ENTENDA COMO OS POLÍTICOS QUEREM SEPULTAR A LAVA JATO!
O Berlusconi aterrissou em Brasília
Modesto
Carvalhosa*
Nada melhor do que aprender com ele os métodos e os
meios
de destruir a Lava Jato
de destruir a Lava Jato
A
recente tradução para o português do célebre livro de Gianni Barbacetto, Peter Gomez e
Marco Travaglio intitulado Mani
Pulite – La Vera Storia, 2012 – tradução essa editada pela CDG Edições e
Publicações, 887 páginas, sob o título Operação
Mãos Limpas – suscitou uma grande excitação em Brasília, na aguerrida bancada Pro Corrupcione [pró
corrução, a favor da corrupção], que atua hegemonicamente no Congresso
Nacional.
Aqueles
autores italianos dedicam nada menos que 330 páginas a demonstrar,
cronologicamente e em detalhes, as despudoradas
manobras de toda espécie – incluindo mídia, leis, chantagens, desmoralização
das instituições – empreendidas por Silvio Berlusconi,
o vergonhoso primeiro-ministro da Itália em dois períodos entre 1997 e 2011,
que levaram à total destruição dos benefícios da Operação Mãos Limpas, do
início dos anos 2000. A Itália em 2012 ocupava a 69.ª posição entre os países
mais corruptos do mundo, atrás de Gana.
Nada
melhor, portanto, do que aprender com o execrável Berlusconi os métodos e os
meios de destruir a Lava Jato.
Como
toda a população brasileira sabe, o
Congresso Nacional está dividido em dois blocos:
a) O primeiro, o grupo dos
deputados que formam a combativa Frente
Parlamentar Anticorrupção, presidida pelo deputado Antonio Carlos Mendes Thame e da qual participam os deputados Onyx Lorenzoni, Joaquim Passarinho e dezenas de outros abnegados.
b) No lado oposto, o sinistro bloco Pro Corrupcione [a
favor da corrupção], liderado pelo presidente do Senado [Renan Calheiros], pelo líder do governo no Congresso (“é preciso
estancar a sangria” – Romero Jucá) e
pelo líder do governo na Câmara dos Deputados [André Moura], tendo como braço seguro, no Poder Executivo, o
ministro da Transparência [Torquato
Jardim].
A primeira lição haurida do arquicorrupto
Berlusconi é a da necessidade de
desmoralização do Poder Judiciário.
Livro publicado neste ano no Brasil pela Citadel Editora |
Entre
nós, tomou essa empreitada o condestável da República, Renan Calheiros. Reuniu ele, para anunciar a missão destruidora da reputação institucional do Judiciário, nada
menos que o presidente da República, o presidente do Tribunal de Contas da
União (TCU), o futuro presidente do Congresso Nacional, etc. E ali anunciou que vai revelar, para toda a
população brasileira, os supersalários dos juízes, promotores públicos,
desembargadores e ministros dos tribunais superiores.
Essa medida berlusconiana,
segundo ele, desmobilizará o povo, que ficará desiludido com a Lava Jato. Estará, em consequência,
aberta a porta para a pôr em pauta, em regime de urgência, o famigerado Projeto 360, de Abuso de Poder, que responsabiliza pessoalmente os juízes por
suas sentenças, se nelas ousarem condenar os corruptos, ou então
prendê-los, ou deles homologar qualquer delação. Nessa intimidação legalizada estará incluída também a Polícia Federal,
que fica de mãos atadas na sua atividade investigatória, interrogatória, de
condução e de custódia.
Ademais,
o grupo de trabalho Pro Corrupcione
atribuiu ao lídimo líder do governo na Câmara, o deputado André Moura, mais conhecido como André Cunha Moura, por
ser o principal esteio do antigo presidente daquela Casa, a missão de pôr em regime de urgência um
substitutivo ao Projeto n.º 3.636, de 2015, que altera a Lei Anticorrupção. Esse sórdido substitutivo institui, a favor das empreiteiras
corruptas, acordos de leniência de fachada – os famosos sham programs [programas simulados] –,
conhecidos da literatura criminal e antitruste no mundo todo. Esse sham compliance [submissão /
complacência simulada] é descrito em minúcias no Guia de Programas de Compliance do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), item 3.1.2.
E
mais. Por meio dessa encenação de compliance de fachada, não apenas as
empreiteiras corruptas poderão voltar a contratar com o poder público federal,
estadual e municipal como também os seus controladores, diretores e
funcionários terão seus processos e condenações promovidos pela Lava Jato
automaticamente extintos. [É muito sério e grave
essa lei e outras que estão tramitando no Congresso Nacional por iniciativa de
políticos corruptos!]
Para
que se “aperfeiçoe” melhor esse simulacro de acordo com as empreiteiras
corruptas estarão afastados da sua
celebração o Ministério Público e o Tribunal de Contas, a quem cabe
declarar a inidoneidade dessas empresas por irregularidade nos contratos de
obras.
Essa
missão do grupo Pro Corrupcione,
visando a extinguir todos os efeitos dos processos levados avante pela Lava
Jato, conta com a decidida contribuição
do Ministério da Transparência, onde serão “celebrados” os acordos de compliance de fachada. O líder do
governo André Moura declarou que tem o apoio do titular daquele ministério.
Questionado pela imprensa, o ministro
Torquato Jardim respondeu que a única providência que deve ser tomada é –
pasmem – mudar a denominação “acordo de
leniência” por um nome mais elegante, mais fino, menos chocante para as
empreiteiras hipocritamente arrependidas e que agora voltam ao convívio do
governo, com leis que garantem, para sempre, a corrupção.
Tudo isso em nome da
moralidade pública. Um verdadeiro massacre, tal e qual ocorreu na Itália do
nefasto Berlusconi. Ali o Judiciário foi humilhado, com todo o tipo de manobra, inclusive
o desaforamento dos processos que corriam em Milão, para outras comarcas mais
complacentes com os negócios de Berlusconi et
caterva [e comparsas]. A prescrição dos crimes de corrupção foi diminuída
pela metade, as empresas corruptas puderam “regularizar” os seus balanços, sem
revelar o montante de propinas que, durante décadas, pagaram aos políticos e
partidos, e assim por diante.
Na
Itália, legalizaram a corrupção por obra e graça do senhor Berlusconi e seus
asseclas na Câmara e no Senado. No
Brasil, inspirados no exemplo edificante daquele país, desejam os nossos
políticos corruptos não só se eximir de sua responsabilidade criminal, mas
também “reerguer” as empreiteiras corruptas, sob o pretexto de manutenção de
empregos – tal como proclamava a ex-presidente Dilma – para, assim, dar
continuidade ao festival eterno de corrupção nas obras públicas, sem cujo
oxigênio não podem os políticos viver e muito menos sobreviver.
Modesto Carvalhosa |
* MODESTO CARVALHOSA é um jurista e advogado brasileiro. Iniciou
seu bacharelado na Faculdade de Direito
da Universidade de São Paulo em 1953 e ali se graduou em 1957. No ano de
1966, obteve o título de doutor em Direito pela Universidade de São Paulo. Realizou estágio pós-doutoral, como
bolsista do Governo da República Italiana em 1967. De 1971 a 1985 foi professor
da Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo, vinculado ao Departamento de Direito Comercial. No ano de
1972, obteve a livre-docência em Direito Comercial. Foi presidente da Associação dos Docentes da Universidade de
São Paulo e liderou movimentos de oposição ao regime militar. Autor do
livro "Considerações sobre a Lei
Anticorrupção das Pessoas Jurídicas" (editora Thomson Reuters-Revista
dos Tribunais, 432 páginas), lançado em março de 2015, e coordenador da obra
"O Livro Negro da Corrupção"
(editora Paz e Terra, 1995) [Fonte: Wikipédia]
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