O ovo da serpente
Luiz Alberto
Gómez de Souza*
Os setores mais conservadores e fundamentalistas da
Igreja Católica acabarão percebendo, talvez tarde
demais,
o mal de aliar-se a neopentecostais como Crivella DOM ORANI JOÃO TEMPESTA Cardeal-Arcebispo do Rio de Janeiro recebe Marcelo Crivella e sua esposa quando o mesmo foi apresentar o seu "Plano de Governo" ao líder da Igreja Católica |
Lemos
em O Globo de hoje, 1º de novembro:
«Crivella também revelou uma curiosidade da
campanha: disse que em momentos difíceis do 2º turno, recebeu, muitas vezes de
madrugada, mensagens de apoio do arcebispo do Rio, Dom Orani Tempesta. “Dom
Orani, puxa vida... De madrugada... Nos momentos mais impactantes... Quando
havia aqueles abalos sísmicos, quem mandava mensagem? Dom Orani, os padres...”».
Com
um pouco de ironia poderia eu insinuar:
Solidariedade corporativa entre dois bispos? Alguém, em troca, ingenuamente
declararia: “Prova de ecumenismo”. Ora,
nós sabemos que a Igreja Universal, com
um plano de poder, não tem nada de ecumênica. Leiam o livro do bispo
Macedo, tio do bispo Crivella, “Plano de
poder” (2008). Ali ele fala da ascensão dos evangélicos como determinada
pela Bíblia: «grande projeto de nação
pretendida por Deus... Bíblia é um livro que sugere resistência, tomada e estabelecimento
do poder político ou de governo». Na véspera, na coluna de Ancelmo Gois, do mesmo O Globo, podemos ler: «Marcelo Crivella... não esconde que sua
meta é chegar à Presidência da República».
Ecumenismo é a ida de
Francisco a Lund [Suécia], ontem e hoje, para os
500 anos da Reforma de Lutero, o que deixa certos membros da instituição
católica carioca pouco à vontade. Os mesmos que não difundem a Nota da Comissão Episcopal Pastoral para o
serviço da Caridade, da Justiça e da Paz e palavras da Comissão Permanente da CNBB sobre a atual política econômica do
governo Temer, com o apoio, feliz surpresa, do arcebispo primaz de Salvador.
Mas
logo descobrimos que, na verdade, há um
encontro real de Crivella com posições ideológicas político-morais tradicionais
no mundo católico (atenção, não Éticas, valha a distinção) ambos de uma direita envergonhada, temerosa
de posições progressistas na Igreja Católica e na sociedade.
Luiz Alberto Goméz de Souza Autor deste artigo |
Talvez um dia muitos
católicos integristas, unidos ao fundamentalismo de certos neopentecostais,
poderiam descobrir um pouco tarde, que pavimentaram o caminho para um plano de
poder:
* antidemocrata,
* antilaico e
* antiplural, que se voltaria
contra eles, sacrilegamente Bíblia em mão.
É isso que estariam
preparando com uma terrível irresponsabilidade.
[É incrível como certos setores extremamente conservadores e
intransigentes da Igreja Católica não percebem que os tempos são outros e se
negam a aprender as lições do passado não muito distante no qual a Igreja
andava de braços dados com o poder]
Poderão as práticas
libertadoras de Francisco abrir corações e mentes?
Há
momentos em que não poderemos ceder à tentação do desânimo, mas acreditar na
força do Espírito transformador.
* LUIZ ALBERTO GOMÉZ DE SOUZA é conhecido como
cientista político e pensador do mundo atual. Doutor em Sociologia pela
Universidade de Paris, Sorbonne Nouvelle.
Graduação em Direito pela PUC de Porto Alegre. Pós-graduado em Ciência Política
(Santiago do Chile). Atualmente é diretor do Programa de Estudos Avançados em
Ciência e Religião da Universidade Cândido Mendes, Rio de Janeiro.
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