Consequências de um Estado falido!
Rio virou um “filme de terror”, diz moradora
Roberta
Pennafort
Crise financeira do Estado afetou a vida de quem mais
precisa
dos serviços públicos, isto é, os mais pobres
Escola
sem merenda, hospital sem remédio, universidade com serviços claudicantes de
limpeza e segurança, delegacia vivendo à custa de doações de papel e de tinta
para impressora. Os impactos sociais do
colapso financeiro do Estado do Rio vêm sendo sentidos desde o ano passado pela
população, que teme agora por 2017.
“Tem
dia em que você está na fila da merenda e falam: ‘acabou!’. Aí tenho de comprar
quentinha, que custa R$ 10. Não sei onde vamos chegar desse jeito”, lamentou Laura Vitória Fraga dos Santos, de 16
anos, aluna do 1º ano do ensino médio do Colégio
Estadual Julia Kubitschek, no centro do Rio.
“Na minha escola antiga, o almoço eram três
biscoitos de água e sal, e nem tinha para todo mundo. Pedi transferência
por causa disso, mas agora nem sei se continuo aqui ano que vem”, disse Laura,
que está na nova escola há quatro meses
e ainda não recebeu os livros. Quando tem prova, precisa fotografar as
páginas dos livros dos colegas para poder estudar. O cartão de transporte, que permite que ela ande gratuitamente no
ônibus para ir à aula, tampouco lhe foi entregue. “O que dizer de um Estado que não dá merenda nem transporte para os
estudantes? É o fundo do poço”, criticou o pai dela, o aposentado Laurinésio dos Santos, de 71 anos.
Cerca
de 70 escolas estaduais foram ocupadas
por alunos por dois meses, entre março e maio, em apoio à greve dos
professores e como forma de pressionar o governo pelo aprimoramento das
condições de ensino. Na ocasião, os estudantes denunciaram infraestrutura
precária de escolas, falta de livros e apostilas, de climatização das salas e
de passe livre nos meios de transporte. As
ocupações acabaram sufocadas pelo governo do Estado, mas a situação não
melhorou.
Corredores da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) sujos por falta de coleta do lixo; empresas terceirizadas não receberam do Estado e deixaram de realizar o serviço |
Com
serviços de limpeza e segurança sendo pagos com atraso, a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) também é cenário da
crise, e chegou a adiar provas de seu vestibular 2017. Os banheiros são
insalubres, laboratórios da área biomédica carecem de insumos. Bolsas
destinadas ao custeio de estudantes cotistas, usados para transporte,
alimentação e xerox de material de estudo sofreram atrasos.
No
setor da saúde, o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) decretou estado de
emergência há onze meses, como forma de acelerar repasses do governo federal. Hospitais de urgência e emergência convivem
desde então com a falta de itens como gaze, prótese e esparadrapo. O atraso
nos repasses para fornecedores levou à redução no efetivo de profissionais de
limpeza e na alimentação destinada a pacientes internados.
Os casos mais graves foram verificados no Albert Schweitzer, em Realengo, na zona
oeste no Rio, o Getúlio Vargas, na
Penha, na zona norte, e no Hospital Adão
Pereira Nunes, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, justamente as unidades de referência em
suas regiões. No Rocha Faria, em
Campo Grande, na zona oeste, até acúmulo de sacos de lixo nos corredores se
viu. Familiares de pacientes se
mobilizaram para fazer faxina.
Geridas
por organizações sociais (privadas, que recebem dinheiro público), as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs)
também foram sacrificadas, e chegaram a recusar pacientes. Com salários
atrasados, parte dos funcionários vem
limitando o horário de trabalho. Nesta terça-feira, a cuidadora de idosos Maria do Socorro Araújo, de 43 anos,
reclamava de dor em frente à UPA de Botafogo, na zona sul.
“Cheguei
com muita dor pélvica, a médica me olhou e me deu uma receita para comprar
remédio na farmácia. A UPA tinha de fornecer. Não tenho plano de saúde nem
dinheiro sobrando. Moro na Baixada Fluminense e lá ainda está muito pior”,
afirmou.
Sua
prima, a diarista Ineide Araújo, de
42 anos, chamou a situação de “filme de terror”. “Vimos uma moça com hemorragia saindo daqui aos prantos, se esvaindo em
sangue. É uma situação revoltante, e o pior é que eu acho que é só o começo”,
disse.
A
penúria nas polícias Militar e Civil se traduz no racionamento de combustíveis das patrulhas, que resulta na
diminuição do patrulhamento, e na falta
de insumos básicos para registro de ocorrências.
Na
delegacia do Catete, na zona sul, a solução veio de moradores. A professora
aposentada Maria Thereza Sombra, de 72 anos, presidente de uma associação que
abrange 6 mil moradores, mobilizou os vizinhos para conseguir material para a
unidade: compraram papel A4, toner para
impressora, grampeador, papel higiênico, e os policiais foram buscar. “Eu
me sinto na obrigação de ajudar”, contou. Um
outro morador, que tem uma empresa de segurança, mandou instalar câmeras na
delegacia, que já foi assaltada uma vez.
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