Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo

Evangelho: Lucas 23,35-43

Naquele tempo:
35 Os chefes zombavam de Jesus dizendo: «A outros ele salvou. Salve-se a si mesmo, se, de fato, é o Cristo de Deus, o Escolhido!»
36 Os soldados também caçoavam dele; aproximavam-se, ofereciam-lhe vinagre,
37 e diziam: «Se és o rei dos judeus, salva-te a ti mesmo!»
38 Acima dele havia um letreiro: «Este é o Rei dos Judeus.»
39 Um dos malfeitores crucificados o insultava, dizendo: «Tu não és o Cristo? Salva-te a ti mesmo e a nós!»
40 Mas o outro o repreendeu, dizendo: «Nem sequer temes a Deus, tu que sofres a mesma condenação?
41 Para nós, é justo, porque estamos recebendo o que merecemos; mas ele não fez nada de mal.»
42 E acrescentou: «Jesus, lembra-te de mim, quando entrares no teu reinado.»
43 Jesus lhe respondeu: «Em verdade eu te digo: ainda hoje estarás comigo no Paraíso.»

JOSÉ ANTONIO PAGOLA

CARREGAR A CRUZ

O relato da crucifixão, proclamado na festa de Cristo Rei, recorda aos seguidores de Jesus que seu Reino não é um reino de glória e de poder, mas de serviço, amor e entrega total para resgatar o ser humano do mal, do pecado e da morte.

Habituados a proclamar a «vitória da Cruz», corremos o risco de esquecer que o Crucificado nada tem a ver com um falso triunfalismo que esvazia de conteúdo o gesto mais sublime de serviço humilde de Deus a suas criaturas. A Cruz não é uma espécie de troféu que mostramos aos outros com orgulho, mas o símbolo do Amor crucificado de Deus que nos convida a seguir seu exemplo.

Cantamos, adoramos e beijamos a Cruz de Cristo porque, no mais profundo de nosso ser, sentimos a necessidade de dar graças a Deus por seu amor insondável, porém sem esquecer que a primeira coisa que nos pede Jesus de maneira insistente não é beijar a Cruz, mas carregá-la. E isto consiste, simplesmente, em seguir seus passos de modo responsável e comprometido, sabendo que esse caminho nos levará mais cedo ou mais tarde a compartilhar de seu destino doloroso.

Não nos é permitido aproximar-nos do mistério da Cruz de maneira passiva, sem intenção alguma de carregá-la. Por isso, temos de ter cuidado com certas celebrações que podem criar em torno da Cruz uma atmosfera atraente, porém perigosa, se nos distrai do seguimento fiel do Crucificado fazendo-nos viver a ilusão de um cristianismo sem Cruz. É justamente quando beijamos a Cruz que devemos escutar o apelo de Jesus: «Se alguém vem atrás de mim... que carregue sua cruz e me siga».

Para os seguidores de Jesus, reivindicar a Cruz é aproximar-se servilmente dos crucificados; introduzir justiça onde se abusa dos indefesos; reclamar compaixão onde somente há indiferença diante dos que sofrem. Isto nos trará conflitos, rejeição e sofrimento. Será nossa maneira humilde de carregar a Cruz de Cristo.

O teólogo católico alemão Johann Baptist Metz vem insistindo no perigo de que a imagem do Crucificado esteja nos ocultando o rosto daqueles que vivem crucificados hoje. No cristianismo dos países do bem-estar está ocorrendo, segundo esse teólogo, um fenômeno muito grave: «A Cruz não mais intranquiliza ninguém, não tem aguilhão; perdeu a tensão do seguimento de Jesus, não chama a nenhuma responsabilidade, mas abandona-a».

Não devemos, todos nós, revisar qual é a nossa verdadeira atitude diante do Crucificado? Não devemos nos aproximar dele de maneira mais responsável e comprometida?

ZOMBAR OU INVOCAR?

Lucas descreve com acentos trágicos a agonia de Jesus em meio das provocações e piadas daqueles que o rodeiam. Ninguém parece valorizar o seu gesto. Ninguém compreendeu seu amor aos últimos. Ninguém viu em seu rosto o olhar compassivo de Deus para com o ser humano.

Desde uma certa distância, as autoridades religiosas e o povo zombam de Jesus fazendo caretas: «A outros salvou; que se salve a si mesmo se é o Messias». Os soldados de Pilatos, ao vê-lo com sede, lhe oferecem um vinho avinagrado muito popular entre eles, enquanto riem dele: «Se tu és o rei dos judeus, salva-te a ti mesmo». O mesmo lhe diz um dos delinquentes crucificado perto dele: «Não és o Messias? Então, salva-te a ti mesmo».

Até três vezes repete Lucas a zombaria: Salva-te a ti mesmo. Que Messias pode ser este se não tem poder para salvar-se a si mesmo? Que classe de Rei pode ser? Como salvará ao seu povo da opressão de Roma se não pode escapar dos quatro soldados que vigiam sua agonia? Como Deus estará de seu lado se não intervém para libertá-lo?

De repente, em meio a tanta zombaria, uma invocação: «Jesus, recorda-te de mim quando chegares em teu reino». É o outro delinquente que reconhece a inocência de Jesus, confessa sua culpa e repleto de confiança no perdão de Deus, somente pede a Jesus que se recorde dele. Jesus, imediatamente, lhe responde: «Hoje estarás comigo no paraíso». Agora, estão os dois agonizando, unidos no desamparo e na impotência. Porém, hoje mesmo estarão desfrutando da vida do Pai.

O que seria de nós se o Enviado de Deus tivesse buscado sua própria salvação escapando dessa cruz que o une para sempre a todos os crucificados da história? Como poderíamos crer em um Deus que nos deixasse mergulhados em nosso pecado e em nossa impotência diante da morte?

Há quem, também hoje, zomba do Crucificado. Não sabem o que fazem. Não o fariam com Che Guevara nem com Martin Luther King. Estão se lixando do homem mais humano que a história dá. Qual é a postura mais digna diante desse Crucificado, revelação suprema da proximidade de Deus ao sofrimento do mundo, zombar dele ou invocá-lo?

Traduzido do espanhol por Telmo José Amaral de Figueiredo.

Fonte:  Sopelako San Pedro Apostol Parrokia – Sopelana (Bizkaia – Espanha) – J. A. Pagola – Ciclo C – Internet: clique aqui.

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