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O golpe que não houve
Giuseppe Cocco*
Dizer que não é um golpe de Estado não significa dizer
que o que ocorre
no Brasil é aceitável ou normal.
Ao contrário, atravessamos uma crise muito grave
Comecemos
pelo fim. Não houve golpe de Estado no
Brasil, mas uma glasnost que conduziu à implosão do consórcio político
que governava e governa o país:
* um cartel mafioso de grandes empresas privadas e estatais,
* compostas por algumas dezenas de patrões públicos e privados.
Evidentemente,
a corrupção sistêmica não é uma novidade e certamente não foi inventada pelo
PT. Lula, o PT e uma série de
intelectuais brasileiros (ou não) utilizam como defesa esse truísmo e se
escondem atrás de duas afirmações:
* o combate à corrupção seria
seletivo e
* o justicialismo não será o
terreno da transformação social.
São duas afirmações falsas. As investigações judiciárias contra a corrupção estão tocando todo o
sistema político e na realidade não
poupam os partidos de direita nem os
grandes aliados do PT nem os grandes partidos de oposição. O peso relativo
do PT, de Lula e Dilma, nos inquéritos, é, no entanto, proporcional a dois
fatos simples: primeiramente, os juízes
não caem no esquema de marketing do PT que se transforma em vítima do sistema
como se não estivesse no poder federal por treze anos seguidos; e, em
seguida, Lula e Dilma desempenharam um
papel fundamental na amplificação e modernização da tradicional corrupção
oligárquica. A corrupção de que se fala não é apenas uma velha venalidade
da política, mas um verdadeiro regime de acumulação e de exploração de novo
tipo, dirigido por um consórcio de interesses onde o PT é o principal organizador.
É este consórcio de
interesses que está hoje em crise e implodindo. Esta implosão tem duas causas:
* o levante constituinte de
2013 [1] e
* a violenta crise econômica.
Assistimos assim à triste
decadência de um dos experimentos reais mais interessantes da esquerda mundial. O Partido dos
Trabalhadores (PT), com seu líder (Lula), nasceu como uma espécie de partido em
rede pós-socialista e paradoxalmente termina seu ciclo na mesma mistura de
corrupção, burocracia e catástrofe econômica e social que o «socialismo real»
nos deu a conhecer. O PT parecia
representar uma saída para o socialismo e terminou como uma versão tropical
da mesma mistura de novas e velhas formas de corrupção visando a continuidade
do mesmo bloco de poder.
Estado
de Calamidade Pública:
de
17 de junho de 2013 a 17 de junho de 2016
Em 17 de junho de 2016, o governo do
Estado do Rio de Janeiro (aliado do PT desde junho de 2006) decretou formalmente «Estado de Calamidade
Pública». O objetivo do decreto era o de viabilizar a utilização dos poucos
recursos financeiros disponíveis (e o dinheiro prometido pelo governo federal)
para assegurar a finalização das obras e a realização das Olimpíadas no Rio de
Janeiro. Os recursos mobilizados foram, sobretudo para pagar os policiais
durante os jogos. De fato, desde o final
de 2015, o Estado do Rio de Janeiro não paga seus fornecedores, paga em atraso
de até um mês seus funcionários, fecha hospitais (inclusive o Instituto
Médico Legal) e não termina obras.
Exatamente
três anos antes, em 17 de junho de 2013,
centenas de milhares de pessoas
manifestavam no Rio de Janeiro não apenas contra o aumento das tarifas de
transporte público, mas também contra mais um aprofundamento do modelo de
cidade desigual, dessa vez por uma representação política onde a
tradicional corrupção aparecia ainda mais insuportável devido ao consenso
autoritário que reunia todas as forças políticas (do PT ao PMDB) e todas as
esferas institucionais (Munícipio, Estado e União federal). Ao final da
manifestação, uns enxames de dezenas de milhares de jovens tomavam de assalto a
Assembleia Legislativa, ou seja, o templo do acoplamento carnal e mafioso entre
os cartéis de empresas de transporte e de obras públicas e os representantes
eleitos do sistema político.
Para compreender o que se
passa no Brasil se deve, portanto, ter muito bem em mente estas duas datas e o que as separa: de uma parte, um movimento destituinte que
acenava para a constituição de uma real democracia, movimento este sem
precedente na história brasileira, e de outra parte, a confirmação de um
sistema institucional que perdeu sua legitimidade e uma boa parte de sua
efetividade (notadamente no plano econômico). Entre estas duas datas, temos o
conflito político de grandes proporções que conduziu ao Impeachment da Presidente da República. Entre estas mesmas datas, fomos brindados com o festival de mentiras e
mistificações lançados e replicados pelo PT e apoiadores durante as eleições de
outubro de 2014.
O PT PARTICIPOU ATIVAMENTE DAS MANIFESTAÇÕES PELO IMPEACHMENT DE FERNANDO COLLOR |
Ceci n’est pas un coup d’État
(Isto
não é um golpe de Estado)
Não houve golpe de Estado no
Brasil, de nenhuma espécie, nem mesmo parlamentar. Por um lado, o Impeachment é não somente previsto pela
Constituição Democrática (de 1988), como já
foi utilizado com o apoio entusiasta do PT [2],
contra Fernando Collor de Mello
(eleito em 1989 e destituído em 1992). Por outro lado, todo o processo se realizou segundo as regras e sob a supervisão dos
juízes do Supremo Tribunal Federal (a Corte Suprema Brasileira) onde oito
dos onze membros foram nomeados por Lula ou Dilma. Dizer que não é um golpe de
Estado não significa dizer que o que ocorre no Brasil é aceitável ou normal. Ao
contrário, atravessamos uma crise muito grave, mas seus determinantes e seus
resultados não são aqueles que o PT, o governo e a esquerda brasileira
apresentaram e que a esquerda internacional quis corroborar.
Nos encontramos no capítulo
seguinte ao processo que se iniciou de maneira autônoma com o grande levante de
2013, e que
ganhou um novo sentido no início de 2014
com a abertura da investigação judicial da Lava Jato, sobre a corrupção na
gigantesca estatal Petrobrás, tornando-se então uma crise profunda – e
irreversível – exatamente no momento da reeleição de Dilma. O processo de
destituição de Dilma não passa de mais um episódio na luta pela sobrevivência
do sistema de representação política em estado terminal, em virtude dos
desdobramentos cruzados do fiasco de
imensas repercussões da política econômica conduzida por Dilma somado aos resultados devastadores das
operações judiciárias contra a corrupção.
Dilma não foi objeto de um processo de Impeachment por ter feito algumas reformas um pouco mais radicais
do ponto de vista social, mas porque ela
já não conseguia governar nem tomar iniciativas diante da catástrofe econômica
e sobretudo, não conseguiu enfrentar a onda crescente de deslegitimização
provocada pela Operação Lava Jato.
Dois pontos de inflexão
explicam a abertura do processo contra Dilma.
1º)
O primeiro foi em novembro de 2015:
a detenção de Delcídio do Amaral, líder do governo no Senado e o segundo foi a detenção de Lula para interrogatório (4
de março de 2016). A prisão do senador significou o desabamento de todas as
tentativas por parte de Dilma e de seu partido, de convencer os dirigentes da
Petrobrás e dos grandes grupos ligados ao setor da construção civil, a não
colaborar com a justiça. Isto teve como consequência imediata a ruptura da
negociação entre o poder executivo e o presidente do Congresso, Eduardo
Cunha. Este último queria se assegurar
de não perder sua posição de deputado (e logo, a imunidade parlamentar) e se
proteger da prisão em troca de não dar continuidade às inúmeras demandas de Impeachment contra Dilma. Uma vez que o governo Dilma não estava mais
podendo assegurar esta proteção, Cunha escolheu o afrontamento para, por um
lado, ganhar tempo (guardar ao máximo a imunidade parlamentar) e de outra parte, apostar na possibilidade
de se tornar uma peça necessária e legítima nas grandes manifestações de massa
para a destituição de Dilma [3] (que se
repetiram desde o dia seguinte de sua eleição, ao longo de um ano e meio).
2º)
A segunda inflexão veio das consequências da condução coercitiva de Lula pela Polícia
Federal para interrogatório. Enquanto
Dilma tentava nomeá-lo ministro da Casa Civil para lhe oferecer imunidade
parlamentar, o ex-presidente – chamando manifestações de massa em sua
defesa – visitava Cunha e o Presidente
do Senado (do mesmo partido de Temer e Cunha, incluídos em oito inquéritos
de corrupção). Após uma longa reunião
onde participaram também o ex-presidente José Sarney e o ex-Ministro das Minas
e Energia (também PMDB), Lula
aparecia com esta pequena trupe na tribuna do Senado Federal, com um exemplar
da Constituição nas mãos para fazer duras declarações contra a ditadura dos
juízes.
É a
partir deste momento que, sob a
liderança do vice-presidente, o movimento institucional pela destituição de
Dilma se amplia e acelera, a partir de dois imperativos:
a) retomar o controle de uma economia em
queda livre e
b) bloquear o processo judicial contra a
corrupção.
O
que dissemos antes em termos políticos foi formalmente confirmado pela glasnost promovida pelos investigadores
da Lava Jato. Em gravações feitas – publicadas pela imprensa no final de maio
2016 – um ex-senador e presidente de uma
grande empresa estatal (Sergio
Machado, que é um colaborador da justiça), os principais patrocinadores do PMDB (o presidente do Senado, Renan
Calheiros), o Ministro do Planejamento
de Temer (Romero Jucá) além do
ex-presidente de tudo (do PMDB, do Senado, da República etc.) José Sarney, explicitaram que o futuro
governo interino de Temer teria dois propósitos: enfrentar a grave crise
econômica e bloquear a operação Lava Jato a fim de proteger eficazmente o
sistema político, inclusive Lula.
É
claro que o chamado “golpe” de Estado é uma operação interna ao “golpe” que foi
dado durante a reeleição (outubro de 2014). Estas escutas telefônicas fazem cair por terra o discurso do PT sobre a
seletividade dos juízes. O PT não é de modo algum o único partido visado,
mas pode ser o alvo principal por ter sido o partido no poder. Os quatro principais líderes do partido
“golpista” (PMDB) figuram no âmbito de um mandado de prisão (suspenso por
um juiz do Supremo Tribunal) e a Lava
Jato também visa o presidente interino [4].
Portanto, temos um “golpe” engraçado: os seus principais atores estão sob a
ameaça do Estado e recebem solidariedade… de quem recebeu o golpe (o PT e seus
senadores que criticaram os mandatos de prisão).
Estamos
novamente na produção sistemática de enganos e ficções por parte da esquerda de
governo e isto merece uma boa reflexão. Por
um lado, este regime discursivo é aceito e amplificado pela esquerda
intelectual global (ao mesmo tempo em
que não se diz nada sobre o que está acontecendo na Venezuela
chavista, que carece de tudo e onde a população passa fome); em segundo lugar, faz-nos pensar sobre a
capacidade e determinação que a “esquerda” (especialmente a esquerda no
poder) tem de manipular os dados
subjetivos da luta objetiva e subjetiva. A “esquerda”, por um lado, perde o
contato com a realidade material do que está acontecendo e, por outro lado, não
só ignora a realidade, mas deturpa dados em função de suas necessidades e
estratégias. [Assim fazendo, a dita “esquerda” acaba
sendo desacreditada da mesma forma que a “direita” autoritária, xenófoba,
insensível aos mais pobres, privatista...]
“Narrativas
Fantasiosas”
Tudo
o que está acontecendo é, de forma piorada, o que já havíamos previsto desde
antes de Outubro e Novembro de 2014 [5]. No
entanto, previsões dissonantes caíam no ostracismo geral da esquerda brasileira
e mundial. Se a esquerda governista
estimulou cinicamente que se mistificasse o debate, se aproveitando disso, a
“esquerda radical” precisa cultivar seus mitos e, para este fim, moldar a
realidade segundo suas fantasias, passou a definir como «delírio» quando
não, estupidez, qualquer coisa que não se dobrasse a esta deriva geral, mesmo
se isso significasse jogar fora multidões nas ruas, e – desnecessário será
dizer – sua própria autonomia. Neste caso, a
doxa**
da esquerda é usada para manter a ilusão de que os “governos progressistas” da
América do Sul não só teriam sido realmente um laboratório e uma maneira de
sair do neoliberalismo, – ou a única – mas
que eles continuam em bom estado de saúde.
Neste quadro, “(…) o triunfo das forças que estão no governo (o PT no
Brasil, o MAS na Bolívia e no Uruguai o FA) permite afirmar a persistência do
ciclo progressista” [6] e novamente: “Esta ratificação prolongada no tempo afirma
a derrota de tentativas neoliberais territoriais-regionais das elites, de
retomar o controle político direto e de alguma forma, ainda mantém abertas as
expectativas de uma dinâmica regional de maturação não diretamente subordinada
à hegemonia ocidental neoliberal”. Esta análise, comprovadamente equivocada
(a vitória eleitoral de Dilma foi uma
grande derrota política e o início de uma reversão eleitoral geral que também
aconteceu na Venezuela, Argentina e na Bolívia), não estava relacionada aos
desafios reais, mas aos requisitos de uma posição de “esquerda”, que é definida
pela primeira vez como luta contra o neoliberalismo (entre mercado e Estado,
melhor optar pelo último, ainda que este tenha estruturas reconhecidamente
mafiosas) e também como antiocidental (entre China e os Estados Unidos, a China
é melhor, mesmo que sufoque as lutas de classes).
O que é ainda mais grave é
que a projeção idealista (uma esquerda que seria estatal e anti-imperialista) é totalmente mistificada: governos
progressistas em geral e em particular o Governo do PT (Dilma), não são de modo
algum antineoliberais e muito menos antiocidentais. O neodesenvolvimentismo
de Dilma é absolutamente interno ao pacto neoliberal e é por isso que Lula
passou tranquilamente de uma política à outra. Os “líderes” do PT estão preocupados com as taxas de crescimento e nada
mais. Se as fortes doses de
neodesenvolvimentismo não funcionam (na verdade, elas foram catastróficas) aumentam-se
as doses de neoliberalismo, como fizeram entre 2003 e 2008 e, em 2014 e 2015.
Não é coincidência que o todo-poderoso Ministro da Fazenda de Temer era o homem
forte da economia de Lula, durante oito anos [Henrique Meirelles]. A política econômica do presidente interino
é exatamente a mesma que Dilma estava tentando fazer e não conseguia, por causa
da paralisia de sua base parlamentar.
A
defesa do PT e de Dilma é mesmo a defesa da “esquerda” como identidade vazia e
abstrata (um caso real dos significantes vazios, à la Laclau***): é
mais importante se sentir bem como “esquerda” do que entender, em primeiro
lugar, as dimensões de sua derrota esmagadora e por outro lado, perceber o
nível de isolamento social da esquerda como um todo. Dilma tinha apenas 8%
de aceitação e milhões vão às ruas pedir seu Impeachment? Este é o resultado da campanha dos meios de
comunicação conservadores e aqueles que manifestam… são a elite branca. Está
tudo explicado! Aqueles que não aceitam essa lógica autoritária são pessoas
isoladas, possivelmente loucas ou irresponsáveis, com alianças estranhas… quando
não estão diretamente ligados ao inimigo. A
corrupção sistêmica da política se mostra como corrupção da subjetividade.
Quem seria o inimigo de um
governo e um partido que governou com e pelo dinheiro dos grandes grupos de
construção saídos da ditadura militar? Na verdade, a esquerda não precisa ser stalinista
para trabalhar como… uma Polícia: a
verdade da repartição pública (de esquerda) se afirma como superior à verdade
da democracia.
LULA COM A CÚPULA DO PMDB O mesmo partido que, agora, é acusado de "golpista" foi o fiel aliado e fiador do projeto de poder de Lula e do PT |
O
dispositivo bipolar do consenso de esquerda
Esta
é uma boa oportunidade para ver como a doxa da esquerda funciona e para pensar
a situação que deviam viver os dissidentes do bloco soviético – antes – e da China maoísta – depois. Eles, os dissidentes, foram perseguidos por criticar um regime que não
só não deixava nenhum espaço para a democracia, mas que se aliava às forças da
direita interna (a burocracia estatal, tecnocratas que controlavam
simultaneamente os aparelhos produtivos e repressivos) e externa (a aliança de Stálin com Hitler, a diplomacia secreta da
China com a administração Nixon), ao
passo em que enquadravam os “dissidentes” como “agentes da direita”. E a
esquerda internacional, de forma mais ou menos entusiasmada, conforme o caso,
participava desse consenso. [A mesma lógica é usada
pelo PT e outras forças ditas de “esquerda” no Brasil atual: você discorda da
narrativa deles, você constata corrupção, incongruência e inverdades na
organização deles, então você é de “direita”, “golpista”, aliado ao governo
atual, do PMDB, por “simples acaso”, o partido com o qual o PT se aliou para
ficar no poder por treze longos anos!]
Leiamos
Simone de Beauvoir e seu “Ensaio sobre a China”, 484 páginas
escritas a partir de uma visita organizada pelo regime em 1955 (e publicado em
1957) [7]. Beauvoir não se deixa enganar, mas ela concorda em jogar o jogo:
“Os anticomunistas sorrirão de seus escrúpulos: o governo se permite dispensar
a verdade quando conveniente. De fato. Mas esquecemos também que até o presente
quase todos os chineses foram completamente afastados da vida política. Sofriam
o seu destino na passividade e na ignorância. Um conhecimento ‘dirigido’ representa um imenso progresso face à essa
escuridão… e até mesmo por si só é capaz de dissipá-la” [8] (grifo
nosso). Assim, vejamos o dispositivo: o anticomunismo explica e,
especialmente, justifica tudo. A
informação dirigida é um avanço e serve a que propósito? “A situação na China é absolutamente
incomparável com a da Hungria ou a da Polônia. Longe de sacrificar a massa
chinesa a um princípio abstrato ou a um futuro mítico, como alegado pelos
anticomunistas, o regime, promovendo a indústria pesada, serve aos interesses
distantes e imediatos de toda a população.” [9]
Esta é certamente uma defesa de boa-fé, com a convicção de que sem
indústria pesada, a China estaria condenada a ser um vassalo da URSS e
“recairia no atraso infernal da superpopulação e da fome.” [10] Mas, a
boa-fé funciona como um mecanismo moral de polarização: não apoiar a
industrialização forçada, se atrever a criticá-la, significaria alinhar-se aos
anticomunistas ou ser um anticomunista. O fato é que o “grande salto” em direção da indústria pesada – apenas dois anos após
o lançamento do livro de Beauvoir, se transforma em pesadelo: “Em 1959, 1960 e 1961 (a China atravessa) a
maior fome não só da história chinesa, mas de toda a história”. [11]
Ao
contrário do que dizia Beauvoir, Jean-François
Billeter recorda que nenhuma fome
havia atingido todo o país como naquele caso. Aqui é importante ressaltar
que o mecanismo do desastre não é apenas
a escolha do tipo de planificação (indústria pesada e a proliferação de
pequenos altos-fornos na casa de todos os camponeses), mas a organização de um consenso forçado, ou seja, a “mentira
generalizada” [12]. É onde reside o
problema: o apoio à industrialização
pesada pode ser um engano, mas justificar a manipulação da informação em nome
da luta contra o anticomunismo, não é. Criticar, exercer o seu direito de
fuga, é ser anticomunista. Mata-se dois coelhos com uma cajadada só: o
princípio da democracia radical vai para o lixo e a mistificação da realidade
torna-se o método de comunicação de massa escolhido. Como morreram dezenas de milhões de pessoas na China maoísta? “Elas não morreram de cansaço ou de doença,
como é geralmente o caso nas épocas de fome, mas apenas de fome e em silêncio,
enquadradas por um regime que permaneceu senhor da situação.” [13] Em 1974, depois de quase vinte anos, Roland Barthes – durante a viagem da
equipe da Revista parisiense Tel Quel
à China – teve que se limitar a confiar suas críticas ao seu diário de viagem,
num estilo blasé entediado: “Discurso mortal, comparação passado /
presente. Eu olho para o meu copo de
chá: as folhas verdes se abriram e formam uma camada no fundo do copo. Mas o
chá é muito leve, insípido, mal chega a um chá de ervas, é água quente “. O que
o regime divulga é água quente, mas a informação é muito mais controlada do que
o preparo do chá: “O fato incontestável,
o bloqueio completo das informações,
todas as informações, do sexo à política. O mais surpreendente é que esse bloqueio seja bem sucedido, isto
é, que ninguém, independentemente da
duração e das condições da sua estada, não tenha conseguido forçar nenhuma brecha
em qualquer ponto que seja” [14].
A esquerda, tanto nas suas
experiências realmente existentes (URSS, China, Cuba, Venezuela e, em termos muito
paradoxais, o PT no Brasil) e nas suas
redes intelectuais, simultaneamente elimina o conflito (toda crítica é “anticomunista”
ou “narrativa fantasiosa” que a polícia do pensamento atribuirá a um “desvio”
qualquer) e, portanto, a verdade.
Encontramo-nos exatamente na mesma situação mencionada por Maurice Merleau-Ponty sobre a URSS e a desestalinização****
e mais amplamente, a política paranoica [15].
Muito antes do Relatório de Khrushchev,
ele escreveu, “ficou estabelecido que os cidadãos soviéticos podem ser
deportados no decurso de um inquérito, sem julgamento e sem limite de tempo (…)
É provável (…) que (…) o número total de detidos remonte à casa dos milhões:
alguns dizem dez milhões, outros quinze“. Merleau-Ponty tirou suas conclusões: “A menos que se seja um louco, admita-se
que esses fatos colocam inteiramente em questão o significado do sistema
russo.” [16] O autor escreveu isto em
1950 e já captava a armadilha que o movimento “comunista” não apenas encontra,
mas construía: “Se os nossos comunistas
aceitam estes campos e a opressão, é que eles esperam a sociedade sem classes
através do milagre da infraestrutura.”
MAURICE MERLEAU-PONTY (1908-1961) - Filósofo francês |
Se
o PT de Dilma e Lula organizou os campos de trabalho das grandes barragens e megaeventos
esportivos, juntando-se carnalmente
em corrupção com oligarquias neoescravagistas (grandes grupos da construção
civil da ditadura e o PMDB de Temer, de
Sarney e Calheiros), é que ele acredita
que o desenvolvimento é algo bom e necessário e… paciência se é muito ruim para
os índios ou ainda melhor, uma vez que estes serão proletarizados e
“nacionalizados” (e tanto melhor em relação aos subornos recebidos). Em
1950, a crítica de Merleau-Ponty à URSS era profunda e não respeitava nenhuma
ortodoxia, mas ele sentia ainda a necessidade de proclamar um certo grau de
fidelidade à “ideia de comunismo”: “É
mais urgente manter algumas ilhas onde se ama e pratica a liberdade do que ir
contra o comunismo” [17]. Mas é
precisamente este mecanismo que o “comunismo realmente existente” (inclusive
sob forma de movimento intelectual) implementa contra a liberdade e, portanto,
contra a verdade. Seis anos mais tarde (em 1956), antes da repressão soviética
dos comunistas húngaros, Merleau-Ponty
propõe uma reflexão “sobre a desestalinização”. Em primeiro lugar, Merleau-Ponty ressalta que mesmo
“comunistas muito disciplinados (…) repudiaram solenemente o princípio de que
nunca se deva apelar ao exterior nas lutas entre comunistas” [18]. Simone
de Beauvoir, no mesmo período, mostra que era suficiente ir da URSS para a
China para dar novamente à “disciplina” perdida toda a sua rigidez.
As inúmeras posições
intelectuais tomadas sobre o “golpe” no Brasil [não o militar de 1964, mas
este de 2016!] mostram que este
mecanismo está ainda ativo, mesmo se a pureza ideológica da década de 1950 já
tenha se perdido. Merleau-Ponty
justamente disse que “a repressão de Budapeste (prova) que nenhum (dos)
princípios (do comunismo) sairá incólume, (e) que a desestalinização nada
representa se não significar uma reforma radical do ‘sistema’ ” [19]. De
fato, não foi Stalin o problema, mas o modo de funcionamento da “esquerda” em
geral. Vejamos como Merleau-Ponty
prossegue, incluindo o uso do Relatório
Khruschev no XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética (PCUS):
“O custo real da produção não está relacionado com o custo previsto e a
produtividade não é dirigida. Tudo isso, no final das contas, deve aparecer em
algum lugar: chega um momento onde os
disparates entre a vontade e os resultados são óbvios. Assim, a pressão dos
fatos é tão forte que o sistema renuncia a fazer contas” [20]. Isto é
exatamente o que aconteceu, em diferentes graus, na Venezuela do “socialismo do século XXI” (onde agora a população
carece de produtos básicos), Argentina
(onde as estatísticas sobre a inflação, a dívida, a pobreza e a desigualdade
eram embelezadas) e Brasil: Dilma
foi reeleita em nome de uma saúde econômica inventada, em um país literalmente
falido: perda de 10% do PIB per capita, menos 20% de produção industrial,
inflação de mais de 10%, a dívida pública duplicou em um ano no Rio, onde
tivemos os Jogos Olímpicos em agosto de 2016, o Estado não paga regularmente os
seus funcionários durante meses (nem mesmo a polícia), as dívidas não são
pagas, a Petrobras está praticamente falida, assim como a Eletrobras, o maior
grupo de telefonia [Oi] entrou com pedido de falência, quatro refinarias em
fase de conclusão nunca serão usadas etc. No
Marketing de esquerda, tudo é explicado pelos
complô do imperialismo, da mídia e da “direita”, como se eles não estivessem
ligados carnalmente: “Um regime que
quer fazer mas que nada quer saber – continua Merleau-Ponty – trata o
fracasso como sabotagem e a discussão como traição” [21]. Referências mudam,
mas o mecanismo é o mesmo. Ironicamente, é precisamente na maquiagem das contas que ocorre o acerto de contas no
Brasil (impeachment), porque o PT
não detém – como o chavismo na Venezuela – o monopólio do poder e seus aliados
“conservadores” tem uma relação diferente com a contabilidade: paradoxalmente,
a competição intercapitalista precisa de uma parte de verdade sobre a verdade
da exploração.
O
que o XX Congresso do PCUS, portanto, tentava fazer era “a denúncia de uma vida fictícia e verbal, a crítica do nominalismo e
fetichismo.”
No
entanto, na sua análise, Merleau-Ponty é lapidar não tanto sobre o stalinismo, mas sobre a tentativa de
salvá-lo que se percebe na desestalinização e é exatamente de lá que se deve
recomeçar: “é pedido à ditadura de se
desafiar sem se deixar eliminar, e ao proletariado de se libertar sem rejeitar
o controle da ditadura. É difícil, quase impossível. O mundo tem a escolha
desse caminho ou o caos. É em formas sociais ainda a criar que uma solução deve
ser procurada” [22]. Mas a esquerda no poder, é, ontem e hoje,
na França de Hollande e no Brasil de Lula e do PT, repressão, desqualificação e
mistificação das lutas que tentam inventar novas formas sociais. É por isso
que o levante de junho de 2013 era
insuportável para o PT e seus intelectuais, porque trazia algo novo. [É por isso, também, que
dificilmente o PT e seus apoiadores nos movimentos sociais e meio intelectual,
conseguirão fazer uma autêntica e profunda autocrítica e mudança de atitude e
organização! Não se vê isso agora e, penso eu, não se verá depois! A tendência
é continuar justificando, desculpando tudo e culpando os “outros”!]
Como
não pensar em Vasily Grossman, o
grande escritor soviético que escreveu as crônicas mais lidas narrando as
batalhas realizadas pelo Exército Vermelho em Stalingrado, que teve toda a sua
família exterminada pelos nazistas e que, uma vez tendo chegado em Berlim junto
ao Exército Vermelho, se maravilhou em seu diário: “o comandante (general
Berzari) teve uma conversa com o Burgermeister (Prefeito), que lhe pergunta o
quanto será pago às pessoas mobilizadas para trabalhar para fins militares” e
destacou: “na verdade, as pessoas aqui
parecem ter uma ideia muito precisa dos seus direitos” [23] (grifo nosso). O cidadão soviético está surpreso que na capital em ruínas da Alemanha
nazista, as pessoas estão preocupadas com os seus direitos e ousam
reivindicá-los face ao ocupante: é que, paradoxalmente, o regime que emergiu da Revolução se transformou em seu
oposto, eliminando o que Marx tinha retomado de Maquiavel, “a ideia de que a história é uma luta e que a
política é uma relação com os homens, em vez de com os princípios.” [24]
A
falta de alternativas
Pode-se replicar que não se
trata disso, que o Brasil de 2016 não é a União Soviética, e menos ainda a
China maoísta de 1950. É verdade, a história se repete, primeiro como tragédia, depois como
farsa. E não estamos apenas na segunda repetição. O que a esquerda é capaz de reproduzir é mesmo este mecanismo, entre um
estado de emergência e a mistificação de um golpe inexistente para impor seu
oportunismo e esmagar toda crítica. Não se deve ver diferença entre a opção
abertamente neoliberal de Hollande e os gritos contra o “golpe” do Brasil de
Lula. Estes são os dois lados de uma
mesma esquerda a que temos realmente que dizer adeus: “O próprio do stalinismo ou oportunismo de esquerda, diz Hervé, é fazer uma política de colaboração e manter
uma ideologia intransigente. O acordo estrondoso, a paz vociferada, a
mistura de concessão política e abuso verbal, são a própria definição do
stalinismo.” [25]
Um dos mecanismos perversos
do consenso de “esquerda” opera na base da afirmação “não há alternativa”. No entanto, a falta de
alternativa não é um dado natural, muito menos o fruto dessa implosão do pacto
mafioso ao qual o PT tenha aderido, mas o produto
de uma estratégia deliberada de destruir qualquer alternativa possível.
Assim, o movimento de junho 2013 foi
destruído. É sempre de acordo com a mesma lógica que a candidatura de Marina foi impedida primeiro e depois esfacelada. Da mesma forma, o falso
discurso sobre “o golpe” inexistente continua a produzir esta “falta” de
alternativas e de falsificar o debate. Não haverá alternativa enquanto
permanecemos no terreno imposto por essa esquerda. O que precisamos é voltar ao homem revoltado, ao meio-dia do
pensamento, onde a revolta nega a divindade para compartilhar as lutas e o
destino comum [26]. É bem isso que Claude Lefort vê em Arquipélago Gulag*****, quando ele aponta como Solzhenitsyn, após as críticas que fez à
revolução, se inflama na “descrição das
grandes revoltas dos condenados” que lhe “inspiram páginas que estão entre
as mais belas da literatura revolucionária” [27]: a revelação da “(…) revolta dos zeks (Zek, diminutivo da palavra
russa zaklioutchennyi, significando preso), e de uma maneira geral, a sua nova
resistência, através do qual eles afirmam-se como políticos, retomam a palavra
e começam a recuperar a sua dignidade de homens.” [28]
O que o condenado do sistema
repressivo infame resultante da revolução acaba pensando como uma alternativa …
é exatamente a revolução ou parafraseando Camus, o homem revoltado. É na exclamação de Solzhenitsyn que as alternativas repousam: “Ó força dos movimentos populares. Como você modifica rapidamente os
dados de política.” [29]
*
GIUSEPPE COCCO, autor deste artigo, é graduado em Ciência
Política pela Université de Paris VIII
(França) e pela Università degli Studi di
Padova (Itália), mestre em Ciência, Tecnologia e Sociedade pelo Conservatoire National des Arts et Métiers
e em História Social pela Université de
Paris I (Panthéon-Sorbonne), doutor em História Social pela Université de Paris I
(Panthéon-Sorbonne). Atualmente é professor titular da Universidade Federal do
Rio de Janeiro – UFRJ e editor das revistas Global
Brasil, Lugar Comum e Multitudes. Coordena a coleção A Política no Império (Civilização
Brasileira).
**
Doxa é um sistema ou conjunto de juízos que uma
sociedade elabora em um determinado momento histórico supondo tratar-se de uma
verdade óbvia ou evidência natural, mas que para a filosofia não passa de
crença ingênua, a ser superada para a obtenção do verdadeiro conhecimento (Fonte: Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa, versão 3.0).
***
Laclau é o sobrenome de Ernesto Laclau (nascido em Buenos Aires [Argentina], aos 6 de
outubro de 1935, falecido em Sevilha [Espanha], aos 13 de abril de 2014).
Laclau é frequentemente considerado um pensador pós-marxista. Pesquisador e
professor da Universidade de Essex (Inglaterra). Entre seus livros mais
citados, destacam-se Hegemonia e
Estratégia Socialista: por uma democracia radical e plural (Editora
Intermeios, 2015) e A Razão Populista [Três
Estrelas, 2013). Era diretor da revista Debates
y Combates.
****
Desestalinização refere-se ao processo de eliminação
do culto da personalidade e do sistema político stalinista criado pelo líder
soviético Josef Stalin [1878-1953 –
o qual governou ditatorialmente de 1922 até a sua morte]. A desestalinização
começou tecnicamente em 1953 após a morte de Stalin, mas não era oficial até
1956, após o discurso secreto de Nikita Khrushchev, então secretário do Comitê
Central da União Soviética, e liberado após o XX Congresso do PC da URSS. O
processo de desestalinização começou com um fim ao papel do trabalho forçado em
grande escala na economia. No discurso "Sobre o culto à personalidade e suas consequências" para a
sessão fechada do XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética em 25 de
fevereiro de 1956, Khrushchev chocou seus ouvintes denunciando o regime
ditatorial e o culto da personalidade de Stalin. Ele também atacou os crimes
cometidos pelos associados de Lavrentiy Beria (Fonte: Wikipédia).
***** Arquipélago
Gulag é uma obra de Alexander Soljenítsin. É
provavelmente a mais forte e a certamente a mais influente obra sobre como
funcionavam os gulags (campos de
concentração e de trabalho forçado na antiga União Soviética) nos tempos de
Josef Stálin. "GULag" é um
acrônimo em russo para o termo: "Direção
Principal (ou Administração) dos
Campos de Trabalho Corretivo" ("Glavnoye Upravleniye
Ispravitelno-trudovykh Lagerey"), um nome burocrático para este sistema de
campos de concentração (Fonte: Wikipédia).
No Brasil, infelizmente, essa obra clássica está esgotada, pode-se encontrá-la
somente em sebos. Ela foi publicada aqui em a partir de 1975 pela Difel,
Biblioteca do Exército e Círculo do Livro.
* * * * * * *
N O T A S
[1] Cf.
Multitudes, Majeure 56 –
“Devenir-Brésil post-Lula”, Paris, 2014, http://www.multitudes.net/category/l-edition-papier-en-ligne/56-multitudes-56/
[2] Durante
os dois governos de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) o PT tentou o seu Impeachment várias vezes.
[3] Giuseppe
Cocco, “Le mouvement d’indignation au Brésil face à l’austérité néolibérale de
Lula et Dilma, Multitudes, n. 59, disponível em http://www.multitudes.net/le-mouvement-dindignation-au-bresil-face-a-lausterite-neoliberale-de-lula-et-dilma/
[4] Matheus
Leitão, “Deleção de Sergio Machado atinge Temer”, O Globo, 16 juin 2016: http://g1.globo.com/politica/blog/matheus-leitao/post/delacao-de-sergio-machado-atinge-temer-governo-quer-congelar-gastos-jornais-de-quinta-22.html
[5] Barbara
Szaniecki e Giuseppe Cocco, “Maledetto sia giugno: il Brasile un anno
dopo”. http://www.commonware.org/index.php/cartografia/479-maledetto-sia-giugno. Giuseppe Cocco,
“Dilma e Aécio são o Estado contra a sociedade”, Entrevista por Patricia
Fachin, IHU-Online http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/536610-dilma-e-aecio-duas-faces-de-um-mesmo-esgotamento-entrevista-especial-com-giuseppe-cocco-
[6] Sandro
Mezzadra y Diego Sztulwark, “Imágenes del desarrollo, ciclo político y nuevo
conflicto social”, 3 novembre 2014. http://anarquiacoronada.blogspot.com.br/2014/11/anatomia-politica-de-la-coyuntura.html
[7] La longue marche, Gallimard, Paris,
1957.
[8] Ibid.,
p. 240.
[9] Ibid.,
p. 161.
[10] Ibid.
[11] Jean
François Billeter, La Chine trois fois
muette, Allia, Paris, 2000, p. 48. Billeter fala de trinta a quarenta
milhões de mortos, de acordo com diferentes fontes. Slavoy Zizek cita a
biografia de Mao para falar de cerca de 38 milhões de mortos no mesmo período
(início de 1958), devido, também às exportações de trigo para a URSS em troca
de tecnologia nuclear e de armamento. “Introduction” à Mao, “On practice and
contradiction“, Verso, London, 2007, p. 10.
[12] Billeter,
ibid., p. 47.
[13] Ibid.,
p. 48.
[15] “L’homme
et l’adversité”, Rencontres Internationales de Genève, 1951, Signes (1960), Gallimard, Paris, p. 405.
[16] “L’U.R.S.S.
et les camps”, 1950, Signes, cit.,
pp. 424-5.
[17] Ibid.
p. 438.
[18]
“Sur la déstalinisation”, 1956, publié dans Signes,
cit. p. 472.
[19] Ibid.,
p. 474.
[20] Ibid.,
p. 476.
[21] Ibid.,
p. 480.
[22] Ibid.,
p. 488.
[23] Antony
Beevor & Luba Vinogradova, Un
escritor en guerra. Vasili Grossman en el Ejercito Rojo, 1941-1944,
Traduction de l’anglais à l’espanhol de Juanmari Madariaga, Crítica,
Barcelona, 2012, p. 410.
[24] Maurice
Merleau-Ponty, “Note sur Machiavel”, Communication au Congrès Umanesimo e
scienza politica, Rome-Florence, septembre 1949, publié dans Signes, cit., p.357.
[25] Merleau-Ponty,
Cit., p. 491.
[26] Albert
Camus, L’homme révolté,
Gallimard-Fólios, Paris, 1951, p. 381.
[27] Claude
Lefort, “Sur L’archipel goulag” (1978), Encyclopédie
Universalis (supplément), dans Le
temps présent. Écrits 1945-2005, Belin, Paris, 2007, p. 371.
[28] Ibid.,
p. 372.
[29] Apud
Lefort, ibid., p. 373.
Traduzido
do francês por Clarissa Moreira.
Publicado originalmente na revista eletrônica Multitudes, n.º 64, outubro 2016 (clique aqui).
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