016

O projeto proposto por Francisco é claro:
significa passar de uma Igreja percebida pelas pessoas como uma estrutura rígida a qual as pessoas devem sacrificar grande parte da sua vida a uma Igreja percebida como estrutura próxima das pessoas.
Mas cresce o número daqueles que não entendem aonde Bergoglio efetivamente quer levar a Igreja, sem indicar, ao mesmo tempo, as regras que ajudem no caminho da conversão.
PAPA FRANCISCO
dialoga com grupo de bispos em visita "Ad Limina Apostolorum"

Entre os bispos e o Papa Francisco está em curso uma partida importante, talvez a mais importante para que o futuro da Igreja Católica seja diferente do passado, mais próximo das necessidades das pessoas e mais distante das alianças com os poderosos e os poderes do mundo.

Trata-se de uma partida de resultado não óbvio, que se joga com arte refinada do florete e não com as espadas. Tão refinada que nem sempre aparece aos olhos de todos, mas apenas dos especialistas das coisas eclesiásticas. Especialistas que, há algum tempo, vão detectando sinais de um certo desconforto com o qual muitos bispos e cardeais, não só na Cúria romana, mas em diferentes partes do mundo, acompanham os pedidos do Papa Francisco, que quer levar a Igreja a trabalhar no fronte da misericórdia.

Não se trata de uma operação simples, porque, na Igreja, convivem muitas culturas, muitas sensibilidades, muitas histórias e muitas tradições. A intenção do papa é de respeitar as diversidades, na medida em que se movem no contexto inovador da misericórdia.

Isso significa passar de uma Igreja percebida pelas pessoas como uma estrutura rígida à qual as pessoas devem sacrificar grande parte da sua vida a uma Igreja percebida como estrutura próxima das pessoas, capaz de entender e compartilhar as suas dificuldades, esforços, feridas. Uma Igreja samaritana que se detém para enfaixar e curar as fraquezas, em vez de impiedosa que passa ao largo daqueles que não são perfeitos. Uma Igreja que, caminhando ao lado das pessoas, se comporta como Jesus, bom pastor que acolhe a todos e respeita os tempos de todos para se pôr a agir de acordo com o Evangelho.

Os bispos, em sua maioria, compartilham essa indicação no plano dos princípios, mas cresce o número daqueles que não entendem aonde Bergoglio efetivamente quer levar a Igreja, sem indicar, ao mesmo tempo, as regras que ajudem no caminho da conversão.

O desconforto de vários bispos, também italianos, apenas raramente se tornou público, mas, até agora, tenta se espalhar através de murmurações, boatos, fofocas: um modo que Francisco rejeita e repreende. Mas são rumores fundamentados, recolhidos e contados também por uma revista católica italiana considerada de renome e informada. Lá, leem-se desafogos documentados – embora anônimos – de muitos bispos. Estes se sentem repreendidos pelo papa, em vez de envolvidos, e enfatizam que dar a prioridade a uma Igreja em saída e hospital de campanha para os mais fracos, os pobres e os sofredores pode fazer sentido, mas o que fazer com todo o restante sobre o qual se ergueram as comunidades diocesanas e paroquiais?

Nas reformas iniciadas no Vaticano, ele tenciona levar na direção de realizar uma Igreja da misericórdia, para a qual são necessários bispos bons pastores mais do que burocratas e administradores.

Justamente nestes dias, ao se encontrar com os bispos recém-nomeados, ele lhes lembrou da necessidade de que "a misericórdia forme e informe as estruturas pastorais das nossas Igrejas. Não tenham medo de propor a Misericórdia como resumo daquilo que Deus oferece ao mundo, porque o coração do homem não pode aspirar a nada maior".

Bergoglio não se sente isolado no grande projeto de içar a bandeira da misericórdia como bandeira da Igreja do Concílio. Como Bento XVI, "meu venerado e sábio predecessor", ensinou, é "a misericórdia que põe um limite ao mal. Nela, expressa-se a natureza totalmente peculiar de Deus – a sua santidade, o poder da verdade e do amor". Ela é "o modo com o qual Deus se opõe ao poder das trevas com o seu poder diferente e divino", justamente "o da misericórdia". Portanto, não se deixem assustar pela prepotente insinuação da noite.
Uma Igreja samaritana, próxima e solidária aos mais pobres e necessitados

"O rosto da Misericórdia é Cristo". Assim, "sejam bispos capazes de acompanhar", como o bom samaritano. "Sejam bispos com o coração ferido por tal misericórdia e, portanto, incansável na humilde tarefa de acompanhar o homem que, ‘por acaso’, Deus colocou no caminho de vocês". O primeiro acompanhamento é para os sacerdotes, aqueles que estão no meio das pessoas todos os dias. Muitos problemas existem porque nem sempre o clero serve o povo de Deus, mas se serve dele. Requer-se uma requalificação do clero.

Francisco não se deixa intimidar por resistências verdadeiras ou supostas. Ele joga o jogo do consentimento sopesado também com os núncios. Ao se encontrar com eles para um jubileu sem precedentes, Francisco lhes lembrou que, em Roma, está Pedro, "no papa que a providência quis que houvesse".

"Obrigado – disse ele aos núncios – pela fidelidade com que vocês interpretam com o coração indiviso, com a mente íntegra, com a palavra sem ambiguidades aquilo que o Espírito Santo pede a Pedro para dizer à Igreja neste momento. Obrigado pela delicadeza com que vocês ‘auscultam’ o meu coração Pastor universal e tentam fazer com que esse fôlego alcance as Igrejas às quais sou chamado a presidir na caridade."

Ele não discute a fidelidade, mas a considera como um pré-requisito para fazer os núncios. Por isso, ele também lhes recorda o mandato de fidelidade a uma Igreja da misericórdia e da proximidade às pessoas. "Que a relação de vocês com a comunidade civil se inspire na imagem evangélica do Bom Pastor. Que o verdadeiro poder da Igreja brote do coração de Cristo, e, portanto, seja o poder da Misericórdia. Essa consciência nos impulsiona a dialogar com todos e, em muitos casos, a nos fazer voz profética dos marginalizados pela sua fé ou pela sua condição étnica, econômica, social ou cultural: que o seu grito se torne o nosso e, juntos, possamos despedaçar a barreira de indiferença que, muitas vezes, reina soberana para esconder a hipocrisia e o egoísmo."

O papa não esconde que se trata de um projeto de longo prazo que requer anos e, por isso, confessa que "uma das minhas grandes preocupações diz respeito à seleção dos futuros bispos".

Com o tempo, o papa e os bispos vão se entender melhor? Francisco está convencido disso, ao ressaltar "a exigência que cada vez mais devemos assumir": a de "operar em uma rede unitária e coordenada".

Traduzido do italiano por Moisés Sbardelotto. Para acessar a versão original deste artigo, clique aqui.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Quinta-feira, 22 de setembro de 2016 – Internet: clique aqui.

Quando os bispos desistem das
Conferências Episcopais

Massimo Faggioli*
Global Pulse
20-09-2016

A Igreja está lutando para deixar para trás uma visão de mundo que a absorve inteiramente para tornar-se uma igreja que se envolve com o mundo.
ASSEMBLEIA GERAL DA CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL - CNBB
Uma das conferências mais ativas e atuantes do mundo católico

Uma das transições difíceis que a Igreja Católica está tentando fazer é a de uma visão de mundo – isto é, uma Weltanschauunginteiramente voltada a si mesma para uma Igreja pastoral engajada no mundo.

Quanto mais o catolicismo tenta se apresentar como uma visão de mundo separada que divide o mundo em dois, tanto mais os católicos (especialmente os jovens) retiram-se do campo de batalha, tendo já o suficiente para lidar na zona de combate que é a vida diária.
A percepção inicial da exortação do Papa Francisco intitulada Amoris Laetitia é um bom exemplo disso.

A assembleia do Sínodo dos Bispos sobre o matrimônio e a família terminou quase um ano atrás (24 de outubro de 2015) e a exortação do papa foi publicada há quase seis meses (8 de abril de 2016). A recepção deste documento está em curso e a forma como ela vem se desdobrando diz algo sobre a situação da Igreja Católica hoje.

Um aspecto típico do catolicismo contemporâneo é uma divisão entre os bispos. A primeira divisão segue linhas geoculturais. Os bispos da região de Buenos Aires produziram orientações para a publicação da exortação pós-sinodal em que falam sobre a possibilidade aos fiéis divorciados e recasados que não vivem “em castidade” de receberem a Comunhão após um processo de discernimento junto de seus pastores.

Francisco enviou a estes bispos uma carta – conforme informado pelo jornal oficial do Vaticano L’Osservatore Romano – endossando a interpretação dada a este documento.
Isto tudo, porém, se dá no extremo sul das Américas. 
D. CHARLES CHAPUT
Arcebispo de Filadélfia - Estados Unidos

Na América do Norte, a recepção de Amoris Laetitia parece ser bastante diferente. Dom Charles Chaput, de Filadélfia (o qual, em junho passado, foi nomeado presidente do grupo de trabalho dos bispos americanos encarregado de implementar a exortação) emitiu suas próprias orientações no dia 1º de julho para a Arquidiocese de Filadélfia.

Ele provavelmente quer que suas diretrizes se tornem um padrão para outras dioceses dos Estados Unidos também.

O documento de Chaput deixa claro que a interpretação oficial e pastoral da exortação não levará em consideração o contexto teológico das suas assembleias sinodais de 2014-2015. Tampouco irá considerar certos trechos de Amoris Laetitia.

Quanto às pessoas divorciadas e recasadas no civil, o ensinamento da Igreja exige-lhes que se abstenham de intimidade sexual. Isto aplica-se até mesmo em casos em que eles devem (para o acompanhamento dos filhos) continuar a viver sob o mesmo teto”, dizem as orientações do arcebispo.

Aceitar viver como irmão e irmã faz-se necessário aos fiéis divorciados e recasados para que recebam a reconciliação no Sacramento da Penitência, o que poderá, então, abrir caminho para a Eucaristia. Tais pessoas são encorajadas a aproximarem-se do Sacramento da Penitência regularmente, recorrendo à grande misericórdia de Deus nesse sacramento caso falharem em castidade”, continua o texto do arcebispo.

Ao norte da fronteira com os Estados Unidos, no Canadá as orientações emitidas pelos bispos católicos de Alberta e dos Territórios do Noroeste adotam uma abordagem semelhante e negam a ideia de que o Sínodo e Amoris Laetitia tenham trazido alguma mudança.

Por meio da imprensa, amigos ou família, pode ter acontecido que casais tenham sido levados a achar que houve alguma mudança na prática da Igreja, de modo que agora seria possível eles receberem a Sagrada Comunhão caso tenham um a conversa com o padre. Esta visão é errônea”, dizem os bispos.

“Os casais que manifestam este desejo devem ser acolhidos por um padre para que ouçam novamente o ‘projeto de Deus [referente ao matrimônio] em toda a sua grandeza’ (Amoris Laetitia, n. 307) e, portanto, que sejam ajudados a compreender o caminho correto a seguir em direção à plena reconciliação com a Igreja. Para que se torne possível uma tal caminhada de cura e reconciliação de maneira que permaneça obediente ao mandamento de Cristo de que ‘o que Deus uniu não o separe o homem’, a Igreja estabeleceu os seus tribunais matrimoniais”, insistem os prelados canadenses.

A questão de quem são os divorciados novamente casados não é o único foco de Amoris Laetitia. No entanto, ela é sintomática do tipo de recepção que o documento de Francisco está tendo em outros aspectos também, tais como a questão dos homossexuais na Igreja.

Não há dúvidas de que a recepção teológica do Sínodo está acontecendo nos Estados Unidos e não somente aí.

E o que tem ocorrido na recepção de Amoris Laetitia entre os bispos demostra duas questões.

1ª) A primeira é a diferença entre a recepção pastoral e a recepção que tenho chamado de “visão de mundo ou Weltanschauung. Em artigos publicados no sítio Global Pulse [clique aqui], já falei sobre a diferença entre uma abordagem pastoral e uma abordagem ideológica às questões levantadas pelo Papa Francisco.

O problema com Amoris Laetitia na América do Norte é que o debate sobre o matrimônio é levado para o lado da biopolítica (leis sobre o aborto, a eutanásia, sexo, etc.). Este marco tem sido um fator central e fundamental para a maneira como o magistério católico tem visto a modernidade ao longo dos últimos cinquenta anos.

A tendência a pôr a questão dos católicos divorciados e recasados juntamente com outras questões que são cultural e pastoralmente mais perturbadoras (como, nesse exemplo, a eutanásia) revela que o problema é mais profundo: trata-se de uma Weltanschauung, uma visão totalmente absorvente de mundo e de Igreja. Infelizmente, a reação de alguns bispos à Amoris Laetitia está condicionada por um contexto em que, como acontece com o aborto, a eutanásia, etc., a prática pastoral com os divorciados que voltaram a se casar não pode mudar porque, acredita-se, ele nunca mudou.

2ª) A segunda questão que quero analisar é como e onde a recepção e a implementação dos ensinamentos de Francisco (com base no Sínodo) está ocorrendo. A recepção tem acontecido mais no nível das trocas públicas na imprensa do que onde deveria mais propriamente acontecer: quer dizer, em ambientes eclesiais como as conferências episcopais e os sínodos diocesanos. 
D. ROBERT MCELROY
Bispo de San Diego - Estados Unidos

Mas há exceções. Por exemplo, Dom Robert McElroy, de San Diego (Estados Unidos), decidiu convocar um sínodo diocesano sobre o matrimônio e a família.

Infelizmente, tais iniciativas como essa de San Diego continuam sendo exceções.
O fato é que mesmo onde há bispos dispostos a falar sobre os ensinamentos do Papa Francisco e seu impacto na vida diária dos católicos, eles não estão fazendo-o dentro de suas conferências episcopais.

Recentemente, em um discurso proferido na Universidade de Notre Dame, Chaput comparou Washington, DC, a um “grande golem mecânico”; isto é, um monstro.

No folclore judaico, um golem é um ser antropomórfico animado, magicamente criado inteiramente de matéria inanimada. Nos salmos e em escritos medievais, essa palavra era empregada para significar algo amorfo. Alguns bispos parecem ter a mesma percepção para com suas conferências.

As conferências episcopais nacionais são a mudança institucional singular mais importante na Igreja posterior ao Vaticano II.

Suspeito, porém, que, nesse exato momento, muitos bispos (e não só os bispos dos Estados Unidos) enxergam essa instituição como não sendo significativa para o ministério pastoral ou para a vida da Igreja. No pior dos casos, eles veem as conferências como um golem.

Isto é paradoxal porque os documentos das conferências episcopais são uma das fontes mais importantes para as encíclicas e exortações de Francisco, enquanto a Cúria Romana, neste seu pontificado, tem produzido muito menos documentos do que antes. Na verdade, neste momento tem havido um novo espaço para os bispos trabalharem em nível nacional, o que poderia sugerir o início de uma nova fase na vida das Conferências dos Bispos em todo o mundo. Porém, não é o que está acontecendo, pelo menos não ainda. No momento, muitas conferências episcopais parecem quase paralisadas.

O problema é que muitos bispos pastorais, que percebem um racha profundo entre uma Igreja pastoral e uma Igreja Weltanschauung [ideológica = com uma visão voltada para si mesma!], parecem estar escolhendo retirarem-se e não mais se engajar nas conferências nacionais. Há bem poucos “bispos ao estilo Francisco” liderando as conferências de seus países ou que estejam visivelmente ativos em tentar transformar estes ambientes num lugar para a recepção do magistério papal (cf. os casos dos Estados Unidos, da Itália e da Europa oriental; a Alemanha e a Áustria são exceções).
Tradução livre do título:
"A ascensão laical: movimentos eclesiais a partir do
Vaticano II"

A impressão que tenho é que muitos dos bispos que querem uma Igreja pastoral e não uma Igreja ideológica acabaram se desiludindo com suas conferências episcopais.

Eles simplesmente deixaram a liderança dessas instituições a “bispos Weltanschauung”, os quais não têm interesse em receber o que está vindo de Roma atualmente. Eis uma reversão verdadeiramente estranha das coisas, dado que durante os últimos cinquenta anos esses mesmos guerreiros culturais tentaram reduzir as conferências episcopais a nada mais que megafones do Vaticano.

Tradução do inglês por Isaque Gomes Correa. Acesse a versão original deste artigo, clicando aqui.

* MASSIMO FAGGIOLI, professor de teologia na Villanova University, na Pensilvânia (Estados Unidos) e o seu mais recente livro intitula-se “The Rising Laity. Ecclesial Movements Since Vatican II” (Paulist Press, 2016), em tradução livre: A ascensão laica. Movimentos eclesiais a partir do Vaticano II.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos – Notícias – Quinta-feira, 22 de setembro de 2016 – Internet: clique aqui.

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