Sabem tudo de você!
Seu número de celular é a chave da sua
vida privada
Steve Lohr
The New
York Times
Combinação de algarismos já é usada para monitorar
atividades
e compras dos usuários
TAYLOR GALLANTER Cabeleireira de 23 anos de São Francisco, nos Estados Unidos, é cuidadosa ao fornecer o seu número de celular |
Da próxima vez que alguém
pedir o número de seu celular, talvez seja bom pensar duas vezes antes de
revelá-lo.
Ele é mais que uma combinação de dígitos. Cada vez mais ele pode ser usado para
a obtenção de informações pessoais mantidas por todo tipo de empresa, incluindo
financeiras e redes sociais.
Um número simples, de nove
dígitos, pode ser usado para monitorar e prever o que você compra, pesquisa e
até o que vê na TV. “Ele se transformou na chave
para o quarto da sua vida, das informações a seu respeito”, diz Edward M. Stroz, ex-agente de crimes de
alta tecnologia do FBI.
Apesar
disso, o número do seu celular não é uma informação regulamentada oficialmente
como o número da Seguridade Social nos Estados Unidos, um dado que as empresas
têm que manter em sigilo. Nós também
somos aconselhados a escondê-lo e protegê-lo; no entanto, não pensamos duas
vezes quando nos pedem para dar o número do celular a quem mal conhecemos.
Quase metade dos lares nos
Estados Unidos da América (EUA) desistiu das linhas fixas
e tem apenas serviço móvel, número esse que cresceu mais de 10% em apenas
três anos. Entre as pessoas de 25 e 29 anos, essa proporção sobe para 73%,
segundo as estatísticas oficiais.
Taylor Gallanter, cabeleireira de 23 anos de
São Francisco, nos EUA, tem celular próprio desde os 15. Nunca teve telefone
fixo e duvida que um dia venha a ter. Ela
sabe o valor que seu número tem, pois não o fornece em formulários digitais a
menos que seja obrigatório. Usar o endereço de e-mail como contato, segundo
ela, é menos arriscado. “Só com o nome e
o número dá para descobrir um monte de coisa.”
Para
investigadores, o número do celular é
ainda mais útil que o da Seguridade Social [nos EUA esse número é como
nosso RG aqui do Brasil] porque está
ligado a inúmeras bases de dados e conectado a um aparelho que quase sempre
está com a pessoa. “Ele pode ser um
portal a todo tipo de informação”, alerta Robert Schoshinski, diretor assistente para privacidade e proteção
de identidade da Comissão Federal de Comércio.
História
O
uso dessa sequência numérica repete a história do número da Seguridade Social, criado em 1936. Seu objetivo era permitir
que o sistema de seguro nacional mantivesse registros dos trabalhadores. Nunca foi pensado como um número geral de
identificação. Aos poucos, porém, a simplicidade de um número único de
identificação estimulou o uso mais amplo por outras agências do governo e
corporações. Isso ocorreu nos anos 1960, quando os computadores tornaram
possível a criação de arquivos digitais imensos sobre cidadãos e clientes.
Sua
disseminação como identificador rápido e fácil, encontrado em todos os tipos de
bases de dados corporativas e governamentais, facilitou as operações comerciais
– mas houve consequências involuntárias.
“O número da Seguridade
Social é tão difundido e tão pouco protegido que se tornou o maior veículo para
a epidemia atual de roubo de identidade”, revela Alessandro Acquisti, cientista da
computação e especialista em privacidade da Universidade
Carnegie Mellon.
Segundo
a consultoria Javelin, os prejuízos de
roubo de identidade para fraudes chegaram a US$ 15 bilhões em 2015 nos EUA,
com 11% dos americanos tendo sido afetados por um golpe do gênero.
Defesa
Da
mesma forma que o número de celular e o computador por trás dele abrem as
portas a novos riscos, a tecnologia, como quase sempre é o caso, também pode
ser empregada para combatê-los. É o caso da prevenção de fraudes. Quando o
consumidor utiliza o Affirm,
aplicativo da startup homônima que oferece alternativa ao cartão de crédito em
compras online, seu software averigua
diversas fontes de dados e aprova ou rejeita financiamentos em segundos.
Quando
um consumidor registrado na Affirm
quer um empréstimo escalonado para comprar, digamos, um colchão de US$ 850 ou
uma mountain bike de US$ 3 mil, a
empresa lhe envia um número identificador pessoal temporário por torpedo.
O
mesmo método de autenticação é usado pelos bancos, sistemas de pagamento e
outras companhias antes que certas transações sejam aprovadas. O número temporário é válido por um período
de apenas 30-180 segundos, aumentando bastante as chances de a pessoa que está
tentando emprestar ou comprar ser a mesma que possui o celular com aquele
número.
Não
é infalível, mas se o celular for roubado, geralmente trava. Pode até ser
“hackeado”, mas para isso é necessário outro tipo de habilidade. Só para
comparar, o número roubado da Seguridade Social é uma fonte permanente de roubo
de identidade. Para Rajeev Date,
ex-vice-diretor da Agência de Proteção Financeira do Consumidor, existem pontos
positivos no uso do número do celular em casos assim: “O que se pode fazer com o número do celular representa uma grande
vantagem na guerra atual contra a fraude e o roubo de identidade.”
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