Como a vitória de Trump pode afetar o Brasil?
BBC Brasil
A América Latina não apareceu muito nesta campanha presidencial
norte-americana, mas pode vir mudanças por aí uma vez
que Donald Trump é imprevisível
Em
um triunfo inesperado, o republicano Donald Trump foi eleito o novo presidente
dos Estados Unidos. Trump conquistou
vários Estados-pêndulo, onde os resultados eram imprevisíveis – podiam
favorecer tanto um quanto o outro partido –, como Flórida, Ohio e Carolina do
Norte, garantindo vantagem sobre Hillary Clinton.
[Não
é verdade que a vitória de Trump para a presidência dos Estados Unidos foi
inesperada!!! Quem duvida, basta ler o excelente artigo de Michael Moore, diretor
de cinema, no The Huffington Post, dia 23 de julho deste ano! Sim, em julho,
ainda!!! Clique aqui para ler a tradução do artigo em português, e aqui para ler no original inglês]
Sua
vitória não era indicada pelas pesquisas de opinião, que apontavam Clinton como
novo presidente. [Já está virando rotina no mundo as
“furadas” das pesquisas eleitorais!]
Mas como o êxito do
republicano impacta no Brasil?
Leia
a seguir os principais pontos de contato entre os dois países.
ECONOMIA
E COMÉRCIO
Vários
aspectos devem ser levados em conta para responder a questão.
Um
deles é a maneira como os dois candidatos e seus partidos encararam a economia
e as relações comerciais entre os Estados Unidos e o resto do mundo.
O Brasil se beneficiaria de
uma maior abertura dos Estados Unidos da América (EUA) a produtos brasileiros. Hoje os EUA são o segundo
maior parceiro comercial do Brasil, atrás da China.
Historicamente,
o Partido Republicano, de Trump, defende o livre comércio e se opõe a
medidas protecionistas que ajudassem empresas americanas a competir com
estrangeiras.
Assim,
um candidato republicano tenderia a ser melhor para os interesses econômicos do
Brasil do que um candidato democrata.
Mas
Trump inverteu essa lógica ao propor
renegociar os acordos comerciais firmados pelos EUA para preservar empregos no
país e reduzir o déficit americano nas transações com o resto do mundo.
Se o empresário colocar
essas ações em prática, o Brasil poderia ser prejudicado.
A
professora de Relações Internacionais da ESPM Denilde Holzhacker afirma que as
consequências seriam imediatas e negativas, e causariam o que muitos
economistas estão chamado de "efeito Trump".
"Como
ele fez propostas muito amplas e populistas, o efeito econômico dessas medidas
podem ter impacto grande e gerar um caos na economia – principalmente porque
ele é contrário ao livre comércio, se mostrou protecionista."
Mas
Holzhacker faz uma ressalva sobre a
aplicação dessas medidas.
"Agora,
para saber o quanto ele vai conseguir implementar disso, vamos ter que esperar.
Ele é tão imprevisível e tudo fica tão indefinido que prejudica muito o cenário
econômico."
BILL CLINTON & FERNANDO HENRIQUE CARDOSO Tiveram um ótimo relacionamento e isso favoreceu a cooperação entre os Estados Unidos e o Brasil |
IMIGRAÇÃO
E VISTOS
Estima-se
que um milhão de brasileiros vivam nos
EUA, boa parte em situação migratória irregular.
Trump
propôs construir um muro na fronteira do país com o México e prometeu deportar todos os imigrantes sem
documentos.
Ele diz que protegerá o
"bem-estar econômico de imigrantes legais" e que a admissão de novos imigrantes levará em
conta suas chances de obter sucesso nos EUA, o que em tese favoreceria
brasileiros com alta escolaridade e habilidades específicas que queiram migrar
para o país.
Outro
tema de interesse dos brasileiros é a facilidade para obter vistos americanos.
Trump fez poucas menções ao sistema de concessão de vistos do país.
Hoje,
Brasil e EUA negociam a adesão
brasileira a um programa que reduziria a burocracia para viajantes frequentes
brasileiros, como executivos. A eliminação dos vistos, porém, ainda parece
distante.
Para
que a isenção possa ser negociada, precisaria
haver uma redução no índice de vistos rejeitados em consulados americanos no
Brasil, uma exigência da legislação dos EUA.
RELAÇÃO
COM O BRASIL
O
Brasil e a América Latina não foram tratados como temas prioritários nas
campanhas dos dois candidatos.
Em
2015, Trump citou o Brasil ao listar
países que, segundo ele, tiram vantagem dos Estados Unidos através de práticas
comerciais que ele considera injustas. A balança comercial entre os dois
países, porém, é favorável aos EUA. [De onde ele
retirou essa conclusão, ninguém sabe!]
Como empresário, Trump é
sócio de um hotel no Rio de Janeiro e licenciou sua marca para ser usada por um
complexo de edifícios na zona portuária da cidade. Anunciada em 2012, a obra
ainda nem começou.
Para
a professora de Relações Internacionais da Unifesp Cristina Pecequilo, como Trump não falou nada sobre o país e se
distanciou de temas ligados à América Latina, não deve haver muitas mudanças para os brasileiros. No entanto,
diferentemente de Hillary, o republicano tem o elemento de imprevisibilidade.
"A
situação do governo Hillary para o Brasil teria sido mais tranquila porque era
mais previsível por qual caminho ela iria. Seria a continuidade do governo
Obama, de uma dimensão política que tem o reconhecimento do Brasil como
relevante, sem muitas mudanças."
Pecequilo afirma que o nosso
país deve perder relevância na visão dos Estados Unidos dado o conturbado cenário
interno.
"Eles estão com tanto problema dentro de
casa, que o Brasil não é uma preocupação."
GEORGE W. BUSH & LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA Tiveram uma ótima relação, apesar das diferenças ideológicas |
QUESTÃO
DE QUÍMICA
Especialistas
nas relações Brasil-EUA costumam dizer que os laços entre os dois países
dependem em grande medida da química
entre seus líderes, independentemente de seus partidos ou ideologias.
Eles
afirmam que, embora seguissem tradições políticas bastante distintas, os
presidentes Luiz Inácio Lula da Silva
(2003-2011) e George W. Bush
(2001-2009) tinham uma relação tão boa quanto a mantida entre Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e
Bill Clinton (1993-2001), que tinham
maior afinidade ideológica.
Já a relação entre Barack
Obama e Dilma Rousseff nunca foi tão próxima e sofreu com a revelação de que o
governo americano havia espionado a presidente brasileira.
Analistas
afirmam ainda que Brasil e EUA têm relações bastante diversificadas e que os laços devem ser mantidos qualquer que
seja o resultado da eleição em novembro, já que os dois governos dialogam
dentro de estruturas burocráticas.
Do lado brasileiro, há
interesse em se aproximar mais dos EUA, vença quem vencer. Em entrevista à BBC Brasil em julho, o embaixador
brasileiro em Washington, Sérgio Amaral, disse que o governo Temer investiria nas relações com as cinco principais
potências globais (EUA, China, Rússia, França e Reino Unido).
Amaral
afirmou ainda que, na Embaixada, priorizaria áreas em que Brasil e EUA têm
maior convergência, como direitos humanos e meio ambiente.
Fonte: BBC Brasil – Notícias
– Quarta-feira,
9 de novembro de 2016 – Internet: clique aqui.
Os eleitores de Trump não são estúpidos,
nós é que somos surdos
Patrícia
Campos Mello
No cartaz segurado por esta apoiadora de Donald John Trump se lê: "A maioria silenciosa está com Trump" |
No
dia seguinte à reeleição de George W.
Bush em 2004, o tabloide britânico "Daily Mirror" saiu com a seguinte manchete: "Como podem 59.017.382 americanos ser
tão idiotas?"
Hoje,
na ressaca da eleição do republicano Donald Trump, a pergunta é: "Como podem milhões de institutos de
pesquisa, jornalistas, analistas, políticos, acadêmicos, ser tão
estúpidos?"
Todo mundo subestimou a
força do "angry white man" [trad.: o
homem branco irritado]. Sim, existe uma mudança demográfica inexorável e, em 2065, os brancos serão uma minoria nos
Estados Unidos, 46% da população, diante de 24% de hispânicos, 14% de
asiáticos e 13% de negros.
Mas, por enquanto, os
brancos ainda são uma maioria (62%) — que era silenciosa, mas se tornou estridente,
aqui nos EUA e do outro lado do Atlântico, na Europa.
Esse
brancos votaram em Donald Trump — para eles,
o único "não político", aquele
que consegue "sentir a dor" desses órfãos da globalização.
Nem
o tão propalado "racha educacional" — de que os eleitores brancos sem
curso superior iriam apoiar Trump em massa, mas aqueles com maior grau de
instrução iriam migrar em grandes números para Hillary — se comprovou. Entre os
brancos sem curso superior, ele teve apoio de 67% (de acordo com pesquisas de
boca de urna). E entre os brancos com
curso superior, ele venceu por quatro pontos porcentuais de vantagem.
A
campanha de Hillary já elegeu seus bodes expiatórios —o diretor do FBI, James
Comey, que anunciou novas investigações sobre servidor privado de e-mails de
Hillary a poucos dias da eleição, e os candidatos de terceiro partido, o
libertário Gary Johnson e a verde Jill Stein, que teriam repetido Ralph Nader,
o estraga prazer na eleição Gore-Bush em 2004.
O fato é que o problema foi
surdez. Surdez generalizada aos recados dos brancos
dos dois lados do Atlântico, que se sentem injustiçados, que veem suas vidas
piorando, sempre culpando o "outro". Seja o muçulmano, o
imigrante, o hispânico ou o negro.
A maioria
silenciosa falou, e o recado foi brutal. Estúpidos somos nós, que
não percebemos o que estava vindo (e eu me incluo nesta mea culpa post mortem). E achamos
que a globalização era boa para a maioria, portanto quem estava descontente
ia se conformar.
Comentários
Postar um comentário